Manuais escolares: hábito ou necessidade?

Como se apagam estes bocadinhos de vida? Como se eliminam as emoções passadas para estas páginas? Como não deixar vestígios dos sucessos e das aprendizagens fáceis ou com bastante custo?

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"Todos devem ter direito a manuais novos. Uns não pagam, outros pagam" Matilde Fieschi/Arquivo
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O assunto dos manuais escolares que devem ser devolvidos é, no mínimo, desafiador.

Ouvimos várias vezes dizer que os livros são os nossos melhores amigos. Encerram em si histórias, fazem-nos sonhar, estimulam a nossa imaginação pelas imagens que vão povoando a nossa cabeça, à medida que vamos lendo e montando visualmente os cenários e as personagens. Facilitam a criatividade pela estimulação da vontade de fazer coisas novas, coisas essas, que vamos lendo.

Quantos de nós, na adolescência e juventude e mesmo na idade adulta, não replicámos aventuras ou apenas algumas experiências daquilo que lemos?

A inovação é outra característica que a leitura espoleta, pois quando o leitor é impelido a experimentar aquilo que está a ler, quase sempre são coisas inovadoras, pelo menos para si mesmo.

A criatividade, imaginação e inovação são um trio inseparável!

O que dizer dos manuais escolares? Livros onde se escreve, aponta, pinta, nos quais se fazem garatujas conforme o estado de alma do momento, onde se apaga até quase fazer um buraco, ou fazer mesmo um buraco. Livros que se guardam numa mochila que apanha chuva, que se mistura com os lanches, fatos de educação física usados e transpirados, enfim, um sem número de episódios da vida diária que são difíceis, se não mesmo impossíveis, de eliminar qualquer vestígio.

Como se apagam estes bocadinhos de vida? Como se eliminam as emoções passadas para estas páginas? Como não deixar vestígios dos sucessos e das aprendizagens fáceis ou com bastante custo?

Mas os livros não são para escrever, apontar, pintar, sublinhar, viver. São apenas para ler, ver e observar. A sério? Como é possível pedir isso a uma criança? Como é possível pedir isso a quem estuda? A aprendizagem faz-se de muitas maneiras e uma delas é usar literalmente os manuais escolares.

Para a maioria das crianças e adolescentes o deixar os manuais escolares de lado assim que termina o ano lectivo, não é difícil. Passado um tempo, um bom tempo, o voltar a folheá-los traz memórias que consolidam as aprendizagens das matérias, mas também as etapas de crescimento vividas.

Uma coisa é as crianças largarem os manuais assim que terminam as aulas, desejosas de férias e de outras rotinas. Outra bem diferente é receber, no início de um ano lectivo, novinho em folha, a estrear, manuais carregados de estórias, de vivências e de emoções. Até que ponto, esta circunstância que objectivamente parece de menor importância tem impacto na aprendizagem?

Por detrás desta medida de reutilização dos manuais escolares está a quantidade de papel que todos os anos é gasto e desperdiçado em livros que só servem para uma criança durante um ano lectivo. A solução encontrada foi a de fazer circular esses manuais. Que outras alternativas existem para que essa utilização única e desperdício de papel impresso não aconteça?

Na altura da pandemia, lembro-me que num relatório de uma organização mundial, a solução era a de encontrarmos alternativas aos meios digitais, pois o acesso a esses não é universal em todos os países. As aprendizagens ficaram comprometidas e os planos de recuperação multiplicaram-se pelas diferentes geografias.

O que fazer em alternativa a esta rotatividade e reutilização dos manuais escolares? Todos devem ter direito a manuais novos. Uns não pagam, outros pagam. Qual o peso dos manuais escolares no orçamento familiar, por filho, para os que pagam? Eu acabei de comprar para o 8.º ano e foi à volta de 300 euros.

Que alternativas existem aos manuais, aos livros de fichas e cadernos de actividades e aos meios digitais? Há sempre mais do que uma alternativa para qualquer que seja o desafio, todos sabemos disso. O que fomos complicando no caminho da aprendizagem e educação para termos chegado aqui? Como é possível descomplicar e voltar a simplificar?

Os professores são os mestres que sabem das matérias que ensinam, as bibliotecas encerram em si muita sabedoria, sempre ou quase sempre, disponíveis para todos, a Internet aí está nas escolas também de forma gratuita. Qual a necessidade de obrigação de aquisição dos manuais escolares? Onde complicámos o processo?

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