Défice caiu, mas fraca execução do investimento voltou a ajudar

Execução orçamental de Dezembro confirma melhoria face a 2017, embora défice em contabilidade pública fique acima do valor estimado pelo Governo em Outubro. Crescimento da receita fiscal foi de 4,9%.

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Miguel Manso

Numa repetição do que aconteceu em anos anteriores, a execução do investimento público em 2018 ficou claramente abaixo do previsto inicialmente pelo Governo, sendo, a par de um resultado mais forte da receita fiscal, um dos principais motivos para que o défice público em 2018 tenha voltado a cair.

O Ministério das Finanças publicou esta sexta-feira os números da execução orçamental das Administrações Públicas do total do ano passado. Contudo, para já, os únicos dados disponíveis são apresentados em contabilidade pública, isto é, não permitem retirar conclusões imediatas sobre se o défice público de 0,7% prometido pelo Governo a Bruxelas irá ser cumprido, falhado ou mesmo superado.

Em contabilidade pública – a metodologia usada na apresentação dos boletins de execução orçamental – é adoptada uma lógica de caixa no registo das despesas, enquanto em contabilidade nacional – a metodologia usada nos números reportados a Bruxelas – a lógica é a do momento em que é assumido o compromisso de despesa.

Isto faz com que o défice público agora divulgado para o total de 2018 pelo Governo em contabilidade pública – 2083 milhões de euros, um valor que corresponde a aproximadamente 1% do PIB – não possa ser comparado com os 0,7% para o défice com que o Governo se comprometeu em Bruxelas e que é habitualmente usada como a referência para medir a evolução das finanças públicas portuguesas.

Aquilo que se pode observar é que, em comparação com 2017, se registou, no total de 2018, uma redução de 475 milhões de euros, dando sinais do prolongamento da tendência de melhoria dos saldos orçamentais registada nos últimos anos. Pela negativa, contudo, observa-se que, em relação à última estimativa feita pelo Governo em Outubro – 1304 milhões de euros – o défice acabou por ser significativamente mais elevado, relevando, em contabilidade pública, a existência de uma derrapagem não prevista nos últimos meses do ano. Recuando mais até ao momento de apresentação do OE para 2018 (Outubro de 2017), verifica-se que o défice agora anunciado ficou claramente abaixo dos 3353 milhões de euros previstos inicialmente.

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Apenas no final de Março, o Instituto Nacional de Estatística anunciará os números oficiais para o défice público em contabilidade nacional (o que conta para Bruxelas). Do lado do Governo, o tom das últimas semanas tem sido de optimismo, com o ministro das Finanças a dizer recentemente que o défice poderia ficar abaixo das projecções. “Vamos ficar com certeza dentro do grau de cumprimento dos objectivos que tínhamos estabelecido e vamos ficar, com muita probabilidade, abaixo dos 0,7% – ligeiramente abaixo”, disse Mário Centeno em declarações à agência Lusa.

Falhando ou superando a meta prevista, uma coisa parece ser já evidente quando se olha para os dados da execução orçamental. A subida acima do previsto da receita fiscal, resistindo aos sinais de abrandamento dados pela economia no final do ano, e a execução abaixo do previsto do investimento público voltaram, como em anos anteriores, a ser factores importantes para a evolução das finanças públicas em 2018.

A redução registada no défice face a 2017 foi o resultado de um crescimento da receita (5,7%) superior ao crescimento da despesa (4,5%). A receita fiscal cresceu 4,9%, acima dos 3,4% que estavam implícitos no OE inicial. Só aqui há uma diferença entre o orçamentado e o executado de 1233 milhões de euros.

O IRS subiu 5,6%, o IVA 4,1% e o IRC 10,2%. As Finanças afirmam que “a evolução positiva da receita fiscal, apesar da redução das taxas de IRS e da manutenção das principais taxas de imposto, reflecte o bom momento da economia portuguesa”. E assinala receita de contribuições para a Segurança Social aumentou 7,6%, "em resultado do forte crescimento do emprego", dizem as Finanças.

Mas há também sinais de que o abrandamento registado na economia na fase final de 2018 começa a ter o seu impacto na execução orçamental. Quando se olha para os impostos indirectos (os que mais rapidamente são afectados pela conjuntura), verifica-se que terminaram o ano com um crescimento de 2,8%, quando até Setembro cresciam 4,3%.

Depois, do lado da despesa, as Finanças apontam como principais explicações para o crescimento de 4,5% o "forte aumento" da despesa do Sistema Nacional de Saúde (de 4,9%, contra os 3,1% previstos inicialmente no OE), as despesas com prestações sociais, que aumentaram 6,8% e o crescimento "elevado" do investimento público

Neste último caso, as Finanças referem a variação de 17,1% verificada no investimento público (caso se exclua a despesa com PPP). No entanto, apesar deste valor elevado, as projecções que eram feitas pelo Governo quando apresentou o Orçamento eram de um crescimento muito mais acentuado.

E incluindo na análise o investimento realizado no âmbito das Parcerias Público Privadas, verifica-se que o valor total se situou em 4309,9 milhões de euros, um valor que fica 1175 milhões de euros abaixo do valor previsto inicialmente no OE. Em Outubro o Executivo já tinha revisto esta rubrica para 4541 milhões, mas ainda assim falhou. Em vez de crescer 22% como previsto no OE ou 9,2% como mais recentemente estimado, o investimento público cresceu, mas apenas 3,6%.

Na apresentação dos resultados, as Finanças destacam que foi no Serviço Nacional de Saúde que esteve “a grande aposta do Estado em termos orçamentais”. E destacam o crescimento de 5,3% verificado nas despesas com pessoal no SNS devido ao que dizem ter sido o "forte crescimento do número de enfermeiros e médicos", o "aumento do valor pago no SNS referente às horas extraordinárias" e a "criação de um novo subsídio para enfermeiros especialistas".

As Finanças revelam ainda que, no total da administração central, a despesa com salários cresceu 2,5% em 2018, o que é explicado pelo "descongelamento das carreiras e da reposição do valor de outras prestações, como as horas extraordinárias".

Já no que diz respeito aos pagamentos em atraso das entidades públicas confirmou-se a esperada descida no último mês do ano. Este indicador fechou o ano em 709,3 milhões de euros, representando uma diminuição de 365 milhões de euros relativamente ao final de 2017. Em Novembro, os pagamentos em atraso estavam acima dos 1150 milhões de euros.

Em particular, os pagamentos em atraso dos Hospitais EPE situaram-se em 484 milhões de euros, reduzindo-se 353 milhões de euros face a 2017. Esta evolução é explicada pelas dotações de capital realizadas nos Hospitais EPE, que foram sendo desembolsadas no decurso de 2018, e que acabaram, em especial no mês de Dezembro, por ser usadas pelos hospitais para amortizar uma parte da sua dívida a fornecedores.

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