Alterações climáticas? “Um hobby”, diz político que pode governar os Países Baixos

Geert Wilders (e o seu partido de extrema-direita) é mais conhecido pelas posições anti-Islão e anti-imigração. Mas, se chegar ao poder, tirará os Países Baixos do Acordo de Paris.

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Geert Wilders quer que os Países Baixos abandonem políticas de redução das emissões de dióxido de carbono KOEN VAN WEEL/EPA
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Se não se reduzirem de forma significativa as emissões de gases com efeito de estufa, o nível do mar na costa dos Países Baixos pode subir dois metros em 2100, se comparado com o início do século XXI, concluiu um estudo do Instituto Real de Meteorologia daquele país de 2021. Mas tirar os Países Baixos de acordos internacionais para reduzir as emissões, como o Acordo de Paris, é uma das propostas do programa do Partido da Liberdade, liderado pelo político de extrema-direita holandês Geert Wilders, que foi o vencedor surpresa das legislativas quarta-feira.

“Durante décadas fizeram-nos ter medo das alterações climáticas… Temos de deixar de ter medo”, diz o programa eleitoral do partido de extrema-direita holandês, citado pela AFP. Os holandeses têm os melhores engenheiros hidráulicos do mundo, por isso não é preciso entrar em pânico com a subida do nível do mar, sumariza o documento. Os que se preocupam com o clima, diz Wilders, fazem-no “como um hobby”.

As ideias do partido do político que se celebrizou pelos virulentos ataques contra o Islão e por ser anti-imigração passam por manter as centrais eléctricas a carvão e a gás em funcionamento, aumentar a extracção de gás natural no Mar do Norte e incluem a produção de energia nuclear, construindo uma nova central.

Ao mesmo tempo, quer abandonar políticas de redução das emissões de dióxido de carbono (CO2), o principal gás com efeito de estufa (que causa as alterações climáticas), deixar de investir em painéis solares e parques eólicos, ou seja, em energias renováveis. Além da saída do Acordo de Paris, mandar a lei do clima “para a trituradora de papel”.

O Partido da Liberdade de Wilders conquistou 37 lugares no Parlamento de 150, ficando em primeiro lugar. Mas isso não é suficiente para formar governo. Tentará formar uma aliança com outras forças – como o Movimento Cidadão dos Agricultores (conhecido pela sigla em holandês, BBB), populista de direita e defensor dos interesses dos agricultores, nascido dos protestos contra as iniciativas do Governo cessante, liderado por Mark Rutte, para tentar reduzir o impacto da poluição por azoto que criou mesmo aquilo que é designado por "crise do azoto", ou stikstofcrisis.

Crise do azoto perdeu força

O BBB foi o vencedor-surpresa das eleições regionais que determinam a composição do Senado em Março, com um programa de protesto contra o programa para a redução das emissões de azoto – que é também um potente gás com efeito de estufa, sob a forma de óxido nitroso – até 2030. Este passam pela cessação de actividade de muitas explorações agrícolas, essencialmente de produção leiteira, que são responsáveis pela produção de 80% deste tipo de poluição nos Países Baixos.

No entanto, nestas legislativas, o BBB ficou em sexto lugar, e não terá tido mais do que seis lugares no Parlamento. Não conseguiu manter o ímpeto – porque estas eleições, explicou o investigador especialista em extrema-direita Cas Mudde num artigo no jornal The Guardian, se jogaram sobretudo em torno dos temas da imigração (foi a impossibilidade de chegar a acordo sobre a política de imigração que levou à queda do Governo de coligação de Mark Rutte, do Partido Popular para a Democracia e Liberdade, de direita). Este tema favoreceu Geert Wilders.

A preocupação com a possibilidade de um Governo liderado por Geert Wilders junta, no entanto, movimentos de defesa dos direitos dos imigrantes e minorias (como imigrantes de origem muçulmana) e activistas pelo ambiente e questões climáticas, que têm sido bastante activos nos Países Baixos, também. Há cerca de duas semanas, a sueca Greta Thunberg falou numa manifestação exigindo acção pelo clima em Amesterdão, que juntou 70 mil pessoas.

Entre os participantes estava Frans Timmermans, o ex-comissário europeu holandês, com a pasta da acção climática. Regressou aos Países Baixos para liderar uma coligação do Partido Trabalhista com os Verdes, que se apresentou como a formação política que luta pelo clima. Ficou em segundo lugar nas eleições.

“Um Governo liderado por Wilders significaria quatro anos de negacionismo das alterações climáticas, exclusão e colapso do Estado de direito”, disse a organização Amigos da Terra dos Países Baixos (Milieudefensie).

Estão já convocadas manifestações contra o partido de Geert Wilders, convocadas juntamente por movimentos sociais e de activismo ambiental. As primeiras realizaram-se já nesta quinta-feira.

“Este resultado torna provável uma volta atrás nas medidas climáticas, novos investimentos em combustíveis fósseis, exclusão de grupos marginalizados, e mais ainda. O futuro de tudo e de todos está em causa. Portanto, vamos continuar a agir”, disse, em comunicado, a Extinction Rebellion dos Países Baixos, citada pelo site em inglês NLTimes.

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