Seis anos depois, ayatollah Khamenei voltou a escrever a Obama

Presidente norte-americano propôs restabelecimento de relações e cooperação no combate ao Estado Islâmico depois de fechado o acordo sobre o nuclear.

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Iranianas com posters de Khamenei no aniversário da Revolução Islâmica Atta Kenare/AFP

A Casa Branca recusa comentar a existência da missiva, divulgada por The Wall Street Journal, mas um diplomata iraniano ouvido pelo jornal confirma o envio e descreve um texto “respeitoso” mas onde Khamenei não se compromete com as ofertas de Obama, feitas em Outubro.

A notícia sobre esta última carta surge depois da confirmação de uma primeira, e até agora, resposta de Khamenei ao chefe de Estado norte-americano. Semanas depois de tomar posse, Obama escreveu ao Líder Supremo e este respondeu-lhe, enumerando os abusos que considera terem sido cometidos pelos EUA contra os iranianos nos últimos 60 anos, nomeadamente o apoio ao xá Reza Pahlavi e ao regime de Saddam Hussein, durante a guerra Irão-Iraque (1980-88). 

Apesar disso, Khamenei não recusava uma aproximação – isso, e a resposta em si mesma, o primeiro contacto directo desde o congelamento das relações, criou grandes expectativas na Casa Branca. “Ele deixou a porta aberta”, diz um ex-responsável da Administração Obama. “É difícil perceber a importância do Supremo Líder do Irão escrever uma carta aos EUA”, afirma outro. “É um sinal de reconhecimento do país.”

Seguiu-se uma nova carta de Obama, mas no Verão desse ano, 2009, aconteceram as eleições presidenciais que deram o segundo mandato a Mahmoud Ahmadinejad, com Washington e centenas de milhares de iranianos a acusarem o regime de fraude.

Entretanto, a Casa Branca avançou para uma tentativa de acordo sobre o programa nuclear iraniano, que Teerão diz ser civil, mas os EUA acusam de ter como objectivo a construção de bombas nucleares. Ao mesmo tempo, a ameaça dos jihadistas do autoproclamado Estado Islâmico cresceu, com a conquista de vastos territórios no Iraque, depois da Síria, e os interesses americanos e iranianos coincidem na região. Teerão já estava ao lado do ditador sírio no combate aos radicais (e à oposição) e hoje colabora com os iraquianos, como fazem os norte-americanos, às vezes partilhando as mesmas bases.

Ao longo dos últimos anos, Obama enviou várias cartas a Khamenei. Mas só agora este voltou a responder. E isso acontece depois de as negociações sobre o nuclear terem estado em risco de fracasso, com as partes a acabarem por prolongar as discussões até 2015. Ninguém quis deitar a toalha ao chão e desistir de um acordo que permitirá ultrapassar as suspeitas sobre o programa iraniano e mudar completamente o cenário político no Médio Oriente.

O novo prazo para a assinatura de um documento termina a 30 de Junho, mas Obama quer ver progressos reais e um esboço de um acordo global a 31 de Março. Até lá, no dia 3 de Março, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, vai falar sobre o Irão ao Congresso norte-americano (contra a vontade da Casa Branca), e atacar as conversações de qualquer acordo, o que não vai ajudar os negociadores (EUA, Rússia, China, Reino Unido, França e Alemanha).

No início da semana, o Presidente iraniano, Hossan Rohani, e Obama falam em separado sobre o tema. “Nós demos os passos necessários agora cabe à outra parte aproveitar a necessidade”, afirmou Rohani, no aniversário da Revolução Islâmica de 1979. “Não vejo utilidade num novo prolongamento se não houver acordo sobre uma formulação fundamental”, disse Obama. 

A última palavra caberá sempre a Khamenei que, ao estilo iraniano, tem feito declarações contraditórias. “Vou dizer ‘sim’ a um acordo, mas não aprovarei um mau acordo”, disse, há uma semana, depois de ter defendido a construção de 200 mil centrifugadoras para produzir combustível nuclear. E sempre que levanta o tópico, o ayatollah insiste que qualquer acordo tem de implicar o levantamento imediato das sanções ocidentais impostos ao Irão, enquanto os negociadores norte-americanos discutem um desmantelamento faseado que pode levar anos.

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