Crise na China travou subida de taxas nos EUA

Ainda sem certezas sobre a recuperação total do mercado de trabalho e da inflação, a Fed viu na crise financeira chinesa um sinal de que o melhor é esperar mais um tempo antes de passar à acção.

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Janet Yellen continua sem ver a inflação a disparar

Ainda insatisfeita com o nível até onde o desemprego desceu e convencida de que a inflação ainda não está a subir para os níveis considerados ideais, a Reserva Federal norte-americana viu na recente crise financeira chinesa mais um sinal de que a hora de voltar a subir taxas de juro ainda não chegou nos Estados Unidos. E assim, pelo menos até à próxima reunião em Outubro, o inédito período de taxas de juro zero na maior economia do planeta, que já dura há seis anos e meio, irá prolongar-se.

A expectativa em relação à decisão que sairia da reunião da Fed desta quinta-feira era grande. Este era o antepenúltimo encontro antes do final do ano e a presidente da Fed, Janet Yellen, tinha sinalizado antes que, até ao fim de 2015, as taxas voltariam a subir. Nos últimos dias, os analistas mostraram estar divididos em relação ao que poderia vir a acontecer. Uma subida significaria que a Fed estava optimista em relação à evolução da PIB e do emprego nos EUA, preferindo proteger-se de um risco de sobreaquecimento e de uma posterior derrapagem da inflação. A manutenção das taxas, pelo contrário, constituiria um sinal claro de que a Fed ainda não tem total confiança na sustentabilidade e força da retoma. Esta última visão, sabe-se agora, ainda é dominante entre os responsáveis da Fed.

No comunicado publicado esta quinta-feira, a Reserva Federal diz que ainda não começou a subir taxas este mês porque, antes de isso acontecer, quer ver “mais melhorias no mercado de trabalho” e estar “razoavelmente confiante” que a inflação irá subir. Nas suas previsões, os responsáveis da Fed apontam para uma queda do desemprego para 4,8% em 2016 e para uma aproximação lenta e moderada da inflação da meta de 2%.

Na conferência de imprensa que se seguiu à decisão, Janet Yellen disse que esses valores colocavam a Reserva Federal “mais perto” do cenário em que as taxas podem começar a subir, mas voltou a assinalar que a taxa de desemprego oficial esconde realidades como a do elevado número de empregos parciais involuntários, que fazem com que, apesar do desemprego estar mais baixo, os salários não cresçam ao ritmo que seria normal.

No entanto, o que Janet Yellen também quis deixar claro é que, na reunião desta quinta-feira, um factor exterior à economia dos Estados Unidos também pesou muito na decisão tomada. Durante as últimas semanas, as bolsas chinesas caíram fortemente e o iuan depreciou-se fortemente face ao dólar.

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Para os Estados Unidos, isso pode significar uma deterioração das condições financeiras das empresas e uma apreciação do dólar, que na prática representa para a economia um efeito semelhante ao de uma subida das taxas. Logo no comunicado inicial, a Fed diz que “os desenvolvimentos económicos e financeiros recentes a nível mundial podem restringir de alguma forma a actividade económica e provavelmente poderão trazer mais pressões de descida para a inflação no curto prazo”.

Pouco depois, Janet Yellen tornou ainda mais claro qual foi o impacto da crise chinesa na decisão da Reserva Federal. “A recuperação face à Grande Recessão já foi suficientemente longe para que possa haver argumentos para uma subida das taxas de juro. E nós discutimos essa possibilidade. No entanto, tendo em conta o aumento das incertezas no exterior e o percurso ligeiramente mais suave da inflação, julgámos apropriado esperar por mais provas, incluindo mais melhorias no mercado de trabalho, para aumentar a confiança de que a inflação irá subir para 2% no médio prazo”, disse a presidente da autoridade monetária.

A Fed não abandona para já o cenário de uma subida de taxas de juro até ao final do ano, o que significa que as atenções se irão virar para as próximas reuniões agendadas para Outubro e Dezembro. Questionada especificamente sobre a possibilidade de uma subida na próxima reunião, Yellen disse que ”sim, Outubro continua a ser uma possibilidade”.

A existência de divisões entre os 17 membros da Fed que votam neste tipo de decisões também se mantém. Houve quem defendesse o início de uma subida de taxas imediata, mas ao mesmo tempo há quem, receando um cenário de estagnação secular nos Estados Unidos e de perigo de deflação, considere que o que é necessário é avançar para taxas de juro negativas.

A presidente, por seu lado, voltou a insistir na ideia de que o que conta mais não é o momento em que a primeira subida de taxas de juro irá acontecer, mas sim o rumo traçado para o futuro. “Assim que começarmos, continuamos a esperar que as condições económicas evoluam de uma maneira que exija apenas subidas graduais da taxa de juro da Fed”, concluiu.

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