Da Europa aos EUA: mundo continua a sofrer com calor abrasador, seca e incêndios

“A crise climática pode ser uma realidade, mas não pode ser uma desculpa”, afirmou o primeiro-ministro grego, depois de os incêndios florestais terem devastado quintas e fábricas durante a noite.

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Na cidade de Volos, na Grécia, os incêndios deixam um lastro de destruição Reuters/ALEXANDROS AVRAMIDIS

A Europa continua a lutar contra os efeitos do tempo seco e abrasador, que está a provocar incêndios em várias regiões do continente. Do outro lado do oceano, nos EUA, cerca de 180 milhões de norte-americanos - perto de metade da população do país - estão sob vigilância e alerta de calor, com previsões de temperaturas acima de 37 graus Celsius até, pelo menos, sábado. No meio de um caos climático em vários países do hemisfério Norte, tudo indica que o mês de Julho vai bater o recorde de Junho, que tinha sido o mês mais quente de que há registo nos 174 anos de monitorização da temperatura.

Na Grécia, onde houve mais de 500 incêndios desde o início do ano, 61 incêndios florestais deflagraram em apenas 24 horas na quarta-feira. Intensificados por ventos fortes e temperaturas superiores a 40 graus Celsius, os incêndios mataram duas pessoas na zona costeira de Magnesia, a norte de Atenas, elevando para cinco o número de mortos devido aos incêndios, e obrigaram a uma nova vaga de evacuações.

Nesta região, foi preciso evacuar partes da cidade de Nea Aghialos, onde foram ouvidas explosões num depósito de munições. De acordo com a televisão estatal ERT, o depósito de munições pertencia às forças aéreas gregas, mas não terá causado feridos.

Os incêndios que lavram desde 19 de Julho na ilha de Rodes obrigaram à retirada de cerca de 20 mil pessoas durante o fim-de-semana. Milhares de turistas foram obrigados a regressar a casa e os operadores turísticos cancelaram as próximas viagens.

O primeiro-ministro, Kyriakos Mitsotakis, reconheceu que a Grécia precisa de tomar mais medidas para combater os efeitos das alterações climáticas, depois de os incêndios florestais terem devastado quintas e fábricas durante a noite e deixado os agricultores a retirar os seus animais. “A crise climática pode ser uma realidade, mas não pode ser uma desculpa”, afirmou durante uma reunião com a Presidente, Katerina Sakellaropoulou.

Embora os incêndios de Verão sejam comuns na Grécia, os cientistas afirmam que as temperaturas mais elevadas e o tempo mais seco estão a transformar o país num hotspot das alterações climáticas no Mediterrâneo.

“O nosso país deve tomar mais medidas para estar preparado para mitigar, tanto quanto possível, os efeitos de uma realidade que já começamos a sentir e que pode ter efeitos dramáticos em muitos aspectos diferentes da nossa vida económica e social”, afirmou Mitsotakis.

Seca e fogos

Em Itália, os bombeiros italianos combateram cerca de 1400 incêndios entre domingo e terça-feira, 650 dos quais localizados na Sicília - onde três idosos morreram na região de Palermo - e 390 na Calábria, onde outro homem, de 98 anos, morreu quando o fogo destruiu a sua casa. No domingo, a temperatura nalgumas zonas do Leste da Sicília subiu para 47 graus Celsius, perto do recorde europeu de 48,8 graus de há dois anos.

Portugal continental, que tem sido poupado das ondas de calor que assolam a Europa, enfrenta uma seca generalizada, com cerca de 90% do país afectado. Também a vizinha Espanha está a atravessar um período prolongado de seca, tendo os primeiros quatro meses de 2023 sido os mais secos de que há registo.

Em França, na terça-feira, mais de 300 bombeiros lutavam para conter os incêndios perto da cidade de Arles, enquanto vários outros incêndios eclodiram no Sudoeste do país, e a região de Bocas do Ródano, no Sul, foi colocada sob alerta vermelho.

Na Suíça, mais de 200 pessoas tiveram de ser retiradas, devido a um incêndio florestal, de uma montanha em Bitsch, no cantão de Valais, perto da fronteira italiana. O incêndio deflagrou em 17 de Julho e a situação era “estável” em 22 de Julho, segundo as autoridades.

Calor nos EUA “coroa” mês mais quente

Do outro lado do oceano, cerca de 180 milhões de norte-americanos - perto de metade da população dos EUA - estão sob vigilância e alerta de calor, com previsões de temperaturas acima de 37 graus Celsius até, pelo menos, sábado, de acordo com o Serviço Nacional de Meteorologia norte-americano.

Há semanas que uma onda de calor prolongada se abateu sobre o Sudoeste dos Estados Unidos. Prevê-se que Phoenix, no Arizona, registe o seu 28.º dia consecutivo de temperaturas acima dos 43,3 graus Celsius, tendo já ultrapassado o anterior recorde de 18 dias consecutivos. Nesta quinta-feira, uma onda de calor cada vez mais intensa invadiu o Leste dos Estados Unidos.

O presidente dos EUA, Joe Biden, pediu à secretária-adjunta do Trabalho, Julie Su, que emitisse um alerta de perigo de calor, esclarecendo as protecções de que os trabalhadores podem usufruir, à medida que as temperaturas sobem em todo o país. "Os trabalhadores da construção civil arriscam as suas vidas a trabalhar o dia todo sob um calor abrasador e, em alguns locais, nem sequer têm o direito a fazer uma pausa para beber água. Isso é revoltante", disse Biden.

O calor extremo é a principal causa de mortes relacionadas com o clima nos Estados Unidos, de acordo com o Gabinete de Estatísticas do Trabalho, que mostra que 436 trabalhadores morreram devido a condições de calor desde 2011.

Biden anunciou também que o governo federal está a tomar outras medidas de adaptação à crise climática. O Serviço Florestal dos EUA vai conceder mais de mil milhões de dólares em subsídios para ajudar os municípios a plantar árvores para mitigar o calor.

Depois de se reunir na quinta-feira com a presidente da câmara de Phoenix, Kate Gallego, e o presidente da câmara de San Antonio (Texas), Ron Nirenberg, para discutir o impacto que o Verão quente teve nas suas cidades do Sul, Joe Biden discursou sem meias-palavras: "Penso que já ninguém pode negar o impacto das alterações climáticas."

"Mesmo aqueles que negam que estamos no meio de uma crise climática não podem negar o impacto que o calor extremo está a ter nos norte-americanos", acrescentou mais tarde, apelando às populações mais vulneráveis que permaneçam em casa.

“Cuide de si e das pessoas à sua volta”

As autoridades de Nova Iorque, Washington D.C., Filadélfia e outras grandes cidades pediram às pessoas que evitassem trabalhar ou passar tempo ao ar livre, e que bebessem muitos líquidos e estivessem atentas aos seus vizinhos, familiares e amigos.

“Os próximos quatro dias serão extremamente quentes - cuide de si e das pessoas à sua volta”, disse a presidente da câmara de Washington, Muriel Bowser, na plataforma de comunicação social X (anteriormente conhecida como Twitter). Espera-se que o índice de calor na capital do país, uma medida da sensação de temperatura para o corpo humano, atinja os 41,7 graus Celsius.

Também foram abertos centros de arrefecimento em toda a cidade de Nova Iorque para as pessoas que não têm acesso a ar condicionado. O índice de calor poderá atingir os 39,4°C na sexta-feira na cidade mais populosa dos Estados Unidos.

“O calor é mortal e as alterações climáticas estão a tornar o calor extremo mais frequente e ainda mais perigoso, especialmente para os nova-iorquinos vulneráveis”, afirmou o Comissário da Saúde de Nova Iorque, Ashwin Vasan, em comunicado.

O mês de Junho de 2023 foi o mais quente de que há registo nos Estados Unidos, desde 1850. Foi também o 47.º mês de Junho consecutivo e o 532.º mês consecutivo com temperaturas acima da média do século XX. Já a nível global, prevê-se que a temperatura média deste mês de Julho seja de cerca de 1,5 graus Celsius acima da média pré-industrial, pelo menos 0,2°C mais quente do que Julho de 2019, o anterior mais quente no registo observacional de 174 anos, segundo dados da União Europeia.

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