Nova imagem revela vizinhança violenta de um buraco negro supermaciço

É a primeira vez que os cientistas captam todo o sistema à volta do buraco negro maciço, incluindo a base de um jacto de plasma quente que é lançado do “anel” em torno do buraco negro.

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Nesta ilustração, que corresponde à primeira imagem em que o jacto e a sombra do buraco negro são vistos em simultâneo, o jacto é lançado a partir do buraco negro S. Dagnello/NRAO/AUI/NSF

Ao ampliar as primeiras imagens de buracos negros, os cientistas acabam de mostrar um novo retrato onde se vêem os fenómenos violentos que se desenrolam à volta de um destes gigantes cósmicos vorazes, incluindo o local de lançamento de um colossal jacto de partículas de alta energia que dispara para o espaço.

A nova imagem foi obtida através de 16 telescópios colocados em vários locais da Terra, que essencialmente criaram um prato observacional do tamanho de um planeta. O buraco negro supermaciço retratado reside no centro de uma galáxia relativamente próxima da nossa, a Messier 87 (ou M87), a cerca de 54 milhões de anos-luz da Terra – e o primeiro buraco negro de que tivemos uma imagem, já em 2019.

Um ano-luz é a distância que a luz percorre ao longo de um ano, ou seja, cerca de 9,5 biliões de quilómetros.

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A imagem divulgada pelos cientistas onde se descortinou, pela primeira vez, um jacto e a sombra do buraco negro no centro da galáxia M87 R.-S. Lu (SHAO)/E. Ros (MPIfR)/S. Dagnello (NRAO/AUI/NSF)

Este buraco negro, com uma massa 6500 milhões de vezes superior à do nosso Sol, é o objecto da primeira imagem alguma vez obtida de um buraco negro, divulgada em 2019 – e com outro buraco negro fotografado no ano passado, Sagitário A* (ou Sgr A*), que está no centro da nossa galáxia, a Via Láctea.

Tanto essas imagens, que mostraram apenas a escuridão do buraco negro e um anel de matéria brilhante a mergulhar nele, como este novo retrato, surgiram de observações com vários radiotelescópios espalhados por todo o mundo. Mas esta nova imagem mostra a luz emitida num comprimento de onda maior, ampliando o que conseguimos ver.

Difíceis de observar devido à sua própria natureza, os buracos negros são corpos celestes que exercem uma atracção gravitacional tão forte que nenhuma matéria ou luz pode escapar depois de ser apanhadas.

A maioria das galáxias é construída em torno de buracos negros supermaciços. E alguns destes buracos negros são conhecidos não apenas por engolir qualquer matéria que se aproxime, mas também por lançar jactos enormes e incrivelmente brilhantes de partículas de alta energia para o espaço. A nova imagem agora divulgada mostra como a base deste jacto se conecta com a matéria que circula em torno do buraco negro.

É a primeira vez que todo o sistema à volta do buraco negro é captado numa imagem. O retrato mostra a base do jacto de plasma quente, um anel desfocado de luz do plasma quente a cair para dentro do buraco negro, e uma área central escura – como um buraco de donut – criado pela presença do próprio buraco negro. O plasma – o quarto estado da matéria a seguir a sólido, líquido e gasoso – é um material tão quente que alguns ou todos os seus átomos são divididos em partículas subatómicas de alta energia.

“A imagem destaca, pela primeira vez, a ligação entre o fluxo de acreção (matéria atraída para dentro) perto do buraco negro supermaciço central e a origem do jacto”, nota Ru-Sen Lu, astrofísico da Academia Chinesa de Ciências de Xangai e líder do estudo agora publicado na revista Nature – e onde a imagem é divulgada.

“Isto ajuda a entender melhor a física complicada dos buracos negros, como os jactos são lançados e acelerados, e como a queda de matéria para dentro do buraco negro e o fluxo de matéria estão relacionados”, explica o astrofísico Thomas Krichbaum, do Instituto Max Planck (Alemanha), e que também participou no estudo.

“É algo que os astrónomos e astrofísicos queriam ver há mais de meio século”, aponta Kazunori Akiyama, outro dos autores deste estudo e investigador do Observatório Haystack do Instituto de Tecnologia do Massachusetts (Estados Unidos).

Os três cientistas fazem parte do consórcio Telescópio do Horizonte de Eventos (EHT, na sigla em inglês), uma colaboração mundial iniciada em 2012 para observar directamente o ambiente ao redor de um buraco negro. Um horizonte de eventos de um buraco negro é o limiar a partir do qual qualquer coisa – sejam estrelas, planetas, gás, poeira ou radiação electromagnética – é engolida por este corpo celeste.

O EHT produziu as imagens dos dois buracos negros supermaciços que conhecemos em detalhe. O segundo, divulgado no ano passado, mostra o “monstro” que habita o centro da Via Láctea, o Sagitário A*. “Esperamos que exista um ambiente semelhante também para este buraco negro”, diz Ru-Sen Lu.

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