Investimento dos vistos gold caiu 70% até Julho deste ano

Montante de capitais aplicado em Portugal caiu para cerca de 247 milhões, longe dos 817 milhões dos primeiros sete meses de 2014. Julho foi marcado pela emissão de apenas dez vistos, todos a chineses.

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Maioria dos vistos têm sido concedidos a chineses Enric Vives-rubio

A emissão de Autorizações de Residência para Investimento (ARI, mais conhecidos por vistos gold) voltou a cair drasticamente em Julho, com apenas dez pedidos autorizados, agravando a tendência de queda que se verifica desde o final do ano passado, após o escândalo de corrupção que levou à prisão de altos responsáveis da administração pública e à demissão do ministro da Administração interna, Miguel Macedo.

Em termos acumulados, entre Janeiro e Julho deste ano o valor do investimento ligado à emissão dos vistos gold caiu 70% face a idêntico período do ano passado, passando de 817 milhões de euros para cerca de 247 milhões.

A queda registada em Julho acontece no mês em que o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) suspendeu o processo de emissões durante cerca de duas semanas, por falta de enquadramento legal entre o anterior e o novo regime legal, aprovado este ano na Assembleia da República (Lei 63/2015).

Em valor, o investimento realizado em Julho ficou-se por apenas 5,6 milhões de euros, o que significa que foi aplicado praticamente o mínimo exigido para a atribuição de vistos através da aquisição de imóveis, que é de 500 mil euros. A comparação do investimento realizado com o mês do ano passado revela uma forte queda, uma vez que esse mês o capital aplicado ascendeu a 92 milhões de euros.

A emissão dos 10 vistos gold em Julho, todos a cidadãos chineses, e todos através da aquisição de imóveis, fica abaixo dos 36 atribuídos em Junho, e muito próximo do mínimo do ano, verificado em Maio, com apenas oito autorizações.

Os números de concessão de ARI estão claramente em desaceleração. Até Julho deste ano foram emitidas 408 autorizações, bem abaixo do ritmo verificado no ano passado, em que foram decididos favoravelmente 1526 pedidos. Ou seja, de uma média mensal de 126 ARI, em 2014, passou-se para uma média de 58, em 2015.

O valor máximo mensal foi registado em Outubro do ano passado, totalizando 211 ARI. Este número foi registado precisamente no mês anterior ao escândalo da alegada rede de corrupção, conhecida por Operação Labirinto. Em Novembro ainda foram emitidos 161 vistos, mas depois os números caíram drasticamente.

No total, desde finais de 2012 até Julho deste ano, foram emitidos 2430 ARI, dos quais 2299 por investimento imobiliário, 128 por transferência de capital (no mínimo de um milhão de euros), e apenas três por criação de emprego (no mínimo de 10 trabalhadores). O investimento total realizado ao abrigo deste programa ascende a cerca de 1475 milhões de euros.

Os chineses lideram destacadamente os pedidos, com 1957 autorizações. Seguem-se o Brasil (87), a Rússia (79), a África do Sul (60) e o Líbano (36).

Atrasos do Governo
O número de processos pendentes não é conhecido oficialmente, mas a avaliar pela informação de algumas mediadoras imobiliárias, ascenderá a largas centenas.

Em Março deste ano, Paulo Portas, vice-primeiro-ministro e ministro de Estado, admitia a queda dos primeiros meses face ao período homólogo. “Já começámos a recuperar”, defendeu então, acrescentando que o “o sistema é em si mesmo meritório e aperfeiçoável”.

Para já, os números não confirmam a recuperação referida, e o Governo tem algumas responsabilidades na quebra registada. Para além de um alegado aumento dos procedimentos burocráticos, gerados por “orientações contraditórias”, segundo denúncia do sindicato dos trabalhadores SEF afectos a esse serviço, o processo legislativo sofreu atrasos, levando à suspensão das emissões durante boa parte do mês de Julho.

A nova lei de enquadramento dos ARI, criada na sequência da alegada rede de corrupção, entrou em vigor a 1 de Julho, mas a preparação e publicação do decreto-regulamentar desta lei não aconteceu em tempo útil, o que levou o director geral do SEF a ordenar a suspensão das emissões de ARI entre 1 e 17 de Julho.

A emissão parcial de vistos gold foi retomada a 20 de Julho, antes mesmo da promulgação e publicação em Diário da República do decreto-regulamentar da nova lei, que ainda não aconteceu. A retoma foi possível após um despacho do Secretário de Estado da Administração Interna que permitiu dar andamento aos processos que não sofreram alterações com a nova legislação, mantendo em vigor as regras anteriores.

Na prática, a medida abrangerá a totalidade dos processos pendentes, uma vez que as novas área que permitirão acesso a vistos gold, como o investimento em reabilitação urbana, financiamento de actividades de investigação e apoio à produção artística, recuperação de património cultural, financiamento de PME através de capital de risco, entre outras áreas, aguardam a nova regulamentação.

Os atrasos na legislação, a alegada falta de recursos humanos afectos a decisão destes processos tem gerado fortes críticas de várias associações empresariais, especialmente as ligadas à mediação imobiliária, construção e resorts.

Manuela Niza Ribeiro, presidente do SINSEF, o sindicato que representa os trabalhadores administrativos do SEF, refuta a responsabilidade dos trabalhadores nos atrasos que têm sido referidos. Em declarações ao PÚBLICO, em Julho, a dirigente sindical atribuiu os atrasos "às orientações contraditórias e constantes mudanças em relação a procedimentos a adoptar” e ao reduzido número de trabalhadores afecto a esse serviço.

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