Fusão entre Fiat e Peugeot aprovada por Bruxelas

Comissão Europeia ficou satisfeita com medidas de protecção da concorrência. A PSA manterá colaboração com a Toyota. Accionistas votam fusão a 4 de Janeiro de 2021.

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O português Carlos Tavares vai liderar o grupo resultante da fusão entre Fiat-Chrysler e Peugeot-Citroën Benoit Tessier/Reuters (arquivo)

Está dada luz verde para o negócio do ano na indústria automóvel, com a constituição do quarto maior construtor de carros do mundo. Seis meses depois de ter anunciado uma investigação aprofundada à proposta de fusão entre os grupos italo-americano Fiat-Chrysler (FCA) e francês Peugeot-Ciroën (PSA), a Comissão Europeia aprovou o negócio, abrindo caminho ao nascimento de um novo player mundial, que passa a chamar-se Stellantis.

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Logotipo do grupo Stellantis, que resulta da fusão entre Fiat-Chrysler e Peugeot-Citroën DR

Esse foi o nome escolhido pela FCA e a PSA para o grupo que resulta desta fusão e que agora tem caminho aberto para se tornar oficial dentro do calendário que era pretendido. A ideia era selar o negócio até ao final do primeiro trimestre de 2021.

A designação Stellantis será usada apenas em termos corporativos. As marcas detidas pelo grupo incluem Fiat, Chrysler, Jeep, Dodge, Ram, Lancia e Maserati, bem como Peugeot, Citroën, Vauxhall-Opel (adquirida pela PSA à General Motors em 2017) e DS.

Nesta fusão, a PSA ganha, pela porta da FCA, acesso ao mercado norte-americano, onde quase não tem expressão. A FCA, por seu lado, reforça a sua capacidade de modernização, sobretudo no domínio dos electrificados – pode até prescindir da parceria que tem com a Tesla, que estabeleceu para beneficiar dos créditos de emissão de CO2 da Tesla e, com isso, cumprir os limites de emissões exigidos na União Europeia.

Como a FCA está atrasada em matéria de electrificados, pode passar a beneficiar do trabalho mais adiantado do parceiro PSA.

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John Elkann é "a voz" da família Agnelli, fundadora da Fiat, e do grupo Fiat-Chrysler, na Stellantis Massimo Pinca/Reuters (arquivo)

A Stellantis será chefiada pelo português Carlos Tavares, que lidera a PSA. A presidência do conselho de administração será de John Elkann, que já era o chairman da FCA.

Os dois grupos que se unem estimam poupanças de seis mil milhões de euros em custos operacionais com este casamento. Prometeram manter todas as fábricas. 

“FCA e PSA recebem com agrado a autorização da Comissão Europeia para a criação da Stellantis, um líder mundial da nova mobilidade”, lê-se num comunicado conjunto destes dois grupos. No ranking mundial de construtores, a Stellantis fica apenas atrás do líder mundial Volkswagen, bem como da Toyota e da aliança Renault-Nissan. 

Os accionistas da FCA e da PSA reunir-se-ão no mesmo dia, 4 de Janeiro de 2021, de forma separada, para aprovarem o avanço do negócio. O grupo FCA é controlado pela Exor, por sua vez holding gestora da família Agnelli (fundadora da Fiat). O grupo PSA, por sua vez, é detido pela família Peugeot, pelo governo francês e pelo grupo chinês Dongfeng.

Ajuda à Toyota e abertura à concorrência

A investigação aprofundada é um mecanismo usual no contexto da União Europeia para apurar se um determinado negócio põe em causa a concorrência, se pode criar monopólios ou concentrar poder de mercado de tal forma que ponha em risco o equilíbrio desse mercado.

Na análise exaustiva anunciada em Junho, estava em causa o impacto desta fusão no mercado dos veículos comerciais ligeiros (com peso até 3,5 toneladas) em nove países europeus, incluindo Portugal, onde a PSA tem uma fábrica com cerca de 1000 trabalhadores, em Mangualde, distrito de Viseu.

A fusão, que tinha sido anunciada em Outubro de 2019 (e fora notificada em Bruxelas em Maio de 2020), significaria que este “casamento” (avaliado, ao longo dos últimos meses, entre 31 mil milhões e 45 mil milhões de euros) controlaria 34% do mercado de comerciais ligeiros. Isso é mais do que o dobro da quota de mercado de concorrentes directos (Renault e Ford, cada um com 16%; VW com 12% e Daimler com 10%).

Este domínio de mercado poderia influenciar os preços de forma negativa para os consumidores, com preços mais altos num cenário de menor concorrência, como chegou a admitir a Comissão. 

Feita a análise, ouvidas todas as partes interessadas, Bruxelas concluiu porém que pode aprovar o negócio, até porque há o compromisso de a PSA estender a cooperação com a Toyota. Além disso, os concorrentes da Stellantis terão acesso à rede de reparação e manutenção da PSA e da FCA para os veículos comerciais ligeiros.

Isto significa duas coisas. Por um lado, a PSA vai aumentar a produção de um modelo comercial ligeiro que já constrói para a Toyota, sob a marca Toyota, na fábrica de Sevelndord, em França, mantendo a produção de outro modelo que produz para a mesma marca nipónica em Vigo, Espanha. Acresce ainda a construção de uma versão eléctrica para a Toyota, que beneficiará ainda de preços de transferência menores quer para os carros quer para componentes. 

Em segundo lugar, nenhuma outra marca será sujeita a tempos de espera, regras especiais ou atrasos no acesso à rede de manutenção e reparação de comerciais ligeiros da Stellantis, que não poderá proibir reparadores de usarem o equipamento ou ferramentas PSA/FCA no serviço a comerciais ligeiros de outras marcas. 

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A comissária Margrethe Vestager não levanta objecções ao negócio, tendo em conta as garantias dadas pela FCA e pela PSA

“O acesso a um mercado concorrencial para veículos comerciais ligeiros é importante para muitas pequenas e médias empresas em toda a Europa. Podemos aprovar a fusão porque eles se comprometeram a facilitar a entrada e a expansão [de concorrentes] nesse mercado. Nos restantes mercados em que estes dois construtores participam, a concorrência continuará viva após a fusão”, concluiu a comissária Margrethe Vestager, responsável europeia pela pasta da Concorrência.

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