Novo Banco já transferiu depósitos de empresas venezuelanas para conta do tribunal

Instituição financeira portuguesa diz que a sentença era aguardada e não terá impacto nos seus rácios de liquidez ou capital.

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Montante depositado no Novo Banco era reclamado há muito pelo presidente da Venezuela, Nicolas Maduro Reuters/LEONARDO FERNANDEZ VILORIA
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Na sequência do anúncio feito pelo Governo venezuelano de desbloqueio, por decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, de 1,5 mil milhões de dólares (cerca de 1,3 mil milhões de euros) reclamados por várias empresas públicas do país, o Novo Banco esclareceu que já não tem na sua posse esses valores.

“Precisamente por força da existência de dúvidas [de legitimidade de acesso aos depósitos], o Novo Banco tinha já, em 2021, procedido à transferência para uma conta dos tribunais portugueses da totalidade dos fundos não-bloqueados pertencentes a entidades públicas venezuelanas”, esclarece a instituição, em resposta ao PÚBLICO.

A instituição que nasceu da intervenção do Banco Espírito Santo, que manteve forte ligação à Venezuela, não refere os montantes transferidos para conta caucionada à guarda da Justiça portuguesa.

O Novo Banco adianta ainda que a decisão judicial “era aguardada” e “vem esclarecer questões que o banco tinha já suscitado, por sua iniciativa, junto dos tribunais portugueses, em virtude das dúvidas existentes relativamente à representação legal das entidades públicas venezuelanas”.

Acrescenta que, “à luz dos deveres legais impostos a instituições bancárias, o Novo Banco não poderia proceder a quaisquer transferências bancárias enquanto as referidas dúvidas não fossem clarificadas”, e que “a situação em causa não se verifica exclusivamente em Portugal, sendo vários os casos de idêntica natureza que correm em tribunais estrangeiros”. Por último, a instituição adianta que “a sentença agora conhecida não tem impacto nos rácios de liquidez ou capital do Novo Banco”.

A decisão judicial foi tornada pública pelo Governo venezuelano e noticiada esta quinta-feira pela Lusa.

“O Governo bolivariano [da Venezuela] ganha acção judicial e recupera os seus activos em Portugal. Mil e quinhentos milhões de dólares foram desbloqueados do Novo Banco”, afirmou o ministro de Comunicação e Informação da Venezuela, Freddy Ñañez, na sua conta na rede social X (ex-Twitter), avança a agência de notícias, acrescentando que “o ministro acompanha a mensagem com a publicação de imagens, em idioma castelhano, de decisão do Tribunal Central Civil de Lisboa”.

De acordo com a documentação apresentada por Ñañez, o tribunal ordenou a devolução dos fundos do Banco Bandes Uruguai SA, da Petrocedeño, da Pdvsa Services BV, da Petromonágas, Petropiar e da Bariven.

Os fundos que a Venezuela afirma que vão ser desbloqueados foram retidos depois de, em Janeiro de 2019, o líder opositor Juan Guaidó declarar publicamente que assumiria as funções de Presidente interino da Venezuela, até afastar Nicolás Maduro do poder. Guaidó foi apoiado por mais de 50 países, entre os quais Portugal.

Entretanto, de acordo com a Lusa, a oposição venezuelana já reagiu ao anúncio, insistindo que a Venezuela não terá acesso a esses fundos, devido a sanções internacionais impostas pelos EUA. “A protecção do dinheiro do Bandes que se encontra no Novo Banco [já à guarda do tribunal] tem por base acções do Tesouro (dos EUA) sobre o Bandes e, enquanto essas acções existirem, Nicolás Maduro não terá acesso a esse dinheiro”, escreveu o ex-deputado Carlos Paparoni nas redes sociais.

Acções contra a Venezuela

As relações financeiras entre entidades do país sul-americano e o antigo Grupo Espírito Santo eram próximas, e, neste âmbito, o Governo de Nicolás Maduro tem tentado recuperar o investimento feito pelo Banco de Desenvolvimento Económico e Social da Venezuela na compra de dívida do grupo português, que se encontra em liquidação.

Pela justiça portuguesa passam ainda acções judiciais com vista à recuperação de créditos relacionados com a nacionalização de vários negócios de empresas estrangeiras, por parte do Governo então liderado por Hugo Chaves. É o caso da vidreira norte-americana Owens-Illinois, o Banco San Juan Internacional, e a petrolífera Conocophillips.

Não há informação concreta para explicar a escolha de Portugal para a apresentação destas acções, mas os créditos reclamados, mais de 500 milhões de euros, ficam abaixo dos depósitos “retidos”.

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