Bowie global no dia em que faria 70 anos

Desde que morreu a 11 de Janeiro de 2016, o seu nome tornou-se omnipresente. Este domingo, de Londres a Tóquio, passando por Lisboa, o mundo celebra o legado cultural de David Bowie.

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Reuters/LEONHARD FOEGER

David Bowie faria 70 anos este domingo e o mundo trata de se reunir à volta do seu legado, celebrando-o por todo o lado, Lisboa incluída. Desde que morreu – a 11 de Janeiro de 2016, dois dias depois de fazer 69 anos – que o seu nome se tornou omnipresente no espaço público. Reedições, exposições, concertos, debates, livros foram alguns dos pretextos para o lembrar no último ano. O seu derradeiro álbum, Blackstar, figurou nas listas dos melhores de 2016 das publicações mais influentes e nos mais diversos balanços do ano Bowie (ou a sua inesperada morte) foi presença obrigatória.

A evocação da sua vida e obra continua no dia em que cumpriria mais um aniversário. O momento alto será porventura o concerto Celebrating David Bowie que vai ocorrer na O2 Academy Brixton de Londres – esgotada há muito – e onde estarão presentes o actor Gary Oldman, seu amigo, e muitos dos músicos que ao longo dos anos colaboraram com ele.

Esta será aliás a primeira data de uma mini-digressão em que músicos como Mike Garson, Adrian Belew, Angelo Moore, Gaby Moreno, Bernard Fowler, Earl Slick ou Joe Sumner, que o acompanharam ao vivo ou gravaram com ele, tocarão temas do seu repertório. Depois de Londres haverá passagens por Nova Iorque (10 de Janeiro), Los Angeles (25 de Janeiro), Sidney (29 de Janeiro) e Tóquio (2 de Fevereiro).

Na capital inglesa está também em cena, por estes dias, o musical Lazarus, de Bowie e Enda Walsh, que se estreou há mais de um ano em Nova Iorque e o que o músico preparou já muito doente. Inspirado no romance O Homem Que Veio do Espaço, de Walter Tevis, é protagonizado pelo actor Michael C. Hall, que interpreta vários temas de Bowie. O repertório do espectáculo foi depois editado num disco, Lazarus Cast Album, editado em Outubro passado, e incluindo também as suas últimas três gravações.

Já este sábado a BBC2 transmitiu o documentário David Bowie: The Last Five Years que, tal como o título indica, se centra nos últimos anos de vida do cantor, acompanhando o processo de criação do álbum The Next Day (2013), do musical Lazarus e de Blackstar. Contrariando a ideia que foi sendo veiculada ao longo dos últimos meses – o músico saberia que Blackstar seria a sua última obra e teria dessa forma administrado o seu adeus –, alguns dos que com ele colaboraram testemunham neste documentário que Bowie soube apenas numa fase adiantada que a doença vencera.

Também este domingo, em Lisboa, no Centro Cultural de Belém, haverá uma conversa em torno de Bowie, com a participação do crítico de cinema João Lopes, da cantora Xana (Rádio Macau), do antigo editor David Ferreira e do jornalista Nuno Galopim; paralelamente, o músico David Fonseca tratará de providenciar algumas versões de canções icónicas. De notar que é ele o obreiro da antologia Bowie 70, a editar a 17 de Fevereiro, com versões de algumas das canções mais conhecidas de Bowie tocadas pelo próprio Fonseca e cantadas por Ana Moura, Camané, Marta Ren, Manuela Azevedo, Reininho, Rita Redshoes, António Zambujo ou Márcia. 

A data deste domingo também é assinalada em Tóquio com a inauguração da exposição retrospectiva David Bowie Is, organizada pelo museu Victoria & Albert de Londres, e que tem estado em périplo internacional. O PÚBLICO viu-a em Groningen, na Holanda, no ano passado. Depois de Tóquio, chegará a Barcelona, em Maio. Reunindo objectos, fotografias e documentos, é uma recriação magnífica da vida de Bowie e do impacto da sua obra nos mais diversos domínios criativos.

Entretanto, e já para Fevereiro deste ano, está agendada uma nova edição comemorativa dos 40 anos da canção Sound and vision, produção de Bowie e Tony Visconti com participação de Brian Eno incluída no álbum Low (1977). Também é em Fevereiro que têm lugar as cerimónias de entrega dos Brit Awards e dos Grammy, com Blackstar nomeado na categoria de melhor álbum alternativo pela academia norte-americana.  

Uma obra total

Tudo isto acontece ao cabo de um ano em que se sucederam os acontecimentos à sua volta, como o lançamento de Who Can I Be Now? (1974-1976), uma caixa contendo 12 CD, com a particularidade de incluir o álbum inédito de 1974, The Gouster, pela primeira vez em edição integral, ou a edição portuguesa dos livros Sobre Bowie, de Rob Sheffield, e Bowie – Uma Biografia Sentimental, de Wendy Leight. Em Setembro, a obra, o legado e o fascínio exercido por ele foram alguns dos temas para conferências na Faculdade de Letras de Lisboa e uma mesa redonda na Culturgest. Em Outubro, no contexto do festival DocLisboa, foi exibido o documentário Bowie, Man With a Hundred Faces or The Phantom of Hérouville (2015), enquanto em Novembro dois dias de leilões em Londres chamaram quase 30 mil pessoas atraídas pela possibilidade de adquirir algumas das 400 obras da sua colecção de arte contemporânea.

Tivemos Bowie em todo o lado nos últimos meses. O homem morreu, ficou a obra. A música constitui o núcleo central da mesma, mas ela só ganhou relevância pela forma como Bowie conseguiu inscrevê-la nos domínios da arte, do design, da moda, do teatro, do cinema, da filosofia ou da literatura, ao mesmo tempo que se ia alimentando de todos eles. É isso que se celebra este domingo: a maneira como a sua obra está inscrita na nossa memória colectiva. Coleccionador de ideias e de personalidades, era um artista total, alguém que foi capaz de perceber que o rock não era apenas a possibilidade de afirmar novas formas de operar, mas também de ser.

O facto de se ter tornado ícone em vida explica a sensação de que o conhecemos bem, mas apesar da profusão de iniciativas à sua volta mantém-se um enigma, tal a riqueza de conexões culturais que a sua obra convoca. Vamos continuar a ouvir falar muito dele.

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