“Brexit”: cenário de chumbo do acordo final ganha força em Londres

Johnson, Raab, Rees-Mogg e Duncan Smith confrontaram May no Parlamento e fizeram saber que com a “solução backstop” em cima da mesa não darão lhe o seu apoio. DUP, Labour e SNP também estão contra.

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Boris Johnson e David Davis são ferozes opositores ao "Brexit" de May EPA/ANDY RAIN

O acordo de princípio sobre a declaração política que servirá de base para as negociações da relação pós-“Brexit” entre Londres e Bruxelas não alterou a posição dos principais opositores do esboço do tratado de saída do Reino Unido da União Europeia, defendido por Theresa May. Conservadores eurocépticos, unionistas norte-irlandeses, trabalhistas, nacionalistas-escoceses e liberais-democratas deixaram isso bem claro na sessão desta quinta-feira na Câmara dos Comuns de Westminster, convocada de urgência para a primeira-ministra apresentar os principais pontos do documento.

As reacções negativas dos deputados e a intransigência assumida por May na defesa dos dois textos – acordo de saída (585 páginas) e relação futura (26 páginas) – que serão apresentados aos 27 Estados-membros no próximo domingo, em Bruxelas, para ratificação, alimentam cada vez mais um cenário de chumbo do acordo definitivo do divórcio na câmara baixa do Parlamento britânico, numa votação que deverá acontecer em meados de Dezembro.

Na linha da frente nas críticas à estratégia de May estiveram antigos ministros do seu Governo, como Boris Johnson ou Dominic Raab, e figuras de topo da ala “brexiteer do Partido Conservador, como Ian Duncan Smith ou Jacob Rees-Mogg, que fizeram questão de intervir esta quinta-feira no Parlamento. Para deixar uma garantia: se a líder do executivo insistir em manter nos textos a parte referente à cláusula de garantia para impedir o regresso de uma fronteira física entre Irlanda do Norte e República da Irlanda – o backstop –, pode esquecer o seu apoio na hora de aprovar o acordo de saída.

“Até podemos aceitar as generalizações e as contradições desta declaração política, mas devemos mandar o backstop imediatamente para o lixo, sobre o qual a futura parceria económica se baseará e que resultará num ‘Brexit’ totalmente absurdo”, defendeu o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros.

O backstop implica a manutenção do Reino Unido dentro da união aduaneira e um alinhamento total da Irlanda do Norte com as regras do mercado único, caso não seja alcançado um novo acordo de livre comércio com a UE até ao fim do período de transição, em Dezembro de 2020 (extensível), ou não seja encontrada nenhuma solução para evitar a reposição dos controlos fronteiriços na ilha irlandesa.

Na mesma linha de Johnson, o antigo ministro do “Brexit” Dominic Raab – demitiu-se na semana passada, após a aprovação do esboço do acordo de saída no Conselho de Ministros – assegurou que a solução para a fronteira “prende o Reino Unido na união aduaneira e no mercado único” e deixa nas mãos de Bruxelas um “poder de veto” sobre a saída dos britânicos da UE. “O principal motivo pelo qual as pessoas votaram pela saída foi para recuperarmos o controlo sobre as nossas leis”, lamentou.

May, por seu lado, insiste: “Este é o acordo certo e cumpre a vontade do referendo. Restitui o controlo das nossas fronteiras, do nosso dinheiro e das nossas leis, e fá-lo enquanto protege o emprego, a nossa segurança e a integridade do Reino Unido”.

Do lado do Partido Democrático Unionista, que suporta o Governo tory no Parlamento, a questão também é colocada de forma simples: “Se quiser o apoio do meu partido ao acordo de saída, temos de acabar com o backstop”, afiançou o deputado Jeffrey Donaldson.

E Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista, afirmou que a declaração sobre a relação futura é “o pior de todos os mundos”, é “um salto no escuro” e representa o “‘Brexit’ às cegas que todos tememos”. “A única certeza contida nestas páginas é que o período de transição terá de ser alargado ou então arriscamo-nos a aplicar o backstop e ficar sem saída”, atirou Corbyn.

A sessão na Câmara dos Comuns foi ainda palco de inúmeros pedidos para a convocação de um novo referendo. Justine Greening, Dominic Grieve (conservadores), Chuka Umunna (trabalhista) ou Vince Cable (liberal-democrata) foram alguns dos deputados que defenderam uma consulta ao acordo que May quer aprovar em Bruxelas.

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