Quem acredita em Aleksander Lukashenko?

Se há alguma verdade nas declarações de Aleksander Lukashenko das últimas horas é a sua promessa de que não haverá repetição de eleições “até que me matem”

Pressionado pelas maiores manifestações na história recente do país, acossado pelos protestos de trabalhadores em greve e aturdido pela reacção da União Europeia, o ditador da Bielorrússia ensaiou uma pose de diálogo e promete rever a constituição para partilhar o poder. Mas apenas admite dar esse passo com uma condição que expõe com crueza a sua falta de boa fé: avançará nesse caminho se a pressão popular nas ruas da Bielorrússia acabar.

O déspota que organizou a fraude eleitoral e que respondeu com mão-de-ferro aos primeiros protestos, tenta agora mostrar espírito de abertura desde que a pressão que o obrigou a ceder seja retirada. Só por ingenuidade se pode acreditar nas suas palavras. A Europa vai ter de se preparar para um duro desafio nos próximos tempos.

Se há alguma verdade nas declarações de Aleksander Lukashenko das últimas horas é a sua promessa de que não haverá repetição de eleições “até que me matem”. Não havendo a mínima vontade em corrigir o pecado original de toda a instabilidade política, não parece haver condições para o diálogo. Lukashenko sabe-o e foi por isso que tratou de recordar aos manifestantes que, no lado oriental das suas fronteiras, está a Rússia de Putin com força militar mais do que suficiente para os calar. Quem admite convidar um exército estrangeiro para reprimir o seu próprio povo é capaz de tudo.

Depois de se mostrar incapaz de travar a anexação da Crimeia na sequência de protestos a favor da democracia (e contra a influência do Kremlin) na Ucrânia, a Europa será confrontada com uma pressão enorme se as tropas russas forem enviadas para as ruas de Minsk. Não apenas pelas consequências que esse movimento teria na desafortunada população da Bielorrússia; também porque esse seria mais um sinal de que Putin pode recorrer a todos meios para travar as democracias que podem florescer ou de as corromper onde estão consolidadas – na Europa e nos Estados Unidos - com total impunidade.

Depois da Crimeia, de dar a mão a Assad ou a Erdogan, de se imiscuir no “Brexit” ou na Catalunha, de apoiar Salvini, Orbán ou a nova plêiade de aspirantes a ditadores, uma intervenção na Bielorrússia transformaria a nova guerra cínica entre a UE e a Rússia num conflito grave.

Há razões para o temer: a história do século XX mostra-nos que o apaziguamento não funciona com líderes autoritários. O que se passar estes dias em Minsk e em Moscovo dirá muito sobre o futuro da democracia e sobre a relação entre o ocidente e o leste da Europa. Como escreveu Rui Tavares, dirá muito sobre as nossas vidas.

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