"Por causa do filme, estou paralisado"

Alex Garland não gosta de Andy Warhol. Acha que ele não respeitava a cultura pop. Uma lata de Coca-cola só ganhava dignidade depois de representada pelo pintor. No livro autobiográfico "A Praia", Garland leva a cultura pop a sério. Usa as técnicas da bd, do cinema e dos jogos de vídeo para criticar a cultura dos jogos-de-vídeo-viagens-filmes-de-Hollywood. Mas critica a partir de dentro, o que reconhece ser impossível. Hollywood pegou na História e fez um filme, com Leonardo DiCaprio, que glamoriza as viagens-jogos-de-vídeo. Garland gostou do filme mas nunca mais escreveu uma linha.

Os dois livros do jovem escritor britânico Alex Garland começam da mesma maneira: um jovem britânico está sozinho num quarto de hotel numa cidade estrangeira... É assim que, para ele, começam as histórias mais misteriosas. Quando, em 1996, com 25 anos, escreveu "A Praia", Garland, que até aí só fizera banda desenhada, não podia imaginar a vaga de sucesso e elogios que viria com a publicação do livro. Chamaram-lhe "o maior escritor da sua época", o "William Golding da geração X", o "Graham Green do século XXI" e até "o escritor para se ler e o homem para se ter".Fechou-se em casa, sem ler jornais nem ver televisão, e ainda conseguiu acabar a segunda obra, "O Tesseract". Mas depois parou. Desde que se começou a falar da super-produção "A Praia", realizada por Danny Boyle ("Trainspotting") e interpretada por Leonardo DiCaprio, ficou "paralisado". O efeito que o filme terá e o que escreverá a seguir é para si o maior mistério. É como se uma nova vida fosse começar.Falou connosco pelo telefone, de Berlim, sozinho no seu quarto de hotel, no dia em que o filme foi apresentado no festival de cinema. Precisamente no início da sua mais misteriosa aventura.PÚBLICA - Já viu o filme?ALEX Garland- Sim, já vi. De certa maneira, talvez isto seja típico de um primeiro romance...Geralmente, quando se pretende escrever um argumento com muitas metáforas e analogias opta-se por um romance mais... literário, com personagens mais velhas, e não por um "thriller" de aventura. Tentei fazer uma metáfora, mas não demasiado pesada, não demasiado gritante. Mantê-la quase secundária às personagens, à história, ao miúdo que está a contá-la, de uma forma inocente.De facto há algo de interessante a respeito dos jogos de vídeo, como forma de evitar o mundo, e isso faz-me recordar que a personagem do livro e eu próprio estamos ligados, de alguma maneira. Eu estava a escrever... Desculpe, isto é muito complicado. Eu estava a escrever sobre a personagem de uma forma muito consciente, pondo na sua cabeça toda uma série de referências. Mas, sem pensar, coloquei lá esta referência que, afinal, é tão simbólica como qualquer das outras. Mas fi-lo inconscientemente. E há nisso alguma coisa que me faz sentir que o livro é autêntico.Tudo o que sei é que se quero fazer qualquer coisa terei de esperar até que as coisas acalmem e já não haja... toda esta espécie de merda... Porque a maior parte de toda esta confusão e bajulação é apenas merda. Se levasse isto a sério dava em doido.

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