Protocolo para a Irlanda garante que não há fronteiras para o comércio

Ambas as partes comprometeram-se a manter viva a Cooperação Norte/Sul na ilha da Irlanda, e a respeitar integralmente os termos do Acordo de Sexta-feira Santa.

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Reuters

Nas 585 páginas do acordo de saída do Reino Unido da União Europeia encontra-se um protocolo específico para garantir que não é reposta a fronteira física entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte, que foi um dos termos inegociáveis do processo de divórcio. Ambas as partes comprometeram-se a manter viva a Cooperação Norte/Sul na ilha da Irlanda, e a respeitar integralmente os pontos do Acordo de Sexta-feira Santa, assinado em 1998 para pôr termo a décadas de violência e conflito sectário — há uma cláusula específica do protocolo que dá valor jurídico a esse compromisso.

Porque é que a fronteira da Irlanda se tornou um problema na negociação do “Brexit”?

A questão da fronteira só se levantou porque o Reino Unido decidiu que o “Brexit” implicava a retirada do país do mercado único europeu, que é o espaço interno de livre circulação de pessoas, bens, serviços e capitais. Essa decisão permite a Londres conduzir a sua política comercial de forma totalmente independente do resto da UE. No entanto, obriga à reposição de todas as fronteiras e controlos, quer das pessoas, quer das mercadorias, à entrada e saída do seu território. Ou seja, na ilha da Irlanda, teriam de ser repostos os mais de 300 postos fronteiriços entre a Irlanda (UE) e a Irlanda do Norte (Reino Unido) que foram abolidos pelos acordos de paz e cooperação.

Que solução foi encontrada para evitar a reposição da fronteira entre as duas partes da Irlanda?

Não existe ainda uma solução definitiva: a resposta a essa pergunta dependerá dos termos que as duas partes vierem a fixar no quadro da sua relação futura após o “Brexit”.  Mas há uma solução provisória, juridicamente operacional e vinculativa, conhecida como o “backstop”: trata-se de um mecanismo de salvaguarda que torna invisível a fronteira, que só será accionado se no fim do período de transição (Dezembro de 2020) ainda não estiver de pé a “ambiciosa parceria”, sob a forma de um acordo de livre comércio, que o Reino Unido e a União Europeia se comprometeram a assinar. E se o "backstop" for aplicado vigorará até esse acordo ser assinado.

Em que é que consiste o “backstop”?

Tal como definido no protocolo, as duas partes farão uma avaliação do ponto em que se encontram as negociações do futuro tratado de livre comércio em Julho de 2020. Se verificarem que não estão em condições de ter esse acordo concluído até ao fim do período de transição do “Brexit (isto é, em Dezembro de 2020), estão previstas duas formas de evitar o retorno da fronteira: o alargamento do período de transição, por um prazo limitado (que ainda não foi definido) ou a aplicação do “backstop”.

Este tem a forma de uma nova área aduaneira comum, que abarca todo o território dos 27 Estados membros da UE e todo o território britânico (incluindo, claro, a Irlanda do Norte). Nesse espaço comum não serão aplicadas tarifas e quotas alfandegárias, nem existirão controlos sobre mercadorias que tenham origem no Reino Unido ou na União Europeia. Em relação aos produtos que venham de países terceiros, os dois blocos aplicarão exactamente as mesmas tarifas.

Além disso, de forma a garantir a “igualdade de circunstâncias” dos agentes económicos que integram essa área aduaneira comum (o "backstop"), o Reino Unido aceita respeitar as regras de concorrência e de ajudas de Estado da UE, e manter em vigor as mesmas leis laborais e de protecção social, as mesmas normais ambientais e o mesmo código tributário.

E esse sistema evita a fronteira na Irlanda?

A área aduaneira comum garante que a integridade territorial do Reino Unido não é comprometida e que não há fricção no comércio entre o Reino Unido e a União Europeia. Como a UE exigia mais garantias de que não será reposta a fronteira na Irlanda “em nenhumas condições”, o protocolo estabelece um regime mais apertado para a Irlanda do Norte se o "backstop" entrar em vigor. Ao contrário do resto do Reino Unido, a Irlanda do Norte manterá um alinhamento total com as regras do mercado único, garantindo que não existem quaisquer restrições à livre circulação na ilha. E aplicará integralmente o Código Aduaneiro da UE para proteger a integridade do mercado interno e evitar todos os controlos entre as duas Irlandas.

Mas o regime diferente da Irlanda do Norte não cria fricções no comércio com o resto do Reino Unido?

Não. A Irlanda do Norte faz parte do território do Reino Unido, que por sua vez integra a área aduaneira comum, beneficiando da mesma isenção de tarifas, de quotas e de verificação da origem das mercadorias. Porém, o estatuto "alinhado" da Irlanda do Norte concede-lhe uma situação mais favorável nas trocas comerciais com a União Europeia do que os restantes países do Reino Unido (Inglaterra, Escócia e País de Gales), uma vez que os seus produtos poderão chegar ao mercado comum sem nenhuma restrição.

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