Oli: a líder ibérica de autoclismos quer cada vez menos água

A empresa de Aveiro que inventou a dupla descarga tem uma equipa que diariamente estuda novas soluções para reduzir o consumo.

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Adriano Miranda

Esta fábrica não desliga as máquinas um segundo. Trabalha sete dias por semana, 24 horas por dia, com 345 funcionários que conhecem os cantos à casa. Cem máquinas estão ligadas à corrente para produzirem componente a componente do que serão sistemas de instalação sanitária e que viajarão para diversas partes do mundo.

Há dezenas de peças de várias cores e feitios, autoclismos interiores e exteriores, placas de comando, torneiras de bóia, descargas para autoclismos cerâmicos, distribuídos pelos vários sectores da única empresa portuguesa que produz autoclismos interiores. Há também moldes de ferro desenhados à medida das necessidades e preferências dos clientes e um laboratório devidamente equipado para testar as diferentes águas que entram nos autoclismos dos cinco continentes. No final de cada dia, cerca de 7800 autoclismos estão prontos.

A Oli – Oliveira & Irmão, instalada em Esgueira, Aveiro, não brinca em serviço. Controla toda a cadeia de valor, do nascimento à concepção da ideia, da industrialização à produção até à comercialização. Não é por acaso que detém o estatuto de líder ibérica de produção de autoclismos e de maior produtora da Europa do Sul. Além da marca própria, também produz sistemas de instalação sanitária para várias empresas cerâmicas internacionais.

Quando parte para outros países, a Oli, iniciais de Oliveira, não parte de mãos a abanar. Parte com um catálogo consistente de produtos, inovações na manga e receptiva a propostas. A empresa tem vários trunfos no currículo. Há duas décadas surpreendeu o mercado com a dupla descarga de água no autoclismo, que permite uma poupança de 50%. “Nessa altura, não havia preocupações de poupança de água como agora”, recorda António Oliveira, engenheiro mecânico e presidente do conselho de administração da Oli.

A dupla descarga democratizou-se depressa. Em 2013 e 2014, o Instituto Europeu de Patentes informou que a Oli era a empresa portuguesa com mais patentes na Europa. Neste momento, tem 40 patentes activas no espaço europeu, em 2013 apresentou sete pedidos. No ano passado, meio milhão de euros foram direitinhos para a renovação do laboratório de testes de vida, permitindo testar, pela primeira vez, a água da chuva nos autoclismos.

A aposta na inovação é, aliás, ponto de honra para quem lidera a Oli. Nos últimos cinco anos, investiram-se dez milhões de euros em inovação e desenvolvimento. Nos 72 postos de ensaio do laboratório, divididos por seis bancadas, testam-se águas de diferentes proveniências: águas calcária, marítima e da chuva, nos sistemas de instalação sanitária – em Hong Kong, destino que anda debaixo de olho, os autoclismos têm água do mar.

O trabalho de casa tem de ser feito. A Oli sabe que cerca de 31% da factura de consumo doméstico de água são gastos pelos autoclismos e, por isso, tem uma equipa de 20 colaboradores que diariamente estuda novas soluções para reduzir o consumo de água nas descargas das sanitas e, além disso, aumentar o conforto e não deixar de lado pessoas de mobilidade reduzida no acesso às instalações sanitárias.

Nesses estudos, surgiram dois produtos, as inovações mais recentes: o Easy Move, que permite adaptar a altura da sanita à medida do utilizador, através de um sistema ergonómico regulador; e a torneira de bóia Azor Plus com um sistema que possibilita a poupança até nove litros de água por dia e a redução de cerca de 2% na factura mensal. Além dos autoclismos, a Oli também se mexe na área de produtos para casa de banho.

Inovar significa competir à escala global e a Oli incorporou a palavra no ADN da empresa. Por isso, surgem colaborações e parcerias com centros de investigação e universidades, em que se incluem a Faculdade de Engenharia do Porto e as universidades de Aveiro, Coimbra e Minho.

As parcerias estendem-se a nomes maiores da arte nacional. A Oli gosta de surpreender o mercado e aqui o design tem uma palavra a dizer. Em 2013, o arquitecto Siza Vieira assinou a Trumpet para a Oli. É uma placa de comando de autoclismos interiores, disponível em inox e escovado, com os sinais de “mais” e “menos” desenhados, inspirada no trompete. É uma peça que recorre ao sistema pneumático e não necessita de energia.

Um ano antes, Souto Moura também recebeu um convite da Oli e produziu uma placa de comandos de autoclismos interiores inspirada nos tradicionais azulejos portugueses, com acabamentos em vidro temperado branco, com dois botões redondos em acabamento cromado, de dupla descarga. A peça foi premiada com uma menção honrosa pela “interligação entre o design e indústria” no Prémio Inovação Tektónica de 2012, feira internacional de construção e obras públicas que distingue produtos inovadores.

Aposta no exterior
A Oli exporta 80% dos seus autoclismos para 70 países dos cinco continentes. Eles estão em hotéis do Dubai, na Torre dos Clérigos, na nova basílica do Santuário de Fátima, nos hotéis Hilton na Nova Zelândia, na pousada da serra da Estrela, e em muitas casas escandinavas. E querem estar em mais destinos. No ano passado, a Oli lançou uma rede de distribuição na Rússia. E não ficou por aqui. Cresceu 33% no Médio Oriente, atingiu a produção de 25 milhões de autoclismos e agora anda a tomar o pulso aos Estados Unidos, Índia, Nova Zelândia, Singapura e Hong Kong e a fazer contas para perceber se vale a pena produzir algumas quantidades no Médio Oriente e no Leste europeu de forma a diminuir os custos de transporte dos seus produtos. Os locais estratégicos estão em análise. 

“Tivemos o mérito de saber aproveitar as oportunidades que o mercado nos deu e desenvolver produtos que o mercado valoriza”, sublinha António Oliveira. O empresário cedo percebeu que não podia olhar apenas para dentro, era fundamental entender o que se estava a passar noutras geografias e mostrar o portefólio dos produtos fabricados em Aveiro.

Habituado a viajar desde novo, António Oliveira não perdeu tempo a mostrar as potencialidades da Oli fora das portas da região e do país. “O mercado português é muito pequeno. Não há indústria que hoje possa sobreviver só com o mercado nacional”, refere. A estratégia empresarial nunca passaria por confinar a marca às fronteiras nacionais e até mesmo europeias. Era preciso estar atento a todos os sinais para que os seus produtos vingassem noutras paragens.

Tudo começou há 61 anos no centro da cidade de Aveiro, numa rua perto da estação de comboios, com um comércio de ferragens, produtos para canalizações e de ferro fundido para a agricultura. Em 1973, a Oli mudou-se para um novo edifício e sete anos depois, em 1980, começou a produzir autoclismos. É uma empresa familiar que vai na segunda geração. António Oliveira é filho do fundador.

Em 1993, a Fondital, empresa italiana na área do aquecimento e tubagens, entrou no negócio como sócia, ficando com 50% da Oli. A colaboração é sobretudo industrial, o sócio italiano garante acesso a soluções industriais e ganhos de escala na área de vendas. Em termos comerciais, a Oli portuguesa é autónoma, apesar da colaboração.

Foi no início dessa década que a Oli iniciou a internacionalização dos seus autoclismos.  “A Europa está doente e cansada em todos os aspectos. Fomos à procura de novos mercados”, conta. No Médio Oriente, na América do Sul. O Norte de África é também um alvo. A Rússia já faz parte da carteira de clientes. A Oli tem uma delegação comercial nesse país que trata das vendas e da logística. “A estratégia para o mercado russo é aumentar significativamente o peso nas nossas vendas, hoje ainda abaixo dos 5%. Dada a dimensão do mercado e o potencial de crescimento, não obstante a crise momentânea, queremos chegar rapidamente aos 10% da nossa facturação”, revela o empresário. “A estratégia passa por uma melhor e mais diversificada cobertura geográfica. Claro que o actual momento compromete, no curto prazo, a concretização desta ambição de que, porém, não desistimos”, acrescenta.

A Europa continua a ser o principal cliente, com cerca de 63% das vendas, Itália e França são os países que lideram as compras. O Médio Oriente, sobretudo Arábia Saudita, Qatar e Dubai, tem um peso de 7% e a América Latina, nomeadamente Brasil, Peru, Venezuela, Chile e Colômbia, representa 2% das vendas. Em 2013, a empresa atingiu um volume de negócios de 40 milhões de euros. Em 2014, fechou o ano com 57 milhões. Este ano quer crescer 10%.

Apesar de uma situação relativamente confortável no seu segmento de mercado, com previsões de crescimento e a maior concorrência localizada na Alemanha e na Suíça, António Oliveira continua a olhar em várias direcções. “A Oli não pode estar descansada em mercado nenhum. A concorrência é cada vez mais variada e mais agressiva, com as mais diversas origens e em todos os segmentos”, adianta.

De qualquer forma, o empresário sabe quais os factores que, na sua opinião, têm feito a diferença nos mercados onde a Oli se movimenta. “Confiança na qualidade e fiabilidade dos nossos produtos”, resume. A flexibilidade às necessidades cada vez mais específicas dos clientes e a procura de novas soluções são também aspectos que contam na hora de fechar negócios. “Estamos a crescer e precisamos de mais mercados. Quanto mais mercados melhor, para estarmos precavidos.”

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