Depois das acusações, Kevin Spacey volta ao cinema num filme de Franco Nero

O actor, acusado por mais de duas dezenas de pessoas de abuso e assédio sexual, já não aparecia em filmes desde 2017 e vai fazer um pequeno papel de detective em L’uomo Che Disegno Dio.

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Kevin Spacey nos prémios Tony de 2017 LUSA/JASON SZENES

L’uomo Che Disegno Dio, ou O Homem que desenhou Deus, é um filme que será rodado em Itália sobre um artista cego que consegue desenhar pessoas só ouvindo a voz delas. É a segunda longa-metragem como realizador de Franco Nero, o italiano que, como actor, trabalhou como nomes como John Huston, Rainer Werner Fassbinder, Luis Buñuel ou Claude Chabrol, entre muitos outros, tendo sido também o Django do western spaghetti homónimo de Sergio Corbucci. No elenco estará o próprio Nero, a sua mulher, a britânica Vanessa Redgrave, o actor americano Robert Davi e um nome inesperado: o de Kevin Spacey. O filme marcará a primeira vez que Spacey, que fará um pequeno papel como detective, aparece numa produção desde que, em 2017, foi acusado por várias pessoas de abuso e assédio sexual.

A notícia foi dada este domingo pela ABC News, que cita o próprio Nero: “Estou muito feliz que o Kevin tenha aceitado participar no meu filme. Considero-o um grande actor e não posso esperar por começar o filme.” O jornal Variety falou com Louis Nero, o produtor do filme, que disse o papel que Spacey, que ganhou o Óscar de Melhor Actor Secundário em 1996 por Os Suspeitos do Costume e o de Melhor Actor no ano 2000, por Beleza Americana, terá na produção. O jornal britânico The Independent foi mais longe e afirma esta segunda-feira que a personagem de Spacey investigará uma falsa alegação de pedofilia.

Spacey foi acusado pelo actor Anthony Rapp de ter feito avanços sexuais contra ele quando Rapp tinha apenas 14 anos. Spacey respondeu que não se lembrava, mas pediu desculpas pelo que seria comportamento de alguém alcoolizado e aproveitou para revelar que, apesar de ter tido relações com mulheres e homens, “escolhia” “viver a vida como um homem gay”. Em Setembro do ano passado, Rapp processou Spacey, um processo ainda a decorrer. Seguiram-se muitas outras acusações. Nos tempos em que Spacey foi director artístico do teatro Old Vic, em Londres, entre 2003 e 2015, vários alunos e actores dizem que este os terá assediado e apalpado, empregados de negócios à volta do teatro também dizem que ele se expôs a eles. Estes alegados comportamentos de Spacey tinham sido alvo de piadas ao longo dos anos em séries como Family Guy ou Difficult People.

O filho de Richard Dreyfuss, Harry, que tinha 18 anos na altura, diz que Spacey lhe apalpou os genitais em 2008. O realizador Tony Montana, que fez o documentário Overnight, tem uma história parecida, que envolve um apalpão e uma perseguição até à casa-de-banho de um bar em Los Angeles. Há também um acusador anónimo, um artista nova-iorquino que diz que, no início dos anos 1980, quando tinha 14 anos e Spacey 24, os dois mantiveram uma relação sexual e o actor o tentou violar. Esse artista juntou-se ao processo de Rapp contra Spacey, e no início deste mês, um juiz nova-iorquino obrigou o artista a quebrar o anonimato se quisesse manter o processo. Houve também várias acusações de apalpões e outros abusos nas rodagens de House of Cards, série Netflix da qual Spacey foi despedido e em cuja derradeira temporada acabou por não participar.

Nos tribunais, o actor foi acusado de agressão sexual em 2018, por um incidente que se terá passado com um rapaz de 18 anos num bar no Massachusetts em 2016, uma acusação que ele negou. As acusações foram retiradas em 2019. Linda Culkin, que acusou Spacey de assediar rapazes novos e declarada stalker do actor, tendo sido sentenciada a quatro anos de prisão por enviar ameaças de morte e de bomba a Spacey, foi atropelada em 2019, o mesmo ano em que um acusador anónimo de Spacey, um massagista a quem o actor terá obrigado a tocar nos seus genitais durante uma massagem em sua casa, morreu de cancro um mês antes de o caso ir a tribunal. Não foram os únicos: Ari Behn, um autor norueguês que foi casado com a princesa Marta Luísa da Noruega, morreu de um aparente suicídio no Natal desse ano. Tinha alegado que Spacey o tinha apalpado num concerto uma década antes.

Ainda em 2017, Spacey foi apagado digitalmente de Todo o Dinheiro do Mundo, filme de Ridley Scott, e substituído em tempo recorde por Christopher Plummer. O último filme em que apareceu foi Clube dos Bilionários, de James Cox. O actor tem feito, ao longo dos anos, vídeos em que volta a encarnar a personagem Frank Underwood, o protagonista de House of Cards, no YouTube. 

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