Costa enfrenta primeira greve que junta CGTP e UGT

Aumentos salariais, reforço de pessoal e respeito pela negociação com os sindicatos são o mote para a greve que, nesta sexta-feira, ameaça fechar escolas, serviços públicos e perturbar os serviços de saúde.

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Na área da Saúde, os enfermeiros fizeram várias greves nas últimas semanas, que culminaram numa manifestação LUSA/RODRIGO ANTUNES

Pela primeira vez deste que é primeiro-ministro, António Costa tem pela frente uma greve da administração pública que junta os sindicatos da CGTP e da UGT. Depois de o Governo ter eliminado os cortes nos salários, de ter retomado as 35 horas na generalidade dos serviços ou de ter revogado a lei que permitia despedimentos na função pública, os sindicatos esperavam que o último Orçamento da legislatura fosse mais longe. O documento, contudo, não traz as respostas esperadas para os salários para as carreiras e para o reforço dos serviços, e os sindicatos não escondem a “desilusão” e o “descontentamento” que têm vindo a crescer entre dos trabalhadores.

“O Governo tem vindo a fazer um discurso de reposição de direitos, mas ainda não repôs tudo o que era expectável. Estou a referir-me às 35 horas para todos, à despenalização das carreiras contributivas mais longas da Caixa Geral de Aposentações e aos 25 dias de férias”, nota José Abraão, secretário-geral da Federação de Sindicatos da Administração Pública (Fesap), uma organização da UGT que agrega cerca de 35 sindicatos. “O discurso da reposição de direitos e de rendimentos está gasto, até porque isso não chega a metade dos trabalhadores da administração pública”, realça.

O executivo de António Costa, lamenta José Abraão, “foi empurrando para a frente a reposição de um conjunto de direitos”. “As progressões [na carreira] chegam por fases, as promoções que estavam orçamentadas são quase inexistentes”, enumera, acrescentado que  o Governo ainda não lhes apresentou uma proposta de aumento salarial para 2019.

O dirigente, que é também membro da comissão política do PS, espera que a greve desta sexta-feira faça o executivo perceber que “tem de responder às expectativas dos trabalhadores” de forma mais rápida e consequente.

A Frente Comum, organização da CGTP que tomou a iniciativa da greve desta sexta-feira a que depois se juntaram as organizações da UGT, considera que razões para protestar não faltam, mesmo estando em causa um executivo apoiado pelo PCP e pelo BE.

“Os trabalhadores tiveram expectativas com este Governo. O Governo tomou algumas medidas e os trabalhadores pensavam que o resto havia de vir, mas o resto não veio” diz Ana Avoila, coordenadora da Frente Comum (uma federação da CGTP que representa mais de três dezenas de organizações sindicais). O sentimento de descontentamento não é de agora, reconhece a dirigente, mas o Orçamento do Estado (OE) para 2019 foi a gota de água. “Foi um gorar de expectativas”, afirma.

Reivindicações sem resposta

A lista de reivindicações dos sindicatos é extensa e cada sector - professores, enfermeiros, funcionários da justiça, entre outros – tem os seus problemas e isso é bem visível nas greves que têm marcado este Outono na área da educação, da saúde ou da segurança.

Mas há questões transversais. Uma delas tem a ver com as verbas disponibilizadas pelo Governo para aumentar os salários. Os 50 milhões que o Governo diz ter disponíveis são considerados insuficientes por todos os sindicatos. AS estruturas pedem actualizações de 3% a 4% no próximo ano, mas o envelope previsto no OE não permite que se vá além de um aumento de cinco euros mensais por trabalhador.

É certo que o aumento do salário mínimo ao longo da legislatura beneficiou umas centenas de funcionários públicos. “A subida do salário mínimo tem sido importante, mas de que adianta se o Governo não reformulou as posições remuneratórias seguintes?”, questiona a líder da Frente Comum.

Os sindicatos querem ainda que o descongelamento de carreiras deixe de ser faseado, que o subsídio de refeição seja aumentado, a reposição dos 25 dias de férias, o levantamento das necessidades permanentes dos serviços ou a recuperação dos módulos de três anos para efeitos de reforma antecipada.

Além destas reivindicações, há outras razões que levam a que os trabalhadores estejam descontentes. José Abraão dá alguns exemplos: pessoas que ainda não sabem quantos pontos têm para efeitos de progressão na carreira; trabalhadores que têm créditos de horas que sabem que nunca poderão gozar “porque os serviços não têm pessoal”;  ou o discurso de Mário Centeno, ministro das Finanças, que fala em aumento médio salarial de 3% no próximo ano, “quando se está a referir ao aumento da massa salarial, confundindo progressões com aumentos de salários”.

Escolas fechadas e serviços a meio gás

A greve estende-se a todos os sectores e, antecipam os dirigentes sindicais, vai levar ao encerramento de escolas, repartições públicas e serviços municipais, ao cancelamento de actos médicos e a dificuldades no acesso a serviços da Segurança Social, das finanças ou de emprego.

“Ao longo desta semana temos recebido telefonemas de trabalhadores que nos dizem que vão fazer greve, alguns deles pela primeira vez”, conta Ana Avoila. “Vai ser uma grande greve”, acrescenta, retomando uma expressão a que recorre a cada greve.

O Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE) também apela aos trabalhadores para que nesta sexta-feira deixem um “sinal claro” ao Governo de que “empobrecer não é o caminho”.

Esta união de sindicatos da UGT e da CGTP não é inédita – já aconteceu em governos anteriores. E também não se pode dizer que seja surpreendente. Na preparação do 1.º de Maio, as duas centrais sindicais já tinham avisado que o seu grande objectivo para o OE2019 era acabar com uma década de congelamento dos salários na função pública.

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