A “história paralela do cinema” ganha secção no Curtas Vila do Conde

Cinema Revisitado é o nome da nova paralela do festival, que vai mostrar Rambo, Disney, Sophia, Sergei Paradjanov ou Joe Dante.

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A Fúria do Herói, de Ted Kotcheff, o filme que em 1982 lançou a série Rambo DR

Os primeiros cartoons em Technicolor de Walt Disney, o happening-mash-up de quatro horas de Joe Dante, o filme que lançou a série John Rambo com Sylvester Stallone, Sophia, Régio, Oliveira. O que têm em comum todos estes nomes? A nova secção do Curtas Vila do Conde, sob o genérico Cinema Revisitado – nas palavras de Miguel Dias, um dos directores do festival, trata-se de “criar um contexto, um programa” para coisas que sempre fizeram parte da programação sem nela ocuparem um lugar específico. 

Miguel Dias cita a título de exemplo a exibição, logo nas primeiras edições do Curtas, do cinema do arménio Artavazd Pelechian, ou das curtas de Jacques Tati e Manoel de Oliveira: “Houve sempre uma preocupação de criar uma história do cinema paralela.”

Para o director, a criação do novo módulo Cinema Revisitado dá ao Curtas “uma oportunidade para colocar os filmes em contexto, em diálogo com outras secções do programa” – assim acontecerá com O Gabinete do Dr. Caligari, de Robert Wiene, apresentado em cine-concerto com música de Marta Navarro e Tiago Cutileiro, mas também objecto da exposição da galeria Solar que acompanhará o festival, O Caso Caligari. Ou com a sessão dedicada às primeiras curtas Technicolor de Walt Disney, realizadas entre 1932 e 1939 – entre as quais o lendário Three Little Pigs, a história dos três porquinhos e do lobo mau que venceu o Óscar –, também integrada no programa infanto-juvenil Curtinhas.

Dias não escamoteia que entre os argumentos em favor da criação da secção está a disponibilidade cada vez maior de cópias e programas restaurados. É esse contexto que permite a realização da sessão Walt Disney, que reflectirá um programa montado pela própria Disney, mas também a exibição da Paradjanov Trilogy, três curtas recém-restauradas do cineasta arménio Sergei Paradjanov (Hakob Hovnatanyan, de 1967, Kiev Frescoes, de 1966, e Arabesques on the Pirosmani Theme, de 1985), ou de Do Céu ao Rio, a par de Painéis do Porto, curta encomendada a António Reis e César Guerra Leal em 1964 e em que a Cinemateca Portuguesa tem trabalhado recentemente. 

É também nessa senda que se mostram o restauro 4K de A Fúria do Herói, de Ted Kotcheff, o filme que em 1982 lançou a série Rambo, recentemente estreado em Cannes – uma escolha que materializa a intenção do Curtas de usar a secção para mostrar obras “pouco canónicas” –, e ainda The Movie Orgy, de Joe Dante e Jon Davidson, um happening cinematográfico realizado a partir da colagem ao vivo de bobinas de filme de muitas origens diferentes, desde animações a anúncios, passando por trailers e filmes educativos. Nunca uma sessão da Movie Orgy em 1968/1969 foi igual, mas a cópia que o Curtas apresentará corresponde à “Ultimate Version” entretanto restaurada que tem feito a ronda dos festivais, e que será acompanhada por DJ ao vivo.

A secção Cinema Revisitado aproveita ainda duas efemérides importantes para ir aos arquivos, naquela que Dias diz ser também uma das ideias que norteiam a sua entrada em cena: celebra o 50.º aniversário da morte do vilacondense José Régio, com a exibição das curtas de Manoel de Oliveira ligadas ao escritor e da “fantasia” de Manuel Mozos A Glória de Fazer Cinema em Portugal, e o centenário do nascimento de Sophia de Mello Breyner Andresen com a exibição do filme que João César Monteiro lhe dedicou em 1969.

A secção junta-se aos filmes-concerto já anunciados de Thurston Moore, Heliocentrics e Montanhas Azuis e aos destaques concedidos a Todd Solondz e Carlos Conceição. O Curtas Vila do Conde decorre de 6 a 14 de Julho. 

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