Série em que o Presidente ucraniano fazia de Presidente ucraniano está a ser comprada mundo fora

A comédia Sluga Naroda, ou “Servo do Povo”, está a gerar um interesse renovado devido aos “paralelos óbvios” com a realidade. Vários países já adquiriram direitos para exibir em breve. Portugal parece estar de fora, para já. “É uma peça de televisão fascinante, importante e histórica.”

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O Presidente ucraniano Volodimir Zelensky já foi também conhecido como o Presidente ucraniano ficcional Vasiliy Goloborodko, protagonista da série de comédia Sluga Naroda — título ucraniano que pode ser traduzido como “Servo do Povo”. Na sequência da invasão do país pela Rússia, a série de 2015 está a agitar o mercado televisivo mundial e os seus direitos de exibição estão a ser adquiridos para vários países que querem exibi-la em breve. Para já, Portugal ainda não terá entrado na corrida.

A distribuidora internacional de “Servo do Povo”, a sueca Ecco Rights, fez saber nas suas contas nas redes sociais que “na última semana vários grandes canais já chegaram a acordo para exibir a série, incluindo o Channel 4 no Reino Unido, a MBC no Médio Oriente, a ANT 1 na Grécia e a Pro TV na Roménia”. Entretanto, o director-geral da empresa acrescentou à agência de notícias Associated Press que a série também já foi negociada com canais de países como Bulgária, Moldova, Estónia, França, Finlândia e Geórgia.

O PÚBLICO questionou a Ecco Rights sobre se os direitos para Portugal estão ainda no mercado, ou se houve já manifestações de interesse por parte de canais ou plataformas portugueses. A responsável da distribuidora para a América Latina e Península Ibérica, Barbora Suster, disse não ter recebido ainda qualquer proposta concreta. Também os directores de programas dos canais públicos, RTP1 e RTP2, disseram ao PÚBLICO não estar a par do caso. “Ainda não recebemos nenhuma oferta, mas estamos atentos e poderíamos avaliar a possibilidade”, admitiu Teresa Paixão, directora de programas da RTP2. Plataformas como a ibérica Filmin, que partilha com o canal dois da RTP um interesse por ficção europeia e de língua não-inglesa, e que programa para breve temas relacionados com os dois países em contenda, também não estão para já a negociar o título para Portugal.

Sluga Naroda, de que o Presidente ucraniano é também co-autor, além de protagonista, estreou-se em 2015 e somou três temporadas. Punha em cena um comediante que interpretava um professor de liceu indignado com a corrupção no seu país e se via de repente na arena política e, mais tarde, chegava a Presidente do seu país. Quis a história que esse actor se tornasse Presidente na vida real e que os revezes da intriga o colocassem num ingrato protagonismo como líder de um país invadido por uma das superpotências mundiais. A série (que também originou um filme) tornou-se uma linha indelével do seu currículo pelas coincidências entre realidade e ficção.

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Zelenskii em "Sluga Naroda" DR

O renovado interesse em torno de Sluga Naroda — “a série está muito actual”, diz Barbora Suster ao PÚBLICO — é “notável”, disse Nicola Söderlund, responsável pela Ecco Rights, à AP. “As pessoas surpreendem-se [com o facto de] um comediante poder ser um político”, diz o profissional sueco. “As suas competências a passar mensagens motivadoras para o povo, que é algo que se faz quando se é apresentador de um programa de TV, ajudaram-no muito a tornar-se político.”

Anos mais tarde, a imagem de Volodimir Zelensky está hoje perto de ser mitificada pelos ciclos noticiosos de 24 horas e pela sua insistência em permanecer, vestido para combater, na frente de combate mediática e no centro das operações no seu país. A notícia de que Zelensky fez a voz do ursinho Paddington na dobragem para ucraniano dos dois filmes, respectivamente em 2014 e 2017, correu mundo ao quinto dia de guerra, bem como os vídeos da sua participação, aliás vencedora, no concurso de talentos Dança com as Estrelas.

Sluga Naroda faz parte desse mito e a Ecco Rights está a repromover a série nas suas redes sociais e em emails enviados a todos os seus clientes, defendendo que “o melhor apoio que a indústria global de televisão pode dar à Ucrânia é partilhar esta história”. “A série é uma comédia mas também é um documento importante sobre as origens de Zelensky”, escreveu a empresa de direitos num post recente no Instagram.

“Embora o cenário que Zelensky e o povo ucraniano enfrentam no mundo real seja bem mais assustador e chocante do que a comédia da série, há paralelos óbvios”, promove a empresa, e Sluga Naroda “é uma peça de televisão fascinante, importante e histórica”. O Channel 4, por exemplo, vai passar um episódio já no domingo — acompanhado de um magazine de actualidade sobre o político.

A Ecco Rights diz ainda ter doado 50 mil euros à Cruz Vermelha ucraniana e ter retirado todas as séries detidas ou produzidas pela Rússia do seu catálogo. É mais uma entidade a juntar a sua voz aos boicotes crescentes às exportações culturais russas perante mais uma crise humanitária às portas da Europa.

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