Novas regras para a herança em caso de inseminação post-mortem aprovadas no Parlamento

Partidos da esquerda tentaram contornar as dúvidas do Presidente da República que pediu que harmonizassem as regras do direito sucessório com o Código Civil e clarificassem a autorização do dador. À direita só a IL vota a favor.

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Nuno Ferreira Santos

É a segunda tentativa: os partidos da esquerda entenderam-se para corrigir o diploma que tinham apresentado em Março e que o Presidente da República devolveu ao Parlamento apontando problemas com as regras das heranças e das regras retroactivas da lei que permite a inseminação com o sémen de dador já falecido.

As alterações (subscritas pelo PS, BE, PCP, PEV e PAN) e o decreto em si foram aprovados com os votos do PS, Bloco, PCP, PAN, PEV, IL e das deputadas não-inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues, e tiveram o voto contra do PSD, CDS e Chega. A direita tem argumentado que a permissão da inseminação com esperma do pai já falecido não respeita o superior interesse da criança que nascerá. Abstiveram-se os deputados socialistas Porfírio Silva, Fernando Anastácio, Filipe Neto Brandão, Rosário Gamboa e Bruno Aragão.

Com as alterações propostas agora pelo PS, BE, PCP e PAN, a “herança do progenitor falecido mantém-se jacente durante o prazo de três anos após a sua morte, o qual é prorrogado até ao nascimento completo e com vida do nascituro caso esteja pendente a realização dos procedimentos de inseminação permitidos”. Ou seja, durante esse tempo a herança é posta em administração.

A inseminação da mulher com sémen do companheiro falecido pode começar a ser feita a partir de seis meses depois da morte do dador e até um prazo máximo de três anos. Podem ser feitas até três tentativas de tratamentos – mas se nascer uma criança à primeira ou à segunda a mulher não poderá fazer mais nenhuma inseminação.

Para usar o sémen do companheiro, este tem que deixar um consentimento formal antes da sua morte. Também nesta matéria o Presidente da República tinha apresentado dúvidas sobre a prova que era exigida. Assim, além de se exigir uma declaração escrita de consentimento do dador que prove a sua autorização para o uso do material genético por aquela mulher em concreto para gerar um filho porque era um projecto em comum, os partidos acrescentaram na lei que esse consentimento pode também ser “registado em videograma”.

E, para acautelar casos em que o dador esteja doente e não possa escrever ou em que a mulher, já sendo agora viúva quando a lei entrar em vigor - para abarcar casos de mulheres já viúvas como o de Ângela Ferreira, a portuense que lançou uma petição e uma iniciativa legislativa de cidadãos que arrancou com o processo legislativo –, não tem uma declaração escrita do falecido, foi acrescentada à norma transitória a possibilidade desse registo em vídeo da declaração do dador e, em alternativa, de uma declaração sob compromisso de honra do médico que acompanhou o processo que confirme a existência desse consentimento.

Mantém-se a punição de pena de prisão até dois anos ou 240 dias de multa para quem recorrer à procriação post-mortem de sémen sem consentimento (tal como existe para a inseminação de embrião sem o devido consentimento).

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