BE espera apoio de deputados do PSD para aprovar “barrigas de aluguer”

Bloco teve de apresentar um novo projecto-lei para responder às questões levantadas pelo Tribunal Constitucional. Nas votações anteriores, o PCP esteve contra. Resta aos bloquistas dialogar com os sociais-democratas.

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Moisés Ferreira espera que o projecto-lei seja aprovado LUSA/ANTÓNIO COTRIM

O momento pelo qual o Bloco de Esquerda esperava era este: depois de aprovado o Orçamento do Estado para 2019 (OE 2019), o partido vai começar os contactos no Parlamento para perceber qual a sensibilidade dos deputados em relação ao novo projecto-lei sobre a gestação de substituição, também conhecida como “barrigas de aluguer”.

O bloquista Moisés Ferreira mantém a expectativa de que a aprovação do documento, conseguida com a ajuda do PSD, se repita agora - se a geometria de votos se mantiver, bastam nove sociais-democratas para que o diploma passe. “Esperemos que os deputados, que aprovaram a primeira versão, voltem a aprovar”, diz ao PÚBLICO Moisés Ferreira, garantindo que o partido vai falar com os sociais-democratas nesse sentido. 

O novo projecto-lei do BE foi escrito para responder às questões levantadas pelo Tribunal Constitucional (TC): “Estas alterações, exigidas pelo TC, são necessárias para tornar disponível a gestação de substituição”, justifica o bloquista.

Sobre a fase que se segue, explica: “Ainda não falámos com os restantes partidos, mas acreditamos que quem aprovou a primeira versão irá votar favoravelmente esta". A discussão sobre o assunto em plenário já foi marcada para 6 de Dezembro. "Agora, findo o debate do OE2019, e tendo esses dias de distância até à discussão em plenário, iremos contactar os outros partidos”.

O processo em relação à gestação de substituição não foi linear. Em Maio de 2016, o primeiro documento proposto pelo BE foi aprovado, com a ajuda de 24 deputados do PSD que votaram a favor, ao lado do PS, do BE, do PEV e do PAN. Votaram contra o PCP, o CDS, dois deputados do PS e dois terços da bancada social-democrata. E houve três abstenções no PSD.

O ex-presidente do PSD, Passos Coelho, que já não está no Parlamento, foi um dos deputados que deu luz verde ao projecto da esquerda. Assim como Paula Teixeira da Cruz, Teresa Leal Coelho, Jorge Moreira da Silva, Carlos Abreu Amorim, Berta Cabral, Sara Madruga da Costa, António Leitão Amaro, Emília Cerqueira, Duarte Marques, Margarida Balseiro Lopes, entre outros sociais-democratas. 

Depois desta aprovação, seguiu-se um veto presidencial. Marcelo Rebelo de Sousa alertou para as questões levantadas pelo Conselho Nacional de Ética e o projecto foi modificado, regressando ao Parlamento, para uma segunda votação, em Julho de 2016. Nessa altura, apesar do recuo de alguns deputados do PSD, o documento foi novamente aprovado.

Votaram a favor 20 deputados do PSD, abstiveram-se oito (Passos Coelho, Carlos Abreu Amorim, Berta Cabral, Laura Magalhães, Joana Barata Lopes, Joel Sá, Emília Cerqueira e Sara Madruga da Costa). Emídio Guerreiro, por exemplo, que antes se abstivera e depois votou contra, justificou o recuo ao PÚBLICO com o facto de a esquerda não ter sido "sensível” ao requerimento para adiar a votação, de modo a “permitir uma reflexão e um debate conforme resultava das reservas que justificaram o veto presidencial”.

A resposta ao TC

Em Abril, foi a vez de o TC levantar problemas à lei. Para responder a isto, o BE introduziu três alterações no documento. Uma determina que, embora sofrendo sanções, os beneficiários da gestação de substituição mantêm a parentalidade nos casos em que se recorre àquela gestação por motivos não previstos na lei.

Como se lê no texto escrito pelos bloquistas, “elimina-se, por questões de segurança jurídica, o regime de nulidade, sem prejuízo de se manter as punições previstas para quem concretize contratos de gestação de substituição onerosos ou fora dos casos previstos, bem como para quem promova contratos de gestação de substituição com o objectivo de retirar benefício económico”.

Para além de ficar determinado também “com maior precisão o que deve ser estipulado e o que não pode ser estipulado no contrato a celebrar entre as partes”, a gestante passa a poder revogar a decisão, ou consentimento, até ao momento em que regista o bebé.

“Passa a prever-se que a gestante de substituição possa revogar o seu consentimento até ao momento de registo da criança nascida do processo de gestação de substituição, em vez do actualmente previsto (até ao início dos procedimentos de procriação medicamente assistida)”, explicam os bloquistas.

A Associação Portuguesa de Fertilidade (APFertilidade) já enviou um comunicado no qual, apesar de considerar que os “casos de gestantes arrependidas serão excepcionais”, não deixa de lançar alguns alertas.

“Se a gestante tem o direito ao arrependimento, deverá igualmente ter direito a ser informada, antes de assinar o contrato com o casal beneficiário, que ao revogar o seu consentimento poderá abrir caminho a uma penosa e longa batalha judicial, e da qual resultará uma enorme dor para ambas as partes”, defende aquela associação.

No comunicado, acrescenta-se ainda: “Se em todo o processo o mais complexo era encontrar uma gestante, a alteração à lei abre caminho a uma desconfiança e insegurança constantes para os casais sobre se a sua gestante manterá o seu compromisso até ao nascimento da criança. Para a gestante, que por altruísmo quer ajudar a filha, o irmão, a amiga, alguém que precisa da sua ajuda imensurável, fica o receio de uma gravidez sob pressão e dúvida”, lê-se ainda no comunicado.

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