Para Vítor Bento "o digital é como o sexo na adolescência: todos falam dele, mas ninguém sabe como se faz"

Terminou esta quarta-feira a conferência sobre a banca na era digital, promovida pela APB e pela SIBS, com as intervenções dos presidentes dos cinco maiores bancos a operar em Portugal.

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A banca digital e os desafios que o sector enfrenta com a presença no mercado de empresas tecnológicas que prestam serviços na área financeira com deficiente regulação (fintechs), foram matérias abordadas esta manhã, em Lisboa, durante a conferência sobre “a banca na era digital” e que, ontem, contou com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Hoje, foi a vez do ministro das Finanças, Mário Centeno, fechar o encontro promovido pela Associação Portuguesa de Bancos em parceria com a SIBS (sistema de pagamentos).

“O professor Dan Ariely, do MIT, disse há uns anos que o digital era como o sexo na adolescência: todos falam dele, nenhum adolescente sabe realmente como se faz, todos pensam que todos o andam a fazer e, por isso, todos dizem que o fazem.” Foi deste modo que Vítor Bento abriu, esta manhã, a sessão onde se discutiu “a revolução digital na banca portuguesa: uma visão de topo”. A intervenção do presidente da SIBS foi prontamente elogiada por António Ramalho, à frente do Novo Banco, que, no entanto, aproveitou para lembrar: “Há sempre alguma tentação de exagerar nas qualidades de cada um.”  

A sessão desta quarta-feira foi moderada por Vítor Bento e juntou os presidentes dos cinco maiores bancos a operar em Portugal, que debateram o tema da revolução digital. Para além de António Ramalho, subiram ao palco Paulo Macedo (CGD), Nuno Amado (BCP), Vieira Monteiro (Santander Totta) e Pablo Forero (BPI). E todos destacaram que a banca digital se tornou uma obsessão nas estratégias que prosseguem e onde a relação com o cliente é o elemento central. Um processo que exige grandes investimentos.

O primeiro a intervir foi Paulo Macedo, que revelou que a CGD prevê, nos próximos 18 meses, fazer duplicar o número de clientes que utilizam o internet banking do grupo para mais de dois milhões, salientando ainda que 50% dos portugueses que recorrem à banca digital trabalham com a instituição estatal.

O banqueiro da CGD anunciou que está já a trabalhar na criação de uma caderneta digital, com as características da que oferece aos clientes, mas agora mais segura. O objectivo é que a Caixa não deixe para trás uma “parte significativa dos seus clientes”, dado que hoje “um décimo” deles não dispensa a caderneta física.

Um tema que está também a preocupar Nuno Amado. Depois de revelar que o seu email de trabalho está acessível a todos, o presidente do BCP relatou o episódio: um cliente contactou-o directamente a queixar-se que “a sua avó com mais de noventa anos tinha tentado aceder à banca online do BCP, mas não lhe foi permitido.” Amado explicou então o que aconteceu. É que depois de ter ido analisar a questão ficou a saber que o sistema, devido aos noventa anos da avó do cliente, bloqueava automaticamente o acesso, “problema que vamos ter de resolver.” “É a relação com o cliente que o BCP privilegia”, nota Amado, que tornou públicas as suas discordâncias com um orador de outro painel que ali foi defender que os códigos pessoais de acesso às contas nos bancos devem passar para os servidores: “Eu cá não o faço”, reforçou Nuno Amado.

Por seu turno, António Ramalho, do Novo Banco, acrescenta que a digitalização vai levar a uma mudança comportamental que terá de ser acompanhada pela banca, ainda que este seja “um mundo relativamente desconhecido”. Num ponto é taxativo: “Quem acha que a banca universal morreu, está muito enganado. E a banca digital ainda não nasceu.” Amado replicou que a banca universal está é a evoluir para o digital e a adaptar-se a um novo ciclo.

António Vieira Monteiro, do Santander, defende que o sector deve aproveitar a entrada de novos players (intervenientes) no mercado para “desenvolver a actividade, não apenas numa perspectiva de defesa, mas aproveitando as novas tecnologias para que possam actuar cada vez melhor no mercado português e para que sejam um elemento de defesa da nossa soberania”.

Todos partilham de uma opinião: o desenvolvimento tecnológico e as fintechs, com regulação ligeira, são desafios que estão a colocar os bancos perante uma realidade nova e difícil. Isto porque estão a competir no mercado, e nos segmentos que dão proveitos, com entidades que não estão sujeitas a constrangimentos regulatórios, mantendo na esfera dos bancos todo os custos. Custos que os consumidores bancários não estão dispostos a pagar, alegam os banqueiros. Mas Vítor Bento discorda: “Os clientes acabam sempre por pagar [comissões que os bancos repercutem nos serviços], mas pagam sem sentir” e, daí “não reagirem.”

Deste modo, todos alinharam num ponto: os bancos terão de responder aos novos desafios tecnológicos adaptando-se, mas caberá também aos supervisores responder, criando um enquadramento regulatório adequado.

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