Como mais inflação na Alemanha fez subir os juros de Portugal para perto de 4%

Inflação disparou de 0,7% para 1,7% na Alemanha. Mercados anteciparam recuo na política do BCE e penalizaram Portugal.

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Mario Draghi pode estar mais próximo de atingir o seu objectivo para a inflação Reuters/RALPH ORLOWSKI

A forma como Portugal continua dependente do apoio do BCE para garantir a sua capacidade de obter financiamento a boas taxas no mercado voltou a ser demonstrada esta terça-feira quando, em reacção à notícia de uma inflação mais alta na Alemanha e à expectativa de um recuo do BCE nas suas medidas, as taxas de juro da dívida pública portuguesa subiram mais do que as dos outros países da zona euro, aproximando-se da marca dos 4%.

Os dados preliminares para a inflação divulgados esta terça-feira pelas autoridades estatísticas alemãs surpreenderam os analistas e provocaram reacções imediatas nos mercados. Em média, as previsões já apontavam para uma subida significativa deste indicador, de 0,7% em Novembro para 1,3% em Dezembro. No entanto, o que aconteceu foi uma subida ainda maior, para 1,7%.

A subida de um ponto percentual na taxa de variação homóloga no espaço de apenas um mês foi a mais forte de que há registo e aconteceu sobretudo por causa do salto que se registou nos preços dos produtos energéticos. Como consequência da subida de 12,6% registada no preço do barril de petróleo em Dezembro, os preços praticados na Alemanha na venda de combustíveis para aquecimento doméstico e para transporte elevaram-se de uma forma que há muito não se via, influenciando grandemente a evolução da inflação.

De imediato, a pergunta que os investidores colocaram foi: "O que é que isto significa para a política do BCE?" E a resposta a esta pergunta não foi boa para Portugal.

Nos mercados, esta terça-feira, foi evidente o sentimento de que, com a inflação a subir desta forma na Alemanha, o BCE pode vir a mudar mais cedo do que o previsto o rumo da sua política monetária. E foi por isso que as taxas de juro da dívida pública da generalidade dos países da zona euro começaram a subir, logo que foram conhecidos de manhã os dados da inflação em diversas regiões da Alemanha.

Portugal, apesar dos dados recentes mais positivos a nível económico e orçamental, mostrou continuar na linha da frente das preocupações dos mercados. E, de acordo com os dados publicados pela Reuters, esta terça-feira, a taxa de juro da dívida portuguesa a 10 anos aproximou-se perigosamente da barreira dos 4%.

Ao final da tarde, este indicador estava nos 3,9%, o que representa uma subida de cerca de 0,2 pontos percentuais face ao valor do dia anterior. A subida da taxa de juro portuguesa corresponde a uma tendência europeia, mas foi mais forte do que a registada nos outros países. Na Itália, as taxas de juro a 10 anos subiram cerca de 0,12 pontos percentuais, em Espanha 0,09 pontos, o mesmo resultado registado na Alemanha.

Esta quarta-feira, será divulgada a primeira estimativa do Eurostat para o valor da taxa de inflação de Dezembro na zona euro, um indicador que deverá ser fortemente influenciado pelo que aconteceu na Alemanha. Depois, todas as atenções irão virar-se para a reunião do conselho de governadores do BCE que está agendada para o dia 19 de Janeiro.

Será importante perceber qual é a reacção de Mario Draghi e dos seus pares à subida da inflação em Dezembro. Irão olhar para estes números como um sinal de que estão afinal mais próximos do que pensavam do seu objectivo? Ou irão preferir esperar para perceber se esta é uma tendência para manter?

Na última reunião, no início de Dezembro, o BCE optou por prolongar por mais seis meses a duração do programa de aquisição de dívida, reduzindo, todavia, o volume mensal das compras efectuadas. E, em relação à inflação, os seus responsáveis reconheceram desde logo que havia a possibilidade de uma subida do indicador global, assinalando, contudo, que tal iria suceder principalmente por causa da alta dos preços da energia, não se podendo por isso assumir que a subida seria sustentável.

E, de facto, os dados agora publicados para a Alemanha mostram que a denominada "inflação subjacente" (que exclui os bens com preços mais voláteis como os combustíveis) se deverá para já manter a níveis baixos.

Porém, uma subida tão forte como a agora registada nos preços da energia pode levantar a questão da influência que isso poderá vir a ter nos preços dos outros bens e serviços.

Na Alemanha – e em particular dentro do banco central alemão liderado por Jens Weidmann – uma coisa parece certa: o regresso de uma variação anual de preços para níveis próximos de 2% deve ser suficiente para fazer regressar o fantasma da hiperinflação que o país viveu nos anos 30 do século passado.

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