Erdogan lança nova ofensiva na Síria, mas quer acordar com Putin um cessar-fogo em Idlib

Presidentes de Turquia e Rússia reúnem-se na quinta-feira para discutir os últimos capítulos do conflito. Combates intensificaram-se na Síria após retaliação turca contra alvos militares de Assad.

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Combates intensificaram-se na cidade de Saraqib, na província de Idlib Reuters/UMIT BEKTAS
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Recep Tayyip Erdogan, Presidente da Turquia EPA/STR

O Presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, anunciou esta segunda-feira que vai procurar um compromisso de cessar-fogo na província síria de Idlib, na reunião com Vladimir Putin, chefe de Estado russo, agendada para quinta-feira, em Moscovo. A revelação de Erdogan surge horas depois de as suas tropas abaterem dois aviões e atingirem um aeroporto militar do Exército sírio, contribuindo para o intensificar dos combates na região Noroeste da Síria. 

“Espero que [Putin] tome as medidas necessárias, como um cessar-fogo, e que possamos encontrar uma solução para este problema”, disse o líder turco, num comunicado televisivo, citado pela Al-Aljazeera.

Mas a Rússia avisou que não pode garantir a segurança dos aviões turcos que sobrevoem a Síria. Moscovo tem baterias de mísseis S-400 no país, e diz que os exércitos turco e russo estão em contacto constante na região de Idlib. A Rússia dá apoio aéreo às forças do Presidente Bashar al-Assad e também a elementos das forças especiais e conselheiros militares no terreno, além dos mercenários que combatem pelo regime sírio.

Erdogan defende, no entanto, os interesses e as acções turcas na região: “Não precisamos de ninguém, nem do apoio de ninguém, vamos continuar a fazer as nossas operações”. Na véspera, o ministro da Defesa da Turquia tinha defendido que Ancara “não pretendia confrontar a Rússia”, aliada do regime sírio, e que apenas queria “travar o massacre” do exército de Bashar al-Assad.

Em resposta, segundo a agência russa Tass, o Presidente Putin garantiu que a Rússia não pretende entrar em guerra com ninguém e que vai tentar demover a Turquia, com tem colaborado bastante no patrulhamento de outras regiões da Síria, de um envolvimento militar tão intenso no país.

A Turquia colocou em marcha, no domingo, uma contra-ofensiva no território sírio, na sequência de um ataque movido pelas forças de Assad, na semana passada, que tirou a vida a 33 soldados turcos. 

Aliada de alguns dos grupos rebeldes que controlam Idlib, Ancara enviou as suas tropas para o terreno e declarou guerra ao exército sírio. Está, sobretudo, a fazer ataques com drones. Mas Erdogan assegura que os ataques estão apenas no início e exige que Assad “recue até às linhas definidas pela Turquia”, que se baseiam nas “zonas de segurança” acordadas por russos, turcos e iranianos em 2017.

Para além de ter atingido dois aviões sírios em Idlib e o aeroporto militar de Nayrab, na província de Alepo, o Ministério da Defesa turco diz ter destruído oito helicópteros, vários tanques de guerra e cinco sistemas antiaéreos. 

“Todos os ataques [sírios] foram retaliados pelas Forças Armadas turcas da forma mais violenta e sem hesitação. E continuará a haver retaliações”, afiançou o ministro Hulusi Akar, citado pela agência noticiosa turca Anadolu.

A grande batalha pelo controlo de Idlib, lançada por Assad – que já provocou nova fuga massiva de civis, calculada em 900 mil pessoas – tem como epicentro, por esta altura, a cidade de Saraqib, que o Exército sírio diz ter tomado ao seu inimigo esta segunda-feira. 

Saraqib é um importante ponto estratégico para ambas as forças em combate, uma vez que permite, a quem a controla, um acesso privilegiado às vias de comunicação que ligam aquela região a Idlib – nas mãos dos rebeldes – e a Alepo – recentemente recuperada por Assad.

O principal objectivo de Ancara é conter a ofensiva de Assad em Idlib, próxima da fronteira turca, para evitar que centenas de milhares de civis fujam em direcção à Turquia, juntando-se aos 3,6 milhões que o país foi recebendo ao longo dos nove anos que a guerra da Síria já leva.

De forma a pressionar a União Europeia e NATO a terem um papel mais activo na guerra da Síria, Erdogan decidiu abrir os portões da Turquia, permitindo que milhares de refugiados se dirijam para a Grécia e para Bulgária em busca de asilo.

Alguns milhares estão a acumular-se nas fronteiras europeias, criando uma crise, em violação, do polémico acordo de 2016, assinado por Erdogan com Bruxelas, destinado para a travar o fluxo de chegadas à Europa, em troca de fundos – e que inclui um sistema de deportação para a Turquia de todos os imigrantes que cheguem à Grécia de forma ilegal.

ONU sugere crimes de guerra

A acompanhar e a ensombrar a nova vaga de violência na região de Idlib está um relatório das Nações Unidas, tornado público esta segunda-feira, que admite que as acções militares levadas a cabo por Rússia e Turquia na Síria, nos últimos meses, podem incorrer em crimes de guerra. A organização mundial urge os respectivos governos a iniciarem investigações próprias.

O relatório versa sobre o período decorrente entre Julho do ano passado e Fevereiro deste ano e aponta particularmente o dedo aos ataques aéreos russos contra um mercado e um campo de refugiados, em Maarat al-Numan, bem como aos homicídios e pilhagens efectuados pelos rebeldes sírios, comandados pela Turquia, em Ras al-Ain e noutras regiões curdas, entre outras agressões.

“A Força Aérea russa não direccionou os ataques a alvos militares concretos, o equivalente ao crime de guerra de lançar ataques indiscriminados em áreas com civis”, refere o relatório, citado pela Reuters, que também denuncia a participação do regime sírio neste tipo de crimes e ataques “deliberados”.

“É crime de guerra aterrorizar intencionalmente a população e forçá-la a fugir”, disse esta segunda-feira aos jornalistas Hanny Megally, da equipa de investigadores da ONU, mencionando bombardeamentos a escolas e hospitais. “Vemos claramente esta situação em Idlib”.

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