Abramovich visto em Telavive. Como pode Israel lidar com os oligarcas russos?

Há vários russos, com nacionalidade israelita, que têm viajado para o país desde o início da guerra na Ucrânia. Israel, ao contrário dos EUA ou da UE, não impôs sanções a oligarcas próximos do Kremlin.

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Abramovich fotografado num aeroporto em Israel Reuters/STRINGER

Roman Abramovich foi visto, nesta segunda-feira, no aeroporto Ben-Gurion, em Telavive, Israel. Vários oligarcas russos, com cidadania israelita e que são alvo de sanções noutros países, podem rumar ao país depois de terem obtido nacionalidade, o que motivou já reacções por parte do Governo local, que não aplicou as mesmas sanções que a Europa e os EUA a altas figuras com ligações ao Kremlin.

“Israel não será uma rota para contornar as sanções impostas à Rússia pelos Estados Unidos da América e por outros países ocidentais”, garantiu, nesta segunda-feira, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel, Yair Lapid. A declaração acontece no mesmo dia em que Abramovich foi visto num aeroporto de Israel, avançou a Reuters.

Segundo a mesma agência, o ainda dono do clube de futebol vencedor da maior competição de clubes na Europa, o Chelsea, terá rumado a Israel a partir de Moscovo, no domingo. Um dia depois, foi visto no aeroporto Ben-Gurion antes de alegadamente rumar à Turquia, onde o seu iate privado foi visto a navegar.

Abramovich é cidadão israelita desde 2018. ​Como o PÚBLICO revelou, o multimilionário conseguiu também nacionalidade portuguesa em Abril de 2021, como judeu sefardita.

Ainda na passada semana, avançou a televisão israelita Channel 12, catorze jactos privados provenientes de aeroportos russos aterraram em Israel. Pelo menos sete destes aparelhos foram fretados a uma empresa que aluga jactos para serviços na Europa. Segundo dados consultados pelo canal, as aeronaves partiram da Turquia com destino a Moscovo e São Petersburgo, seguindo depois para Telavive.

Román Abramovich foi incluído na nova actualização da lista de sanções europeias, aplicadas a personalidades próximas do Kremlin. O novo pacote de sanções, o quarto desde o início do conflito, foi aprovado esta segunda-feira. O multimilionário “é um dos empresários envolvido no sector económico, garantindo uma fonte substancial de receitas ao Governo da Federação Russa, que é responsável pela anexação da Crimeia e pela desestabilização da Ucrânia”, pode ler-se no documento a que o PÚBLICO teve acesso.

“Ninguém que ser o último refúgio para o dinheiro sujo que está a alimentar as guerras de Putin”

Israel, que tem assumido um papel de mediação entre a Rússia e a Ucrânia, não seguiu as sanções impostas aos magnatas russos pelos EUA, Reino Unido e União Europeia. Ainda assim, o Governo israelita criou já um comité para compreender de que forma o país pode manter o estatuto de refúgio para qualquer judeu, sem entrar em conflito com as sanções impostas por vários aliados ocidentais. Segundo o jornal The Washington Post, o governo planeia limitar o total de tempo que um avião pode permanecer nos aeroportos ou um iate nas docas para apenas 48 horas.

Em entrevista a este canal, Victoria Nuland, subsecretária de Estado para Assuntos Políticos dos EUA, apelou a Israel para que se junte ao grupo de países que sancionaram a Rússia. “O que estamos a pedir, entre outras coisas, é que todas as democracias do mundo se juntem a nós nas sanções financeiras e de controlo das exportações que aplicamos a Putin”, disse. “Ninguém que ser o último refúgio para o dinheiro sujo que está a alimentar as guerras de Putin.”

A importância da “dimensão histórica” em todo o processo

“A comunidade de judeus russos é muito significativa. Além da dimensão simbólica e histórica, existe a posição oficial do governo para evitar que Israel se constitua como um canal alternativo. Mas a implementação é bastante complicada”, aponta Ana Santos Pinto, investigadora do Instituto Português de Relações Internacionais (​IPRI) da Universidade Nova de Lisboa. Tudo o que diga respeito à comunidade judaica “não se explica apenas com a diplomacia ou política de poder”. Para a especialista, a “dimensão histórica, simbólica e identitária é muito importante”.

Por seu lado, ao PÚBLICO, Nuno Wahnon Martins, consultor em assuntos europeus, explica que “há muitos oligarcas russos que têm origem judaica” e “Israel sempre teve activo o direito de retorno. O especialista destaca, por exemplo, o caso de Meyer Lansky, um gangster russo-americano, filho de judeus polacos, que viu a sua entrada em Israel vetada. Além disso, diz Wahnon Martins, há também “oligarcas judeus russos, com influência, que rumaram a Israel para se protegeram de Vladimir Putin”.

Sobre o impacto que estas viagens podem ter no papel de mediador de Israel, o consultor sublinha “que o actual Governo israelita é formado por uma coligação que pretende afastar qualquer relação com sistemas de corrupção”. “Basta recordar os processos em que o ex-primeiro ministro, Benjamin Netanyahu, está envolvido”, refere.

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