PS junta-se à direita para chumbar repúdio do PCP sobre destituição de Dilma

Parlamento aprovou votos de solidariedade com a América Latina, mas chumbou as referências à situação política no Brasil e Venezuela. PCP condenava “golpe” no Brasil e “ingerência externa” na Venezuela. Voto do PSD expressa “integral apoio” à comunidade portuguesa.

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Parlamento aprovou votos de solidariedade com a América Latina Rui Gaudêncio

Sem referências ao processo de destituição da Presidente brasileira Dilma Rousseff, à questão política na Venezuela e ao processo de paz na Colômbia foi como ficou aprovado esta sexta-feira o voto de solidariedade que o PCP propôs no Parlamento para com os povos da América Latina e Caraíbas “vítimas de acções de ingerência e desestabilização”.

O voto acabou por passar apenas com três alíneas, porque o PS se juntou à direita para chumbar os dois pontos mais políticos do documento que abordavam directamente a situação no Brasil, Venezuela e Colômbia. Caíram, assim, os pontos em que a Assembleia repudiaria o “processo que procura levar à destituição da Presidente Dilma Rousseff no Brasil” e “as acções que visam a desestabilização política, económica e social, como as que são exercidas sobre a República Bolivariana da Venezuela, assim como as tentativas de fazer fracassar o processo de paz na Colômbia”.

Apesar da posição contra do PS, na questão do Brasil nove deputados do PS votaram ao lado do PCP, BE e PEV – Paulo Trigo Pereira, Isabel Moreira, Renato Sampaio, Isabel Santos, João Galamba, Carla Sousa, Sónia Fertuzinhos e Luís Soares. E a referência à Venezuela e Colômbia teve o apoio dos socialistas António Cardoso e Isabel Santos.

Durante as curtas intervenções, o social-democrata José Cesário defendeu que a situação económica e social na Venezuela prejudica não só os nacionais como a comunidade portuguesa emigrante, que “acabam por ser vítimas de erros acumulados ao longo de décadas”. A comunista Carla Cruz veio contrapor que a situação “não está desligada das operações de ingerência e desestabilização politica, económica e social que atentam contra a estabilidade e a paz” por entidades estrangeiras e lamentou que o voto do PSD nada diga a esse respeito e o partido tenha votado contra o repúdio dessa situação. Operações que, acrescentou a deputada do PCP decorrem de uma “postura intervencionista que atenta contra a soberania dos povos, das instituições, e um profundo desrespeito pelo Estado de direito”.

“Assiste-se, em vários países da América Latina e das Caraíbas, a uma grande ofensiva desferida contra os processos progressistas e de afirmação soberana destes povos com o objectivo de reverter a evolução favorável aos trabalhadores e às camadas mais frágeis da sociedade”, defendeu Carla Cruz. “O PCP saúda as forças democráticas e progressistas que em cada país se opõem à ingerência externa e afirmam o direito dos povos a decidirem o seu futuro e caminho do desenvolvimento, defendendo a soberania nacional, a democracia, o progresso social e a paz”, acrescentou.

Uma intervenção que motivou uma resposta crítica de Telmo Correia. “Ingerência? A Venezuela não foi ocupada! O Governo da Venezuela, o chavismo e quem lidera a Venezuela não tem nenhuma responsabilidade no que está a acontecer? É impensável. É evidente que há larga responsabilidade de muita coisa que politicamente tem acontecido de errado.” O centrista disse que o que se está a passar no país “é dramático, preocupante e absolutamente inaceitável”, recusou qualquer ingerência interna e questões de outros Estados e canalizou a sua preocupação para com a comunidade portuguesa, mas também com “a democracia e os direitos humanos”. E pediu coerência ao PCP: “Olhem para a Venezuela como olham para outros países, apliquem o critério da democracia, que condena líderes da oposição e protejam assim também os portugueses que passam por dificuldades.”

Bloco e PS colocaram-se um pouco à parte da polémica. O primeiro, pela voz de Paulino Ascensão, rejeitou “qualquer abuso da força ao nível interno ou através de ingerência externa como sublinha um voto e condenou qualquer limitação à liberdade de expressão e à livre determinação do povo da Venezuela, como afirma o outro voto”. O socialista Luís Vilhena lamentou as consequências dos “graves problemas de segurança e de emergência económica” na vida dos locais e emigrantes portugueses e considerou a situação “insustentável, para a qual é urgente encontrar uma solução”.

Já o voto de solidariedade do PSD para com o povo venezuelano e a comunidade portuguesa radicada naquele país – estimada em cerca de 600 mil pessoas – foi aprovado sem votos contra e com a abstenção dos comunistas num dos dois pontos que o compunham. No texto, os sociais-democratas lembram a “rapidíssima degradação da economia local”, o “aumento da insegurança impressionante” e as situações de “pobreza extrema” em que estarão alguns portugueses ali radicados devido às dificuldades económicas que a Venezuela atravessa.

O texto dos sociais-democratas apela ao Governo português que tome medidas para “ajudar os [emigrantes portugueses na Venezuela] mais necessitados a minorar as consequências da actual situação económica e de segurança” e manifesta a solidariedade aos venezuelanos, “esperando que as autoridades locais, no mais absoluto respeito pelas regras da democracia, saibam encontrar os adequados caminhos para a rápida e consolidada recuperação da economia daquele país e o consequente combate à pobreza, ao desemprego e à criminalidade”.

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