“Estamos fartos de ver jovens mortos”: bares dos EUA oferecem testes de fentanil

Tiras para testar a presença de fentanil em drogas estão a tornar-se cada vez mais comuns em bares, restaurantes e locais de encontro à medida que os Estados Unidos se debatem com a epidemia de opióides e o elevado número de mortes.

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Ao entrar no bar de cerveja artesanal Good Hop em Oakland, cidade do estado norte-americano da Califórnia, Alison Heller parece mais uma cliente desejosa da happy hour. Mas, em vez de se dirigir ao balcão, vai directamente à casa de banho, abre a mochila, tira um saco plástico com tiras para um teste de fentanil e põe 25 tiras num frasco para qualquer pessoa poder fazer um teste de graça. “Se vais usar drogas aqui, podes testá-las”, diz Heller, co-fundadora da FentCheck, uma organização sem fins lucrativos dedicada à redução de danos deste opióide.

Tiras para testar a presença deste opióide sintético mortal em drogas estão a tornar-se cada vez mais comuns em bares, restaurantes e locais de encontro, à medida que o país se debate com a epidemia de opióides e o elevado número de mortes.

O fentanil invadiu as ruas dos Estados Unidos e contribuiu para quase 500 mil mortes por overdose de opiáceos no país durante duas décadas, com a pandemia de covid-19 a agravar a situação. O fentanil, que é cem vezes mais potente do que a morfina, produz efeitos semelhantes a outros opióides, como sedação, sonolência e náuseas. A sobredosagem pode causar insuficiência respiratória, levando à morte.

As overdoses de fentanil são agora a principal causa de morte entre os residentes nos Estados Unidos com idades entre os 18 e os 45 anos, ultrapassando o suicídio, acidentes de viação e a covid-19, de acordo com uma análise dos dados federais feita pela organização de sensibilização para opióides Families against Fentanyl.

Para prevenir estas mortes, Heller, o co-fundador da FentCheck Dean Shold e uma equipa de voluntários visitam regularmente uma rede de empresas em Oakland, São Francisco, Nova Iorque e Filadélfia para reabastecer os stocks das tiras de teste.

“Estamos fartos de jovens mortos. Estamos fartos de overdoses acidentais. Estamos também a ajudar pessoas que lutam contra a toxicodependência”, diz Heller. “Se morrerem esta noite, não conseguem chegar à reabilitação, não conseguem chegar ao próximo passo na sua sobriedade.”

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A FentCheck agrafa as tiras da empresa canadiana BTNX com instruções simples para os utilizadores testarem as suas drogas. Os resultados aparecem — como num teste de gravidez ou de covid-19 — com linhas que indicam positivo ou negativo.

“São baratas, são superfáceis de usar e de ler e dizem se o que vais consumir tem, ou não, presença de fentanil”, diz Kathleen Clanon, directora médica do Alameda County Health Care Services, que apoia a distribuição de tiras de teste de fentanil. “São muito sensíveis, o que significa que os testes de comparação mostram que é provável que mostrem fentanil, se estiver lá e eu sinto-me confortável como um teste comunitário.”

Melissa Myers, proprietária da Good Hop, diz que não é difícil oferecer as tiras aos clientes e treinar o pessoal para usar naloxona, um medicamento que reverte rapidamente o efeito de overdoses de opióides. “Lutámos para nos mantermos vivos durante a covid-19 e eu quero que eles possam continuar a vir aqui, não morrer na rua ou morrer em casa, porque decidiram experimentar drogas novas”, diz Myers.

Algumas cidades foram ainda mais longe na luta contra a overdose de drogas. Uma das primeiras salas de chuto do país abriu em 2021 em Nova Iorque, permitindo que se injectem drogas sob a supervisão de pessoal treinado.

Os críticos dizem que as tiras permitem aos utilizadores consumir drogas. Alguns estados tratam-nas como parafernália de drogas ilegais. Está em curso uma legislação para descriminalizar as tiras no Alabama, na Florida, e no Tennessee, entre outros estados.

Joey Hensley, senador estatal e médico que dirige um consultório privado no Tennessee, votou contra o projecto de lei. “Não creio que seja uma boa política facilitar o uso a pessoas viciadas em drogas”, afirma.

Hensley duvida que o fornecimento de tiras de teste de fentanil possa afectar o comportamento dos consumidores de drogas. “Se houvesse estudos que mostrassem o contrário, talvez eu mudasse de ideias, mas simplesmente não penso que seja uma boa política”, diz o senador.

Jason Lujick, proprietário do The Legionnaire, onde as tiras de teste se encontram no balcão, diz que os legisladores precisam de enfrentar os factos. “Se realmente se preocupam com os seus eleitores e olham para os dados que os seus departamentos de saúde estão a publicar e se realmente se preocupam, cresçam”, diz ele.

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