Descentralização: entre o "embuste" e o processo "ambicioso"

Ministro Poiares Maduro assume que transferência de competências para as autarquias é uma prioridade. Oposição diz que é forma de o Governo se desresponsabilizar.

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Poiares Maduro defendeu a lei do Governo Enric Vives-Rubio

Um embuste, uma forma encapotada de privatizar funções sociais do Estado e uma via para o Governo se desresponsabilizar foram algumas das críticas lançadas pelas bancadas da oposição esta sexta-feira durante o debate parlamentar sobre a descentralização. O ministro do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro, defendeu o projecto de transferência de competências para as autarquias como uma prioridade, e apontou o dedo ao PS por se manifestar contra só por estar em “modo eleições”.

Na abertura do debate, Poiares Maduro sustentou que “Portugal é um dos países mais centralizados da Europa” e que isso tem consequências negativas na qualidade dos serviços e no menor respeito pelas políticas locais. Já foi publicado (e está em vigor) o decreto que regula o regime de delegação de competências no domínio das funções sociais para os municípios e para as entidades intermunicipais através de contratos interadministrativos.

Trata-se de um processo que se pretende “ambicioso” mas que o governo realiza de “forma prudente”. “Não é feito através de uma transferência universal a todos os municípios mas através contratos”, explicou.

Essa foi, aliás, uma das críticas lançadas por Luís Fazenda, do BE. “É uma transferência curta, limitada e arbitrária, tem um quadro geral de critérios, mas o que será para valer estará nos contratos que serão diferentes de concelho para concelho. Devia ser uma lei quadro”, afirmou o bloquista, apontando como um exemplo negativo das escolas. “Na educação, essa propalada descentralização é um embuste, ela está a ser feita à custa da autonomia das escolas, está a ser retirada às escolas para ser dada às autarquias, mais longe dos cidadãos”, precisou.

A deputada comunista Rita Rato fez outra crítica ao processo. “O que se discute aqui hoje não é um regime de descentralização. É um passo no sentido de privatização das funções sociais do Estado, sobretudo na Segurança Social”, disse, acusando o Governo de enviar para a requalificação funcionários das comissões de protecção de menores.

Mais suave, o deputado Ramos Preto, do PS, começou por questionar o ministro sobre os critérios que regeram a escolha dos municípios, lembrou o parecer negativo da Associação Nacional de Municípios Portugueses e exigiu a apresentação de estudos que fundamentem a solução adoptada pelo Governo.

Já no final do debate, o socialista Mota Andrade acusou o Governo de um “falhanço absoluto” no domínio da descentralização. Defendendo a transferência de competências com um “equilíbrio eficiente na articulação de poderes, do ponto de vista da igualdade e garantia de não discriminação”, Mota Andrade sugeriu o modelo seguido na capital por António Costa, líder do PS: “Não teria andado mal o Governo se tivesse ido colher inspiração ao que fizemos em Lisboa”. A proposta socialista sobre descentralização foi materializada num projecto de resolução que foi anunciado durante o debate.

Na resposta às bancadas da oposição, Poiares Maduro rejeita a acusação de estar a promover a privatização, lembrou que a adesão do município é voluntária, e encontrou um denominador comum para as bancadas mais à esquerda. “Confirmam a sua matriz centralista, é uma consequência da sua posição ideológica”, afirmou o governante.

Já sobre o PS, e já no final de duas horas de debate, o ministro disse que continuar sem perceber a razão que leva o partido a opor-se a este regime de descentralização. “Façam uma pausa no modo eleições, pensem não no partido, mas no país”, apelou. O secretário de Estado da Administração, António Leitão Amaro, acrescentou: “'Eu quero um estudo' é o eufemismo do PS para não fazer nada”.

Uma das críticas partilhadas pelas bancadas da oposição tem a ver com a possibilidade de as autarquias poderem contratar directamente pessoal docente. Poiares Maduro assegurou que a possibilidade prevista na lei “não prejudica os vínculos” e que os trabalhadores têm os direitos garantidos.

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