Venda de imóveis do BES bloqueada por impasse das autoridades

Quando o BES foi partido em banco bom e banco “tóxico”, 15 mil imóveis avaliados em dois mil milhões de euros passaram para o Novo Banco. Mas falta um instrumento legal. Tecnicamente, são activos mortos.

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Reuters

Há dois meses que o Novo Banco está impossibilitado de negociar a venda da sua carteira de imóveis por, no processo de resolução do BES, não terem sido acautelados os mecanismos legais que possibilitam a concretização das transacções. Esta situação está a gerar bloqueios à actividade do Novo Banco e problemas a quem está do lado comprador.

Os processos abertos no BES para aquisição de imóveis até 3 de Agosto (data em que foi intervencionado e dividido em duas instituições), encontram-se desde aí paralisados, apesar de terem sido transferidos para a esfera do Novo Banco (que recebeu os activos bons). De igual modo, os clientes que se propõem avançar com ofertas estão a enfrentar os mesmos entraves administrativos.

Em causa está a ausência de registo nas Repartições de Finanças da transferência dos activos do BES para o Novo Banco, que agora tem à frente Eduardo Stock da Cunha. Não só os notários resistem a dar andamento às operações, como as conservatórias colocam entraves à liquidação do IMT.

“As dificuldades são totais e os negócios estão paralisados”, explicou uma fonte que está há dois meses a aguardar luz verde para formalizar um negócio com o Novo Banco. Observou ainda que “todas as escrituras e contratos não estão a ser realizados, porque o Novo Banco está impedido de os assinar”. Para outro responsável do sector, inquirido ontem pelo PÚBLICO, “o que é chocante é que num caso destes, em que há a preocupação de recuperar um banco, as autoridades [Governo e Banco de Portugal] não tenham acautelado a situação e durante meses se tenha ficado à espera de uma solução.”

O PÚBLICO tentou obter esclarecimentos sobre o tema junto do Banco de Portugal que não esteve disponível para responder. Já o Novo Banco considera o tema “ultrapassado”.

Em Agosto, quando se verificou a divisão do BES em dois (banco “tóxico” e Novo Banco), transitaram para o balanço do Novo Banco cerca de 15 mil imóveis (como prédios, apartamentos e terrenos, grande parte recebidos em dação em pagamento para posterior venda) avaliados em aproximadamente 2 mil milhões de euros. Apesar de registados no balanço, acabam por não poder ser transaccionados, pelo que tecnicamente tornam-se um activo morto, com implicações negativas nas contas.  

Meta de 500 milhões

Um dos problemas que nos últimos anos ajudou a deteriorar as contas da banca, em especial as do BES, dado o quadro económico recessivo, foi precisamente a grande exposição da instituição ao imobiliário. O que levou em 2013 o banco ainda presidido por Ricardo Salgado a constituir uma provisão para imparidades de crédito de 1422,8 milhões de euros. 

Em 2013, o BES vendeu 3462 imóveis, com um encaixe de 444 milhões de euros e uma mais-valia de 500 mil euros. A meta definida no início deste ano para o corrente exercício apontava para um valor à volta dos 500 milhões de euros. A venda dos activos surge, assim, como uma via para a banca equilibrar as contas através do encaixe de fundos e sobretudo por eliminação de imparidades. 

Desde 3 de Agosto que o Novo Banco é propriedade do Fundo de Resolução bancária, gerido pelo Banco de Portugal, mas fundeado nos restantes bancos do sector que foram chamados de forma indirecta e directa a recapitalizar a parte boa do antigo BES. A Associação Portuguesa de Bancos (APB) comunicou que só a Caixa Geral de Depósitos (CGD), o BCP, o BPI e o Santander Totta tomaram firme o financiamento de 635 milhões de euros.  O valor global injectado no Novo Banco foi de 4,9 mil milhões de euros (dos quais o Estado emprestou 3,9 mil milhões).

A falta de esclarecimento sobre a verdadeira situação da instituição liderada por Eduardo Stock da Cunha, que ainda não divulgou a actualização do seu balanço, está também a reflectir-se no resto do sector, pois os bancos que contribuem para o Fundo de Resolução têm estado provisionar parcialmente ou a 100% as verbas que injectaram.     

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