CGD, BCP, Santander, BPI e BBVA vão recorrer de multa histórica da Concorrência

Só à CGD, que esta noite anunciou que iria recorrer, cabem 82 milhões dos 225 milhões aplicados pela AdC por “troca de informação sensível” sobre créditos.

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Banco público ainda não disse se recorre da coima de 82 milhões de euros Paulo Pimenta

Dos 14 bancos visados pela coima global de 225 milhões de euros aplicada esta segunda-feira pela Autoridade da Concorrência, há pelo menos cinco que vão recorrer da decisão de condenação: Caixa Geral de Depósitos (CGD), BCP, BPI, Santander (que engloba o Popular) e BBVA.

A maior coima individual por “troca de informação sensível” sobre créditos, praticada segundo a AdC entre 2002 e 2013, cabe ao banco público com uma factura de 82 milhões de euros, segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO. Em comunicado emitido na terça-feira à noite, a CGD anunciou ao mercado que “decidiu impugnar judicialmente" a decisão da AdC “junto do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão”. 

Depois, seguem-se, por esta ordem, o BCP (60 milhões de euros), o Santander (35 milhões, incluindo aqui o valor, quase residual, a pagar pelo Popular) e o BPI (30 milhões de euros). Segue-se o Montepio, cuja coima era de 26 milhões de euros, mas que foi reduzida para 13 milhões devido ao acordo estabelecido com a AdC. Ao abrigo do estatuto de clemência, que via premiar os delatores (os casos de cartelização, que se assemelham em muito com este, são especialmente complexos, pelo que as autoridades tendem a dar este tipo de benefícios para colocar um ponto final às práticas lesivas para os cidadãos), o Montepio teve um desconto de 50% por ter sido a segunda instituição a prestar o seu auxílio à investigação, com provas adicionais (e, ao contrário do que o PÚBLICO escreveu esta segunda-feira, o Montepio neste caso pode recorrer da condenação). O primeiro foi mesmo o Barclays, tal como, aliás, o Diário Económico noticiou em 2013. Neste caso, o Barclays ficou isento de qualquer sanção pecuniária.

Depois, há ainda o caso do Abanca, no qual a AdC diz ter ficado impedida de punir, uma vez que este “cessou a prática anos antes dos restantes bancos”. De acordo com o que apurou o PÚBLICO, a instituição espanhola escapou à coima porque as ilegalidades que terá praticado prescreveram. Embora tenha ganho expressão no mercado português com a compra do negócio de retalho do Deutsche Bank em Março de 2018, o Abanca já estava presente antes disso, focando-se nas PME.

O restante valor das coimas, cinco milhões de euros, fica distribuído por oito instituições financeiras: BBVA, BES (não o Novo Banco, mas o chamado “BES mau”, em liquidação), BIC (por factos praticados pelo então BPN), Banif, Barclays, Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo, Deutsche Bank e a UCI. Neste universo cabem realidades muito distintas, como a do BBVA, a quem foi aplicado uma coisa de 2,5 milhões de euros, e o BES, com uma factura de 700 mil euros.

Até à sua resolução, em 2014, o BES era uma das maiores instituições financeiras a operar no país, pelo que seria normal que a conta a pagar pelo “BES mau” fosse superior. No entanto, e apesar das ilegalidades detectadas terem ocorrido entre 2002 e 2013, o cálculo da AdC faz-se com base no volume de negócios do exercício do ano anterior ao da decisão da coima, ou seja, 2018. O mesmo se passa com o Banif, que fechou portas no final de 2015. De acordo com o Expresso, que cita uma fonte ligada ao processo de liquidação do Banif, este não vai recorrer, ao contrário dos maiores bancos, “dada a dimensão reduzida da coima [mil euros] e os custos associados a um recurso”.

BCP recusa “efeito negativo”

Num comunicado enviado na segunda-feira à noite ao mercado de capitais, o BCP afirma que “da decisão da AdC não resulta que as práticas de partilha de informação” imputadas a este banco “tenham tido qualquer efeito negativo para os consumidores”. De acordo com esta instituição financeira, “as informações trocadas pelos departamentos de marketing correspondiam, no caso do BCP, aos spreads standard que são divulgados através do preçário geral e não aos preços que acabavam por ser praticados nas negociações individuais com os clientes”. Assim, o BCP decidiu “avançar com a respectiva impugnação judicial junto dos tribunais competentes”, ou seja, junto do Tribunal da Concorrência em Santarém.

O BBVA também informou que decidiu “recorrer da respectiva sentença e pedir a nulidade da mesma”, enquanto fonte do Santander avançou que a decisão da AdC “não faz sentido”, pelo que o banco iria recorrer. A CGD diz estar “convicta” de que os tribunais competentes “confirmarão a total improcedência e absoluta falta de fundamentação da imputação das irregularidades que lhe é feita”, e o BPI veio contestar esta quarta-feira, 11 de Setembro, que “a alegada troca de informação tenha ocorrido nos moldes alegados na decisão acusatória”.

Já a AdC tem poucas dúvidas. De acordo com a instituição liderada por Margarida Matos Rosa, cada instituição financeira fornecia aos seus concorrentes dados sobre as suas ofertas comerciais, como “os spreads a aplicar num futuro próximo no crédito à habitação ou os valores do crédito concedido no mês anterior” e que “não seriam acessíveis” de outro modo.

“Assim, cada banco sabia, com particular detalhe, rigor e actualidade, as características da oferta dos outros bancos, o que desencorajava os bancos visados de oferecerem melhores condições aos clientes, eliminando a pressão concorrencial, benéfica para os consumidores”. Por outras palavras, ao saber de antemão o que os seus concorrentes estavam a fazer, os bancos que participaram neste esquema tinham pouco ou nenhum incentivo para disputarem os clientes com base em propostas mais competitivas.

Segundo a AdC, “em sentido contrário à evolução de Euribor, os spreads aplicados pelas instituições financeiras a novas operações de crédito registaram uma subida acentuada, a partir de meados de 2008”. Assim, a entidade reguladora deu como provado que foi a acção irregular dos bancos que permitiu atenuar o efeito da redução da Euribor, que poderia ter sido mais benéfica para os consumidores. “À descida abrupta da Euribor corresponde uma subida sustentada dos spreads médios, que atenua a redução da taxa de juro que decorreria da descida abrupta da Euribor”, refere o documento de perguntas e respostas elaborado pela AdC.

A AdC explica que, uma vez concluída a decisão de condenação, pediu um parecer ao regulador sectorial, ou seja, ao Banco de Portugal, que exprimiu receios relativamente ao impacto de eventuais coimas para o sector financeiro.

A entidade liderada por Carlos Costa considerou que, “caso fossem determinadas coimas que correspondessem ao montante máximo previsto” na Lei da Concorrência, ou seja, 10% do volume de negócios, isso poderia afectar, “de forma material”, a “estabilidade financeira e a resiliência de um número significativo de instituições”. Esta é uma consequência que a AdC rejeita. As coimas, diz, afiguram-se “adequadas e proporcionais às infracções cometidas por cada banco”. Com Ana Brito

Notícia e títulos alterados às 15h14 de 11 de Setembro, com informação do recurso do BPI

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