A nova série Devs pergunta: temos medo ou fome do futuro?

Alex Garland foi para a televisão escrever e realizar uma série que recupera em parte as preocupações de Ex Machina ou Aniquilação, mas dando-lhes a forma de um thriller criminal.

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Nick Offerman em Devs HBO

A seguir a Ex Machina e Aniquilação, o argumentista e realizador britânico Alex Garland passou para a televisão, claro está. Devs é a estreia desta sexta-feira na HBO Portugal e é tão peculiar e especial quanto se pode esperar de uma mini-série em que as árvores têm auréolas, os laboratórios existem num vácuo selado e tudo gira em torno de uma “estranha empresa privada de tecnologia” — e, ao mesmo tempo, São Francisco, os telemóveis e a vida são familiares e contemporâneos. Devs é mais um espelho da preocupação latejante de Garland com a forma como a tecnologia, e não o sonho, comanda a vida e é tanto um spa visual e auditivo quanto uma colecção de microagressões sensoriais.

Posto isto, Devs é também um thriller sobre um casal e uma empresa sobre o qual não convém desvendar muito em termos de intriga — é por isso que se ganha mais pela comparação e associação livre às narrativas recentes sobre a tecnologia, os gigantes de Silicon Valley ou o poder do código binário, da inteligência artificial e do trauma e da saudade. A linhagem é tanto a de The Circle (o romance de Dave Eggers e não o filme nele baseado) quanto um lembrete para The OA e Black Mirror (Netflix), Homecoming (Amazon) ou Westworld (HBO) e, porque não, para a obra anterior de Garland.

Afinal, este “techno-noir”, como arrisca descrever o crítico da revista Hollywood Reporter, é fruto de quem escreveu o argumento de A Praia, 28 Dias Depois e de Ex Machina; alguém que disse ao site norte-americano Observer que as empresas de Silicon Valley “têm um poder enorme. E isso põe-me nervoso”. Ainda assim, a história de Lily Chan (Sonoya Mizuno) e Sergei (Karl Glusman) e do desgrenhado milionário da tecnologia Forest (um papel dramático para Nick Offerman) é mais do que os contornos iniciais de superfícies brilhantes, ecrãs repletos de código, escudos Faraday, nemátodos, referências a problemas quânticos e ao multiverso.

Karl Glusman HBO
Sonoya Mizuno HBO
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Karl Glusman HBO

É que as grandes paisagens americanas são interrompidas por uma estátua gigantesca de uma menina, o tema do livre arbítrio e do determinismo despontam logo nos primeiros minutos e, após um crime, o lado humano da história torna-se mais próximo. “É sobre a experiência de dissonância das personagens”, tenta explicar Alex Garland.

Não ajuda muito? É uma questão de mergulhar, ou não, em Devs para avaliar se os dois primeiros episódios disponibilizados esta sexta-feira merecem o regresso aos restantes seis (que serão debitados uma vez por semana pela HBO Portugal) produzidos nos EUA pelo canal por subscrição FX para a plataforma de streaming Hulu.

Não é a única estreia da semana a fazer pensar no futuro no streaming, com a HBO a revelar Breeders logo no dia 3, sobre as aventuras da paternidade, ou a Apple TV+ a estrear a incursão de Steven Spielberg pelo filão Amazing Stories. Do passado vêm, para o nosso futuro, os vampiros de What We Do In The Shadows, a série que sucede ao filme homónimo escrito por Jemaine Clement (Flight of the Conchords) e Taika Waititi (Jojo Rabbit) e que se estreou em 2019 nos EUA, chegando finalmente também esta sexta-feira à mesma HBO Portugal.

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