A lua Titã tem agora um mapa completo sobre o seu relevo

A maior parte da superfície do segundo maior satélite natural do nosso sistema solar é ocupada por planícies. Nas regiões polares, concentram-se mais de 650 lagos.

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O primeiro mapa geológico global da lua Titã NASA/JPL-Caltech/Universidade Estadual do Arizona

Uma equipa liderada pela astrónoma brasileira Rosaly Lopes criou o primeiro mapa geológico global da maior lua de Saturno. Os investigadores identificaram seis formas de relevo em Titã: dunas, planícies, montanhas, lagos, terrenos labirínticos e crateras. Os resultados foram apresentados na última edição da revista Nature Astronomy.

Rosaly Lopes, investigadora do Laboratório de Propulsão a Jacto da NASA e do Instituto de Tecnologia da Califórnia (EUA), diz ao PÚBLICO que este mapa revela “a distribuição global dos diferentes tipos de terreno e as suas idades relativas”. As planícies cobrem a maior parte da superfície de Titã (65%) e as dunas e os lagos são as formações geológicas mais recentes. As mais antigas são as montanhas.

O relevo de Titã varia consoante a latitude. A zona do equador é maioritariamente ocupada por dunas. Nas latitudes intermédias dominam as planícies e nos pólos os terrenos labirínticos (planaltos e vales) e lagos. Tanto os terrenos labirínticos como os lagos ocupam, cada um, apenas 1,5% da superfície de Titã. As crateras ocupam uma área ainda menor (0,4%). Já as dunas constituem 17% da superfície e as montanhas 14%.

A observação da superfície de Titã é dificultada pela bruma que paira na atmosfera desta lua. Por essa razão, os cientistas ainda não sabem muito sobre a composição geológica da superfície desta lua. Ainda assim, sabe-se que Titã possui uma espessa crosta de gelo e que a maior parte da superfície está coberta por uma camada de material orgânico com dezenas de centímetros. Estes materiais formam-se na atmosfera através de processos fotoquímicos. Quando chegam ao solo, sofrem erosão e são transportados e depositados ao longo da superfície.

Para desenhar o mapa geológico de Titã, a equipa utilizou imagens de radar e de infravermelhos da superfície de Titã obtidas pela sonda Cassini. A missão Cassini-Huygens – lançada a 15 de Outubro de 1997 a partir da base espacial de Cabo Canaveral, na Florida (EUA) – foi um projecto conjunto da NASA, da Agência Espacial Europeia (ESA) e da Agência Espacial Italiana. A sonda Cassini transportava consigo o módulo de aterragem Huygens. Entraram em órbita de Saturno a 1 de Julho de 2004. No mesmo ano, a sonda e o módulo separaram-se. Em 2005, o módulo Huygens aterrou em Titã e terminou aí a sua parte da missão, enquanto a Cassini continuou a recolher dados até 15 de Setembro de 2017.

Semelhanças com a Terra

A maior mancha de montanhas situa-se numa região equatorial conhecida por Xanadu e que tem aproximadamente o tamanho da Austrália. No resto da superfície, este tipo de formação geológica corresponde a picos isolados ou cordilheiras com menos de 30 quilómetros quadrados. As montanhas de Titã em geral surgem alinhadas de Este para Oeste e podem atingir cerca de dois mil metros de altitude. Este tipo de formação geológica mostra a crosta de gelo de Titã, já que é visível uma grande quantidade de água congelada na superfície das montanhas.

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Geologia de Titã: planícies (azul claro), dunas (magenta), montanhas (amarelo), terrenos labirínticos (rosa), lagos (azul escuro) e crateras (vermelho) NASA/JPL-Caltech/Universidade Estadual do Arizona

“A superfície de Titã tem sido moldada por grandes processos geológicos que também ocorrem na Terra: erosão e deposição de sedimentos pelo vento e por líquidos, o impacto de outros corpos celestes, forças tectónicas e o vulcanismo”, explica Rosaly Lopes. A astrónoma detalha que a erosão e a deposição de sedimentos originaram as dunas, as planícies, e os lagos, enquanto as montanhas resultaram da actividade tectónica. Os criovulcões – os que expelem substâncias voláteis como água, amoníaco ou metano em vez de lava – também podem ter contribuído para o desenvolvimento geológico de Titã.

Os lagos, mares e os terrenos labirínticos situam-se maioritariamente nas regiões polares. Aí, encontram-se mais de 650 lagos. Tanto os lagos como os mares estão secos ou preenchidos por hidrocarbonetos – como o metano e o etano – no estado líquido. A maioria dos lagos e mares cheios está no pólo Norte. Por sua vez, os terrenos labirínticos são áreas de planaltos largos e estreitos – que formam vales entre si – com vestígios de água congelada no topo.

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Representação artística da formação de gelo de hidrocarbonetos num mar de hidrocarbonetos líquidos em Titã NASA/JPL-Caltech/USGS/Reuters

“O ciclo do metano em Titã [semelhante ao ciclo hidrológico na Terra] indica que há vento e chuva e estes processos ajudam a definir a geologia de Titã”, esclarece Rosaly Lopes. Além do nosso planeta, Titã é o único corpo celeste no nosso sistema solar conhecido por ter um ciclo “hidrológico”. A atmosfera de Titã – tal como a da Terra – é composta principalmente por azoto e nela também se formam nuvens e chuva, mas de metano e etano. Por isso, “as dunas são moldadas pelo vento e os lagos acumulam líquidos”.

As dunas de Titã são como linhas na superfície com um a dois quilómetros de largura e 80 a 130 metros de altitude. O espaço entre elas varia entre um e quatro quilómetros. Embora chova em todas as latitudes de Titã, na região equatorial o clima é árido durante períodos longos o suficiente para que a erosão eólica e a deposição de sedimentos dominem sobre os outros tipos de erosão.

Quanto às crateras, as mais antigas encontram-se perto do equador e as mais recentes estão próximas dos pólos, onde são escassas. A equipa conseguiu ainda identificar 23 crateras com mais de 20 quilómetros de diâmetro. Na sua superfície, há vestígios de água congelada misturados com materiais orgânicos. “Titã, como a Terra, é um mundo muito dinâmico, com vários processos geológicos a ocorrer e uma superfície jovem e suave geologicamente”, diz Anezina Solomonidou, cientista da ESA e outra das autoras do estudo. “Mesmo após 13 anos a estudar Titã com os dados da Cassini, ainda não sabemos especificamente quais os componentes que compõem a sua superfície, o que torna necessário uma nova missão a este mundo semelhante à Terra.”

Texto editado por Teresa Firmino

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