Economia regista crescimento “saudável”, mas que não chega para convergir com a Europa

Banco de Portugal prevê aceleração moderada nos próximos três anos, com o investimento e as exportações a crescerem mais e o consumo menos.

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Carlos Costa continua preocupado com fragilidade de Portugal nos mercados dro Daniel Rocha

Depois de ter sido surpreendido a partir de meados de 2015 com uma nova quebra do investimento e um abrandamento das exportações (que puseram em causa a tendência de retoma da economia), o Banco de Portugal acredita novamente que o país está agora preparado para abraçar o padrão de crescimento por si considerado mais saudável e sustentável: uma economia em que o peso do consumo privado vai diminuindo e em que o investimento e as exportações são o motor. O problema: a crescer desta forma, Portugal não vai evitar mais três anos de divergência com o resto da zona euro e demorará até a 2019 a registar um PIB real idêntico ao de 2008, quando a crise financeira internacional eclodiu.

No boletim económico de Dezembro publicado esta quinta-feira, a entidade liderada por Carlos Costa destaca uma série de desenvolvimentos positivos na economia portuguesa. Por um lado apresenta previsões que mostram os níveis de investimento imobiliário, das empresas e do Estado a começarem a sair dos valores muito baixos em que se encontram desde o início da crise. Por outro lado, vê as empresas portuguesas a continuarem a ganhar quota de mercado a nível internacional, o que significa numa conjuntura económica mundial que se espera mais positiva, um crescimento mais forte das exportações.

Para o investimento, depois da desilusão que constitui a diminuição de 1,7% este ano, o Banco de Portugal acredita num crescimento de 4,4% em 2017, um ritmo que se mantém em 2018 e 2019. É uma previsão que supera, não só as projecções da Comissão Europeia (3,1% em 2017) e do FMI (2,5%), como também as do próprio Governo (3,7%). O boletim afirma mesmo que “o maior dinamismo da economia portuguesa face a 2016 será sustentado por uma aceleração da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), baseada numa recuperação do investimento empresarial”.

No caso das exportações, o Banco de Portugal prevê que se passe de um crescimento de 3,7% em 2016 para 4,8% em 2017, assumindo que o sector exportador nacional vai conseguir aumentar as suas vendas a um ritmo mais alto do que o crescimento da procura externa dirigida à economia portuguesa.

É com base nos bons resultados destes dois indicadores que o banco central apresenta previsões de crescimento para a economia portuguesa que ficam muito perto das projecções do Governo. O Banco de Portugal aposta que, depois de um crescimento de 1,2% este ano, a economia irá acelerar moderadamente para 1,4% no próximo. Para 2018 e 2019, a projecção de crescimento é de 1,5%.

O mais surpreendente destes números é que se prevê que ocorra uma aceleração do crescimento num cenário em que se projecta um abrandamento significativo do consumo privado. O banco antecipa um efeito negativo da queda das compras de bens duradouros como os automóveis (que cresceram muito em 2015 e 2016) que fará com que o consumo privado passe de uma variação de 2,1% em 2016 para apenas 1,3% em 2017.

Isto significa que, a confirmarem-se estas previsões, a economia portuguesa vai crescer mais do que o consumo privado, um facto raro na história económica portuguesa, conduzindo a uma diminuição do peso deste indicador. O Banco de Portugal elogia este desenvolvimento. "Estes traços são consistentes com um padrão de crescimento mais sustentado, caracterizado pela continuação da reorientação de recursos para sectores mais expostos à concorrência internacional e mais produtivos, pela manutenção de um excedente nas contas externas e pelo prosseguimento do processo de redução do endividamento do sector privado não financeiro", afirma no relatório.

O problema é que, ao assumir um contributo negativo do consumo privado, embora a trajectória do crescimento possa ser vista como mais sustentável, dificilmente irá produzir resultados impressionantes. Até porque, mesmo estando a crescer mais, o investimento manter-se-á “em níveis que apenas permitem compensar a depreciação do capital”.

Carlos Costa e os seus pares assinalam que “o crescimento do PIB deverá ser próximo, embora inferior, ao projectado para a área do euro, não revertendo o diferencial negativo acumulado entre 2010 e 2013”. De facto, de acordo com as últimas previsões publicadas pelo BCE, a zona euro deverá crescer 1,7% tanto este ano como em 2017. E para 2018 e 2019 aponta para taxas de crescimento de 1,6%.

Isto significa que Portugal, a confirmarem-se as previsões dos bancos centrais, continuará a ficar abaixo da média de crescimento europeu pelo menos até ao final da presente legislatura, em 2019.

Endividamento elevado, tendência de redução da população e falta de reformas estruturais são as causas identificadas pelo Banco de Portugal para a continuação deste fracasso no objectivo de convergência. “Esta ausência de convergência real face à área do euro reflecte a persistência de constrangimentos estruturais ao crescimento da economia portuguesa, no qual assumem uma relevância especial os elevados níveis de endividamento dos sectores público e privado, uma evolução demográfica desfavorável e a persistência de ineficiências nos mercados do trabalho e do produto que requerem a continuação do processo de reformas estruturais”, diz o relatório.

O Banco de Portugal faz ainda questão de alertar para os riscos que envolvem as projecções agora apresentadas. As ameaças estão sobretudo relacionadas com eventuais problemas que Portugal possa enfrentar no acesso ao financiamento do mercado e com a necessidade de aplicação de medidas orçamentais com impacto recessivo para corrigir desvios nas metas do défice.

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