Subida de um ponto nos juros agrava défice em 400 milhões este ano

No seu cenário base, o Governo está a contar com uma redução progressiva do peso da despesa pública com juros no PIB e com a manutenção da ajuda do BCE. Mas faz cálculos para os riscos.

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Mário Centeno deu a cara pelo guião do Governo para os próximos anos. LUSA/TIAGO PETINGA

E se, mesmo com o Governo a tentar cumprir os seus planos de redução do défice, a situação nos mercados piorasse, agravando os custos de financiamento do país? Poderia a estratégia delineada para as finanças públicas ficar em causa?

Este é, tendo conta o cenário de incerteza que tem rodeado a relação com os mercados desde o início da crise da dívida soberana do euro em 2010, um dos principais riscos que qualquer Programa de Estabilidade apresentado por qualquer Governo corre em Portugal. E no documento aprovado esta quinta-feira pelo Executivo, apesar de no cenário central não se assumir a existência de qualquer situação de stress nos mercados, analisa-se qual o impacto para as finanças públicas de um agravamento das taxas de juro.

De acordo com as contas do Governo, um aumento imediato e permanente de um ponto percentual nas taxas de juro da dívida exigidas pelos mercados a Portugal em todas as maturidades conduziria a um agravamento das despesas com juros (em contabilidade nacional, a que conta para o cálculo do défice) de 413 milhões de euros em 2017. Isto é, tudo o resto mantendo-se igual, o défice ficaria, em 1,7% em vez dos 1,5% previstos.

O impacto negativo de um cenário deste tipo agravar-se-ia nos anos seguintes. O cálculo feito pelo Executivo aponta para aumentos das despesas com juros de 609 milhões de euros (cerca de 0,3% do PIB) em 2018, 769 milhões (0,4% do PIB) em 2019, 959 milhões (0,5% do PIB) em 2020 e 1158 milhões (0,5% do PIB) em 2021.

De salientar que as contas do Governo têm “por base o pressuposto de que não existe qualquer correlação entre as taxas de juro e outras variáveis orçamentais ou macroeconómicas”. Isto é, não levam em conta a possibilidade de a subida de taxas de juro poder conduzir a um crescimento mais baixo da economia, o que poderia, diz o Programa de Estabilidade, “conduzir a um impacto no défice e na dívida superior ao aqui estimado”.

A ameaça de uma deterioração das condições de acesso ao mercado por parte de Portugal tem sido uma constante nos últimos anos e não desapareceu com os recentes resultados positivos registados ao nível do crescimento económico e do défice. Entre os principais riscos para Portugal estão a forma como os investidores poderiam reagir a uma retirada dos estímulos monetários por parte do BCE (incluindo uma ainda maior redução das compras de dívida pública portuguesa por parte do banco central), a uma vitória eleitoral de uma força política anti-euro em algum país europeu ou a uma descida das classificações atribuídas pelas agências de rating.

Há também riscos pela positiva. Isto é, é possível que o ambiente possa melhorar para Portugal, sendo uma das possibilidades a atribuição de uma classificação mais positiva por alguma das agências de rating que actualmente colocam Portugal no nível “lixo” ou pela DBRS (que já coloca Portugal acima de “risco”) e que se pronuncia sobre o país na próxima sexta-feira.

No seu cenário central, o Governo aponta para um cenário benigno ao nível dos juros. Aliás, a despesa com juros é, segundo o Programa de Estabilidade, uma das áreas que mais contribuem entre 2017 e 2021 para a passagem de um défice de 1,5% para um excedente de 0,9%, reduzindo o seu peso no PIB em 0,6 pontos percentuais. Só em 2018, o peso da despesa do Estado com juros passa de 4,2% para 4%, estando o Governo a contar com um efeito positivo de 152 milhões de euros decorrente das amortizações antecipadas da dívida ao FMI que foram feitas nos últimos meses e que o Governo diz continuarão a ser realizadas até 2019.

Em relação ao contributo da política monetária do BCE, que tem sido fundamental desde 2012 para limitar o nível das taxas de juro da dívida de Portugal, o Governo está esperançado na manutenção por mais algum tempo de uma política expansionista. O Programa de Estabilidade assume que a taxa de juro de curto prazo (que é em grande medida definida pelo valor da taxa de juro de referência do BCE) se manterá em valores negativos pelo menos até 2019, começando a subir ligeiramente nos dois anos seguintes.

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