PS e PAN convergem na intenção de regulamentar o teletrabalho

Regulamentar o teletrabalho será uma das prioridades para o PS e para o PAN. A aposta neste regime é vista também como uma solução para aliviar a pressão sobre os transportes, uma das preocupações discutidas esta quarta-feira.

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Inês Sousa Real comprometeu-se com a regulamentação do teletrabalho LUSA/MIGUEL A. LOPES

A líder da bancada do PAN fez um rasgado elogio ao teletrabalho e anunciou a intenção de propor a sua regulamentação, num gesto que será partilhado pelo PS. À direita, o CDS assumiu concordar com as “vantagens” do teletrabalho, mas à esquerda dos socialistas o Bloco e o PCP alertaram para os riscos da sua romantização.

Numa declaração política no plenário desta quarta-feira na Assembleia da República, Inês Sousa Real considerou que “a resistência cultural que existia ao teletrabalho era infundada, até porque rapidamente as empresas se adaptaram a esta realidade, com resultados bastante positivos” numa alusão ao que aconteceu nos últimos meses por causa da pandemia. A líder da bancada do PAN apontou como vantagens do trabalho à distância o reforço da produtividade, a melhoria da qualidade de vida e o fim dos “picos das horas de ponta e as longas horas perdidas no trânsito”.

À dimensão pessoal, a deputada acrescentou a perspectiva ambiental. “Acreditamos que o recurso generalizado ao teletrabalho será benéfico para todos e todas. Ganha o planeta, com um impacto positivo no ambiente. Ganha o país, com empresas mais produtivas e menos sobrecarga nos centros urbanos. Mas, mais importante, ganham as pessoas, com maior qualidade de vida, menos custos em deslocações, menor desgaste laboral e maior conciliação entre a sua vida familiar e profissional”, afirmou, reconhecendo, no entanto, problemas no trabalho à distância. O PAN vai apresentar “nos próximos dias” propostas no sentido de garantir a “protecção dos trabalhadores”.

A total concordância com o teor da intervenção veio da parte de João Almeida, do CDS, numa rara convergência, como reconheceu a líder da bancada do PAN. João Almeida sublinhou as vantagens do teletrabalho do ponto de vista pessoal e ambiental, alertando para a necessidade de evitar uma regulamentação muito rígida em resposta ao “preconceito ideológico”.

A regulamentação do teletrabalho já estava prevista no programa eleitoral do PS, lembrou o socialista Fernando José, que admitiu a possibilidade de a sua bancada vir a apresentar um projecto de lei sobre a matéria.

À esquerda, a comunista Diana Ferreira considerou que o teletrabalho é muitas vezes sinónimo de “perda de direitos” e de precariedade dos trabalhadores. Por outro lado, defendeu que a questão dos transportes não se resolve com teletrabalho mas sim com “mais oferta”, o que levou Inês Sousa Real a assumir que entre as duas “há uma diferença de paradigma” e que a proposta do PAN serve precisamente para “acautelar os riscos” apontados. A resposta da deputada também foi dirigida a José Soeiro, do BE, que tinha alertado para o risco de uma “visão idílica do teletrabalho” e que chamou a atenção para a “imposição de jornadas de trabalho mais longas” e uma “hiperconectividade permanente” do trabalhador.

Pelo PSD, a deputada Lina Lopes apenas questionou se a regulamentação do teletrabalho pode ser alvo de um debate na concertação social, ao que a líder da bancada do PAN respondeu positivamente.

Reforçar transportes e apostar na agricultura nacional

O BE olhou para os números “preocupantes” da evolução da pandemia em Lisboa e identificou a sobrelotação nos transportes públicos como uma das explicações. O partido entregou esta quarta-feira um projecto de resolução no qual propõe o reforço das linhas ferroviárias mais sobrelotadas com as carruagens à disposição, nomeadamente na Linha de Sintra e na Linha da Azambuja. O projecto de resolução propõe ainda o reforço das linhas mais sobrelotadas com transportes públicos alternativos.

À proposta do BE, a IL contrapôs iniciativas que apresentou como “mais rápidas de aplicar, menos poluentes e mais baratas”, nomeadamente através da promoção do teletrabalho e desfasamento de horários. Já o PAN e o PEV lembraram as alternativas de mobilidade suave, como são as bicicletas. Uma mensagem repetida pelo CDS, antes de se ressalvar que tempos excepcionais admitem opções excepcionais, como a preferência pelo transporte individual para evitar contactos sociais. “Estamos a empurrar as pessoas para o transporte individual e a contrariar as políticas públicas de investimento no transporte público”, lamentou José Luís Ferreira. Da bancada do PS, Ricardo Leão defendeu que a quebra na oferta é uma consequência na quebra da tesouraria das empresas de transporte público.

“Ao longo desta pandemia e daqui para a frente vamos percebendo que não estamos, de facto, todos no mesmo barco”, concluiu Isabel Pires, do BE, o que valeria mais tarde um comentário do PCP. “Dizem que vamos todos no mesmo barco, isso pode ser verdade, mas devíamos ter mais barcos para cumprir as orientações da Direcção-Geral da Saúde”, ironizou o comunista Bruno Dias, que pediu menos layoffs e mais reforços no sector.

Do lado da bancada comunista lamentou-se que “um vírus tão pequenino tenha as costas tão largas” e defendeu-se a aposta na produção nacional, especialmente nos pequenos agricultores, o que desagradou ao CDS. “Defender a agricultura é defender os pequenos e grandes agricultores, não é colocar uns contra os outros”, disse a centrista Cecília Meireles.

Para o PCP, as medidas de apoio foram “insuficientes e chegaram tarde” e o sector não pode ser esquecido no Programa de Estabilização Económica e Social (PEES). Por sua vez, o BE e PAN aproveitaram para expressar a sua preocupação com a descarbonização da agricultura e o financiamento público de empresas com culturas intensivas ou super-intensivas.

Já o PS escolheu elogiar o papel das Forças Armadas entre o “esforço colectivo” de combate à pandemia. Mas no meio dos elogios, o apelo ao colectivo foi outro. O socialista Marcos Perestrello elogiou o “amplo consenso político-parlamentar” e disse esperar que “o desvanecer progressivo da memória dramática da urgência sanitária” não signifique o aumento de divergências políticas, em detrimento “de soluções para a resposta económica e social que agora se impõe”. “Estranho seria que num contexto de emergência os partidos políticos se pusessem à margem de qualquer solução”, declarou Perestrello. “Não é tempo de facilitismo económico, nem de obstinações ideológicas”, concluiu.

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