Os eleitores estão escaldados

Daqui até início de Outubro teme-se o pior no que toca a promessas eleitorais.

Depois de ter encenado a sua indignação com as propostas incluídas no estudo que os 12 economistas fizeram por encomenda do PS, para servir de base aos capítulos sobre economia e desenvolvimento do programa eleitoral dos socialistas, e ter enchido o espaço mediático com a exigência de que o documento fosse analisado pelo Conselho das Finanças Públicas ou pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental, o PSD deixou cair a ideia.

Outra coisa não era de esperar, já que a ideia era absurda. Primeiro porque os partidos são entidades privadas e no quadro legal português não têm de ver os seus projectos fiscalizados por instituições públicas. Segundo porque cabe aos eleitores ajuizar sobre os programas eleitorais e sufraga-los ou não através do voto.

É certo que o documento dos 12 economistas levanta dúvidas. O que não pode deixar de acontecer, já que as previsões e os desenhos de gestão económica não são uma experiência científica sem riscos de variação. São modelos matemáticos. E a possibilidade de risco é tão real, que o próprio Plano de Estabilidade que o Governo do PSD-CDS apresentou na Assembleia da República e entregou em Bruxelas, ao ser analisado, enquanto documento de Estado, pelo Conselho das Finanças Públicas, foi considerado como contendo “riscos”. Os riscos fazem parte das soluções e cabe aos eleitores escolher o tipo de soluções, com os inerentes riscos, que desejam. E o caminho estreito em que Portugal pode ser governado, fruto dos compromissos que assumiu quer com os credores, quer com os parceiros da União Europeia, pré-condiciona as decisões e as opções.

Há, de facto, uma opção alternativa, que é a de rasgar os compromissos. Isso implicaria a saída de Portugal do euro. É essa a posição do PCP já há anos. E é agora também a posição do BE, depois de, esta semana, Catarina Martins ter anunciado que as propostas eleitorais desse partido não cumprirão as metas orçamentais a que o país está obrigado. Uma posição que mostra o deslizamento para a extrema-esquerda do Bloco, ao assumir uma posição que seria impensável sob liderança de Francisco Louçã.

Como é evidente, o PCP e o BE tem todo o direito de apontar o caminho que defendem que o país deve seguir, mas era bom que explicasse aos portugueses como é que eles vão viver se o país sair do euro e quais as reais consequências que tal medida terá sobre a economia. Pode ser que até encontrem soluções que venham a atrair o voto maioritário dos portugueses. Até porque com a experiência que está a ser vivida pela Grécia e a eventual iminência da sua saída do euro, poderá ficar aberto um caminho alternativo que os eleitores podem hipoteticamente escolher.

Era importante que todos os dirigentes partidários, independentemente do tipo de propostas que venham a apresentar aos eleitores, tenham a exigência para consigo mesmos de alguma seriedade e que não abusem das promessas irrealizáveis e do eleitoralismo. Vem isto a propósito do comportamento eleitoralista que os dois candidatos a primeiro-ministro têm tido.

De um lado, Passos Coelho fala de Portugal neste final da legislatura em que governou, como de uma verdadeira terra de leite e de mel que está ao virar da esquina, depois de, conduzidos pela sua mão firme, os portugueses terem atravessado o Nilo da crise e o deserto de quatro anos de austeridade, tal como Moisés conduziu o seu povo durante 40 anos até à Terra Prometida. Não sei se Passos Coelho acredita mesmo naquilo que disse no aniversário do PSD, mas o país das maravilhas que pintou corresponde pouco a realidade dos portugueses.

Do outro lado, o PS também deve ter algum pudor em prometer mundos e fundos. Depois de gerir o silêncio à espera de um modelo de crescimento que lhes foi preparado pelos 12 economistas, por que carga de água é que António Costa começou a desdobrar-se em promessas? Pelo que foi apresentado, o modelo dos 12 economistas têm uma coerência interna, por que razão introduzir promessas de baixar do IRS e repor as 35 horas de trabalho para os funcionários públicos, se essas medidas não estavam no documento dos economistas? Será que estas medidas são coerentes com o modelo preparado pelos economistas e não introduzem distorção?

Com o aquecer da pré-campanha, daqui até início de Outubro teme-se o pior no que toca a promessas eleitorais. Mas era importante que os dirigentes políticos tivessem em conta que os eleitores estão escaldados e que os últimos anos de crise, austeridade e perda de qualidade de vida podem ter feito com que estejam mais prevenidos e sejam mais exigentes. Logo, estejam menos disponíveis para irem em cantos de sereias do eleitoralismo fácil.

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