O que é um Bandersnatch? É o novo Black Mirror, é interactivo e está a abanar o Netflix

Nem os autores concordam sobre quantos fins há para Black Mirror: Bandersnatch. E é um filme? Ou um episódio? O Netflix lançou esta sexta-feira um desafio para o fim-de-semana e para as férias de fim de ano – e para a televisão.

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Três perguntas. O que é um bandersnatch? O que é Black Mirror: Bandersnatch? Como acaba Black Mirror: Bandersnatch? A primeira é de resposta fácil: é uma criatura imaginada por Lewis Carroll. A segunda é relativamente fácil, mas não definitiva: é um episódio da série, ou será o novo filme que o Netflix lançou esta sexta-feira com o pedigree da ficção científica do seu sucesso Black Mirror. A terceira é a mais complexa de todas e o segredo de Black Mirror: Bandersnatch – é que esta é uma história interactiva e em poucas horas já está a criar fãs em todo o mundo, que têm poucos segundos para tomar decisões para avançar a história.

Há perto de um ano o serviço de streaming fazia das suas lançando, sem grande fanfarra, a série de ficção científica Dark, que se tornou num fenómeno. Em época de festas e com muitos subscritores, sobretudo jovens, de férias e com tempo para explorar os múltiplos caminhos que oferece um filme interactivo, o Netflix lançou esta sexta-feira Black Mirror: Bandersnatch. É um filme que na sua versão “estanque” tem 90 minutos, mas que nas suas diferentes opções e possibilidades acaba por oferecer mais de 300 minutos de imagens.

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Trezentos e doze, para sermos mais precisos, já acompanhados por conselhos sobre como devemos ir até ao fim, talvez tentar outra vez, e muitos GIF a serem partilhados no Twitter de espectadores a reagir ou a viver nesse outro ecrã a sua experiência de tentativa-erro que tem outro enorme potencial: o da repetição, ou seja, poder recuar e fazer novas escolhas.

Ambiente de anos 1980, medo de qualquer era. Tudo começa com a nossa escolha do que será o pequeno-almoço do protagonista.

O ponto de partida é aparentemente linear. “Em 1984, um jovem programador começa a questionar a realidade quando está a adaptar um romance de fantasia negra para um videojogo”, começa a sinopse, enquanto o trailer mostra que o livro se intitula Bandersnatch e que é escrito por um mítico Jerome F. Davies. Imagens de comprimidos à escolha, à la Matrix, e o som dos Frankie Goes to Hollywood pintam de sangue cenas mais assustadoras de uma “história alucinogénia com vários finais”.

O jogo Bandersnatch existiu mesmo na década de 1980 e na história Netflix, o seu autor perdeu o controlo mental e acaba por matar a mulher. O protagonista de Black Mirror: Bandersnatch, Stefan, teme estar também a perder a sanidade.

Black Mirror: Bandersnatch é protagonizado por Fionn Whitehead (Dunkirk), Will Poulter e Craig Parkinson. Foi criado por Charlie Brooker e tem Annabel Jones como produtora executiva. O realizador é David Slade (Black Mirror – Metalhead). Joga-se, ou conta-se, com uma barra negra que surge na base do ecrã e que dá ao espectador escolhas: que tipo de cereais comer; gritar com um progenitor ou arremessar algo em protesto? Há quem termine Black Mirror: Bandersnatch até mais depressa, em 60 minutos. Um alerta: as escolhas não funcionam no Chromecast, Apple TV, mas sim nas consolas, nas televisões mais modernas, nos smartphones com Android ou iOS ou na maior parte dos browsers.

Um bandersnatch é uma criatura que os leitores do criador de Alice no País das Maravilhas conhecem bem. Apesar de ter feito a sua primeira aparição num poema de Alice do Outro Lado do Espelho (1872), o peludo animal surge em vários trabalhos de Carroll. Um filme é um filme, e um episódio de uma série é um episódio de uma série. Uma série antológica é aquela que tem temas e histórias independentes, normalmente durante uma temporada (American Crime Story, American Horror Story, True Detective); uma série antológica como Black Mirror tem episódios com histórias independentes que funcionam por vezes como filmes.

Black Mirror: Bandersnatch é, com a sua hora e meia, o que o New York Times chama “o único episódio para a sua quinta temporada”, corroborado pela revista Wired; mas o Netflix classifica-o como “filme interactivo”. Haverá mais episódios da quinta temporada de Black Mirror, mas não serão interactivos segundo diz o criador de Bandersnatch.

A televisão e o final feliz

Para explorar um conteúdo deste género, que tem na base um tom de mistério e aventura com o habitual tom de alerta quanto à nossa relação com a tecnologia que contêm todos os episódios de Black Mirror, há que voltar a ele muitas vezes. O número de visionamentos, que o Netflix nunca divulga para os seus produtos, só pode aumentar com o sucesso de Black Mirror: Bandersnatch e dar-lhe o potencial do comportamento de uma série de vários episódios.

Independentemente das tentativas (é sempre possível voltar atrás nas escolhas), caminhos e sucesso ou falta dele que espectadores e Bandersnatch venham a ter nos próximos dias, este novo Black Mirror é um novo sintoma do estado do audiovisual. Experimentar, diversificar, sobretudo nos novos players do streaming. Segundo escreve esta sexta-feira o New York Times, que esteve na sede da plataforma de streaming a explorar o mundo de Black Mirror: Bandersnatch, o Netflix está a pedir aos produtores que lhe façam mais propostas de histórias interactivas, já terá mais na calha e já criou um software (o Branch Manager) que ajuda a organizar histórias e dar-lhe variáveis infinitas.

Este não é o primeiro produto narrativo do género, dos livros Dungeons & Dragons dos anos 1980 ou do filme Late Shift (2016) à mais recente série da HBO Mosaic, criada por Steven Soderbergh e não muito amada pelo público. Até o Netflix já criou uma história infantil interactiva em 2017. Bandersnatch “não foi desenhado como um jogo. Foi desenhado como uma experiência cinemática”, garante Annabel Jones ao diário norte-americano. “Com elementos de jogo”, acrescenta Brooker.

Black Mirror: Bandersnatch é mais uma tentativa para ver o que dá. É que “aprendemos a carregar no ‘play’, deixar cair o comando e a recostarmo-nos e a deixar a televisão inundar-nos”, como reconhece a directora de inovação de produto do Netflix, Carla Engelbrecht, ao New York Times. Isso leva à definição de espectador, alguém que assiste, observa mas não participa necessariamente, diferente de um jogador. É também uma experiência narrativa, de testar ritmos, limites, variações. São 170 páginas de guião e duas horas e meia de imagens fragmentadas em 250 pedaços, como como escreve a revista Wired, que teve acesso às salas de montagem da série - os criativos tiveram de “reinventar como se faz televisão”.

Há mais de um trilião de variações da história, detalha a Variety. Resposta à terceira pergunta? “Não sei quantos fins existem. Não sabemos o que criámos”, disse Annabel Jones ao New York Times. “Desculpa. Sabemos”, corrigiu Charles Brooker, que inicialmente recusou fazer este episódio-filme interactivo. O produtor Russell McLean não tem tantas certezas. Serão, diz o Netflix, cinco fins com muitas variantes.

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