PSD e PS chumbam recomendação do Bloco para exonerar Carlos Costa

PSD, CDS e Bloco admitem propor alteração das regras sobre a nomeação e substituição do governador do Banco de Portugal.

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LUSA/MÁRIO CRUZ

PS e PSD chumbaram nesta quarta-feira à tarde o projecto de resolução do Bloco de Esquerda que recomenda ao Governo que exonere o governador do Banco de Portugal. O CDS absteve-se e o deputado não-inscrito Paulo Trigo Pereira votou ao lado dos socialistas e social-democratas. PCP, PEV e PAN levantaram-se para votar a favor do Bloco.

Na manhã desta quarta-feira, quando o projecto de resolução foi discutido na Comissão de Orçamento, o CDS, o PSD e o Bloco admitiram que a curto prazo se deveria mudar a forma de nomeação do regulador e também o regime para a sua substituição.

Para recusar a proposta do Bloco, os três partidos alegam que o Executivo não tem poderes para exonerar Carlos Costa do topo do Banco de Portugal (BdP) e que no Parlamento estão agora a começar os trabalhos da nova comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos que irá também apurar as responsabilidades do então administrador do banco público e actual governador.

A questão da mudança de regime de nomeação para o regulador bancário foi levantada durante a discussão do projecto de resolução na Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa (COFMA) pelo deputado do CDS João Almeida que argumentou que a "inamovibilidade não é compatível com a democracia". O deputado defendeu que em alternativa a nomeação do governador do Banco de Portugal devia ter uma natureza tripartida, entre o Governo (que proporia), a Assembleia da República (que deveria fazer uma audição prévia à votação, como acontece, por exemplo, com os juízes do Tribunal Constitucional), e o Presidente da República (que nomearia). "Se a solução fosse esta, seria mais fácil resolver os problemas com este tipo de cargos", vincou João Almeida.

O deputado centrista colocou também o ónus no próprio Carlos Costa, de quem o CDS faz uma "apreciação negativa sobre o seu trabalho", acrescentando que "seria ainda mais fácil se os implicados fizessem uma auto-análise [do seu comportamento] e tirassem conclusão", acreditando que se o governador o fizesse "já teria resolvido esta situação" pedindo a sua demissão.

O social-democrata António Leitão Amaro considerou a proposta do Bloco "altamente defeituosa no plano jurídico por não cumprir os procedimentos, critérios, formas e competências prevista na lei portuguesa e nos tratados europeus a que o país está vinculado". Acrescentou que o argumento do Bloco de que o governador não foi sujeito a um rastreio sobre a sua idoneidade não faz sentido porque qualquer outra pessoa que ocupe aquele cargo também não o é.

E apontou baterias ainda ao timing da proposta, lembrando que o tempo do "esclarecimento parlamentar" está a começar com a nova comissão de inquérito à gestão da CGD depois de conhecido o relatório da auditoria da EY. "Um Parlamento que diz que vai escrutinar e propõe logo a exoneração parece uma contradição de objectivos..."

Mas Leitão Amaro admitiu que a alteração do sistema de nomeação do governador "é uma sugestão a ponderar para o futuro", e adiantou que o PSD vai propor diversas alterações (mesmo de medidas que já viu chumbadas anteriormente) ao regime de supervisão bancária.

PCP insiste na nacionalização da banca

O PCP vota a favor da recomendação do Bloco por considerar que Carlos Costa "não tem condições objectivas para exercer o cargo desde 2014". O deputado Duarte Alves justificou que o PCP considera que o governador deve ser exonerado não apenas para permitir que preste contas no Parlamento pela sua actuação na Caixa, mas sobretudo "pelo papel que não teve e deveria tido" de regulador nos sucessivos casos de bancos que tiveram que ser intervencionados pelo Estado em vários milhares de milhões de euros.

O deputado comunista aproveitou para defender que a "solução para os problemas da banca não é mudar a supervisão do sistema financeiro mas sim o controlo público dos bancos". E para criticar o facto "extraordinário" de a exoneração do governador do Banco de Portugal não estar nas competências de qualquer instituição nacional nem no Governo português mas sim nas mãos do BCE - Banco Central Europeu. "Não reconhecemos legitimidade democrática a Frankfurt" para mandar na banca portuguesa, acrescentou.

Lei é “vaga o suficiente”, argumenta o Bloco

A deputada do Bloco Mariana Mortágua argumentou que a lei é “vaga o suficiente” para permitir que o governador do Banco de Portugal seja exonerado por ter responsabilidades na gestão da Caixa num período em que foram concedidos créditos sem as devidas garantias. “A lei é vaga quando diz que pode ser exonerado por falha grave ou por não cumprir os requisitos; mas não diz o que é uma ‘falha grave’”, descreveu, criticando que haja pessoas “inamovíveis e inimputáveis no seu cargo”.

Mariana Mortágua disse ser “frustrante” que os critérios para a exoneração sejam tão “gerais” que “nada os pode preencher”, como aconteceu com a análise do Tribunal de Justiça da União Europeia, que anulou a suspensão preventiva do governador do regulador bancário da Letónia apesar de haver quase meia centena de documentos que mostravam o seu envolvimento em casos de corrupção.

A bloquista afirmou que no passado “já houve motivos para pôr em causa o governador” e “houve falhas graves e não se fez nada”, para dizer que acredita que, mesmo que na comissão de inquérito se apurasse que Carlos Costa “cometeu falhas graves”, depois “não aconteceria nada”. “Há um conflito muito grave entre o governador Carlos Costa e o antigo administrador da CGD Carlos Costa”, vincou, depois de admitir também que a lição a tirar de mais este caso é que “há uma possibilidade de legislar sobre essa inamovibilidade do governador do BdP”.

O deputado não-inscrito Paulo Trigo Pereira haveria de pegar nas regras estreitas para a exoneração do governador para apontar o motivo jurídico da falta de razão do Bloco para pedir essa saída. A que somou outros três motivos. O motivo institucional que representa a pressão do Governo sobre um regulador que tem um estatuto de independência funcional - e que é motivo para que o Tribunal Europeu contrarie as decisões nacionais. O motivo do timing da proposta quando a comissão de inquérito está a arrancar e o motivo político da falta de independência entre o poder político e a regulação.

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