Orçamento será aprovado mas ainda sem respostas sobre a floresta

Num debate morno, PSD criticou o Governo pela “propaganda eufórica” para “manter o poder”. A esquerda, com a maior parte das exigências satisfeitas, teve uma participação apagada e nem conseguiu saber qual a fatia disponível para a floresta

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António Costa, primeiro-ministro Nuno Ferreira Santos
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João Oliveira, PCP Nuno Ferreira Santos
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Assunção Cristas, CDS Nuno Ferreira Santos
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Catarina Martins, BE Nuno Ferreira Santos
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António Leitão Amaro, PSD Nuno Ferreira Santos

Ainda há muitas dúvidas sobre o tema da reforma da floresta no Orçamento do Estado para o próximo ano (OE2018), mas a proposta é aprovada esta sexta-feira com os votos dos partidos à esquerda do PS. PSD e CDS votam contra, PAN abstém-se. Bloco, PCP, PEV e até o CDS não deixam, no entanto, de colocar em cima da mesa outras reivindicações.

A floresta foi o tema que António Costa remeteu para o final do seu discurso de 21 minutos, em que detalhou a estratégia política subjacente ao OE2018 e descreveu-o como um documento, em simultâneo, de “continuidade e de futuro” – precisamente a crítica que lhe é apontada pelo principal partido da oposição. Auto-elogiou os resultados económicos e orçamentais (em que registou o “défice mais baixo da democracia”, a “maior redução da dívida pública dos últimos 19 anos”) e apresentou medidas, como as de apoio ao investimento privado, o desagravamento do IRS e o aumento extraordinário das pensões.

Mas se o primeiro-ministro se limitou a falar umas dezenas de segundos sobre a floresta, teve que voltar ao tema várias vezes, depois de questionado por todas as bancadas. António Costa nunca avançou os valores de investimento necessários, mas prometeu que até dia 17 entrarão na Assembleia da República propostas de alteração para acomodar as medidas. Até lá, cinco ministérios estão a “identificar as necessidades de cobertura orçamental” tanto para as indemnizações às famílias das vítimas mortais de Junho e Outubro como para a reconstrução de habitações, empresas, infra-estruturas e equipamentos municipais (as câmaras deverão ter também financiamento reforçado), elencou o primeiro-ministro depois de inquirido pelo comunista João Oliveira.

À ecologista Heloísa Apolónia, Costa prometeu o reforço da vigilância com mais guardas e sapadores florestais, assim como mais militares da GNR e Exército no terreno em 19 áreas de “intervenção prioritária”, sobretudo serras, parques naturais e áreas de paisagem protegida, de norte a sul. Mas nunca quantificou verbas ou meios.

A resposta foi vaga também para outras matérias pedidas pelas bancadas à esquerda. O PEV pediu investimento na ferrovia e passes escolares gratuitos dos quatro aos 18 anos (já tem um "sim" para esta última proposta). O PCP falou na necessidade do combate à precariedade, do reforço do investimento público e dos serviços públicos, incluindo as Forças Armadas e de segurança. Mas, sem exigências específicas, Costa deu também uma resposta lacónica: o “exame comum” na especialidade permitirá aferir da “capacidade financeira para concretizar” as medidas.

Já o caderno de encargos do Bloco foi bem mais concreto. Catarina Martins recusou o carimbo de “clientela de esquerda” posto pela direita – “Não nos meçam pela vossa bitola”, pediu –, exigiu que o Governo garanta a execução do investimento e da despesa tanto do OE2017 como do do próximo ano, em vez de trabalhar para o défice, e quis garantias de progressão da carreira para toda a função pública. Costa respondeu que “todas as carreiras são descongeladas, incluindo as dos professores”, mas depois admitiu que apenas 46 mil professores reúnem as condições para isso. A coordenadora do BE exigiu mais investimento nos serviços públicos e defendeu que o regime simplificado do IRS deve ser “mais claro”.

“Propaganda eufórica”

As bancadas da oposição não estiveram em harmonia e optaram mesmo por estratégias diferentes. Como já tinha vindo a desenhar nos últimos dias, o PSD criticou o OE2018 por “não acautelar o futuro” e acusou António Costa de “fazer propaganda eufórica” a pensar no curto prazo.

Foi pela voz do deputado António Leitão Amaro, a que se juntou depois a da ex-ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque, que o PSD apontou a proposta orçamental como uma “estratégia de consolidação do poder”. A ex-ministra viria, aliás, a rebater as críticas que são apontadas pela esquerda ao PSD, argumentando que o partido não era contra a reposição de rendimentos nem contra a reposição da normalidade na progressão das carreiras na função pública.

Mas, antes, o primeiro-ministro, ao ouvir as críticas do PSD, não resistiu a desafiar o partido ainda liderado por Pedro Passos Coelho – que não interveio durante o debate – a deixar “os diabos e os fantasmas”, agora que “os resultados são bons”.

Já o CDS, pela voz da líder, Assunção Cristas, criticou o orçamento por ser “desigual”, de “vistas curtas, e desafiou o Governo a aceitar as propostas do partido.

Muito mais tenso foi o debate que o primeiro-ministro travou com outros deputados do PSD e do CDS sobre incêndios. Carlos Abreu Amorim, da bancada social-democrata, acusou o Governo de ter feito cortes na Protecção Civil, estabeleceu uma relação de causa-efeito entre esses cortes e os incêndios deste Verão, e recuou mesmo no tempo: “O senhor primeiro-ministro é o pai, a mãe e o rosto do SIRESP [Rede de Emergência de Comunicações do Estado] - um sistema que falhou em alturas decisivas”. Costa replicou: “Para debate politiqueiro, não contam comigo.”

Pelo CDS, Telmo Correia também criticou o Governo por ter ignorado “todos os avisos” sobre os riscos de incêndios. E pegando numa expressão usada pelo primeiro-ministro – de que este Orçamento "não era o da Rainha Santa" Isabel e por isso não tinha só rosas – o centrista gracejou: “O seu Governo deu cabo do maior legado do marido da Rainha Santa Isabel, o pinhal de Leiria" do rei D. Dinis.

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