“Há mesmo vontade política de avançar a sério com a criminalização do enriquecimento injustificado?”, questiona-se o PCP

Comunistas reuniram-se com o DCIAP e a PJ para debater as condições existentes para a investigação à criminalidade económico-financeira e à corrupção.

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LUSA/MIGUEL A. LOPES

O assunto tem anos e começam as dúvidas de que poderá ainda não ser desta: o líder parlamentar comunista já questiona se haverá realmente vontade política para avançar com a criminalização do enriquecimento injustificado depois de olhar para as propostas socialista e social-democrata e concordar com a Associação Sindical dos Juízes quando esta diz que se prometeu muito para afinal se legislar muito pouco.

“A questão essencial é saber qual é a vontade política dos outros partidos: há mesmo vontade política de avançar a sério com a criminalização do enriquecimento ilícito? Se sim, é fácil de encontrar a solução: a proposta do PCP corresponde não apenas à solução do ponto de vista criminal como até à solução que do ponto constitucional é admitida”, afirmou João Oliveira quando questionado pelos jornalistas sobre as críticas levantadas pelos juízes às propostas do PS e do PSD que serão discutidas, tal como as restantes, esta semana no Parlamento.

“Se não houver vontade política, continuaremos enredados nesse discurso de passa-culpas e que passa ao lado das verdadeiras soluções que podem ser encontradas para a criminalização do enriquecimento ilícito”, acrescentou o líder parlamentar. O Tribunal Constitucional já chumbou por duas vezes – em 2021 e 2015 - as tentativas do Parlamento de criminalizar o enriquecimento injustificado sempre por causa do princípio da presunção da inocência.

O projecto dos comunistas prevê “um dever geral de declaração” às Finanças a quem tem “património e rendimentos de valor superior a 400 salários mínimos nacionais mensais” (226.000 euros). Se o acréscimo anual for superior a cem salários mínimos (66.500 euros), passa a existir também “dever de justificação da origem desse enriquecimento”. O PCP propõe a criação do crime de enriquecimento injustificado com penas de prisão até três anos, mas agravadas para titulares de cargos políticos e públicos até aos cinco anos.

No final das reuniões que manteve durante a tarde com a direcção do Departamento Central de Investigação e Acção Penal e com a direcção nacional da Polícia Judiciária, João Oliveira vincou que constatou nas duas entidades, apesar de terem competências distintas no combate à criminalidade económica e financeira e à corrupção, uma necessidade de investimento em meios humanos e em formação e capacitação adequada para a investigação criminal e também o recurso a tecnologia.

“Um dos elementos evidentes é a sofisticação da criminalidade económico-financeira, da utilização de novos instrumentos para a prática dos crimes, de métodos e tecnologias que, andando sempre à frente da investigação criminal lhe exigem alguma capacidade de aceleração para acompanhar a prática do crime”, apontou João Oliveira. Não se falou, por isso, no reforço de competências do DCIAP ou da PJ mas sim de meios e técnicos.

No caso da PJ, por exemplo, é preciso que continue o ritmo dos concursos de admissão de novos inspectores. Se os orçamentos entre 2019 e 2021 incluíram a abertura de concursos para uma centena de inspectores cada e só foram abertos dois, o que falta deve ser aberto rapidamente, defendeu João Oliveira. A PJ estima que sejam necessários cerca de sete a oito anos para repor a capacidade operacional que se perdeu em 15 anos e o PCP defende que se defina um plano plurianual de investimentos na investigação criminal a quatro anos.

Questionado sobre o expectável reforço do número de juízes do “Ticão” anunciado pelo Governo na passada semana, o líder parlamentar do PCP manteve a posição de não se pronunciar sobre a medida. “Essa discussão tem duas dimensões que têm que ser consideradas porque o número de magistrados num tribunal não pode estar desligado das competências que esse tribunal tem”, afirmou.

“Pode-se querer colocar a questão em saber se o problema é o número de juízes mas também se pode discutir se as competências e a configuração do Tribunal Central de Instrução Criminal são ou não adequadas perante a realidade do país, da criminalidade que esse tribunal tem responsabilidade de julgar e de acompanhar o desenvolvimento do inquérito e da instrução, e sobretudo considerar isso no quadro da organização do sistema judiciário que, para além do TCIC, contém também tribunais de instrução criminal pelo país fora. Nós consideramos que é preciso fazer essa discussão sobre a competência.”

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