Proposta de nova Constituição chilena aprovada pelo Conselho Constitucional

Apenas a direita votou a favor da proposta, que será votada em referendo a 17 de Dezembro. É a segunda tentativa em dois anos para aprovar uma nova Constituição.

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Comício durante a campanha para o referendo constitucional de Setembro de 2022 no Chile EPA/Alberto Valdes
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O Conselho Constitucional chileno aprovou nesta segunda-feira o esboço da nova Constituição que será sujeita a referendo em Dezembro. O novo texto foi aprovado num ambiente de enorme divisão entre a esquerda e a direita, maioritária no órgão que redigiu a proposta.

Pela segunda vez, o Chile vai tentar fazer aprovar uma nova Constituição para substituir a que está em vigor desde 1980, quando o país sul-americano ainda era uma ditadura governada por Augusto Pinochet, embora com dezenas de alterações e revisões após o retorno da democracia nas últimas três décadas.

O processo de redacção da nova Constituição chilena tem sido longo, turbulento e polarizador. O primeiro esboço foi rejeitado num referendo em Setembro do ano passado por mais de 60% do eleitorado, que o considerou demasiado radical e perigoso para a unidade nacional. A assembleia que tinha sido eleita para debater e elaborar a Constituição tinha uma maioria de parlamentares de esquerda, muitos dos quais alinhados com o Presidente Gabriel Boric.

Para a segunda tentativa, foi proposto um caminho alternativo, com o intuito de impedir a partidarização excessiva dos trabalhos de redacção da nova Constituição. Por isso foi nomeado um Comité de Especialistas, escolhido pelo Congresso, que estabeleceu alguns pilares e princípios básicos que deviam ser respeitados pelo novo texto.

Em Maio, foram eleitos os 50 membros do Conselho Constitucional com uma onda avassaladora da direita e da direita radical. O Partido Republicano, do ex-candidato presidencial José Antonio Kast, foi o mais votado e assegurou 22 lugares no conselho. Com a maioria assegurada, a direita conseguiu fazer aprovar todas as alterações que entendeu ao texto apresentado pelo Comité de Especialistas.

As esperanças de que a segunda tentativa de elaborar um Constituição pudesse servir para unir o país em torno deste projecto parecem ter saído goradas. A proposta que será votada a 17 de Dezembro contou com o voto favorável apenas dos 33 conselheiros eleitos pela direita e pela extrema-direita e foi chumbada pelos 17 alinhados com a esquerda.

A sessão de discussão e votação foi turbulenta, numa boa montra do espírito que vigorou durante os cinco meses de análise e redacção da nova Constituição. “Optaram por impor um texto excludente, dogmático, retrógrado e polarizador, que representa um risco de instabilidade política e social, precisamente por deixar sem espaço democrático outras ideias democráticas”, afirmou o parlamentar socialista Alejandro Kohler, durante o debate.

“Esta Constituição é boa, está bem feita, e a esquerda não a aprecia e ridiculariza-a porque tem medo que o seu êxito ponha fim à sua narrativa e feche a porta a ideologias que tanto prejudicaram milhões pelo mundo”, disse, por seu turno, a conselheira do Partido Republicano, Ángeles López.

Apesar dos princípios estabelecidos pelo Comité de Especialistas, o texto que irá a votos está longe de reunir consenso. Um avanço sublinhado pelos sectores mais progressistas é a consagração do Estado social, um pilar que tinha sido salvaguardado pelo comité, embora as alterações aprovadas pela direita o tenham vindo a esvaziar com a inclusão da modalidade do Estado subsidiário – um modelo em que o sector privado é chamado a cumprir funções relevantes na assistência social.

A direita também acrescentou um artigo em que é referida a protecção da “vida de quem está por nascer”, sugerindo que esta norma constitucional poderá pôr em causa a descriminalização do aborto em vigor no Chile desde 2017. O texto constitucional refere ainda a possibilidade de uma deportação rápida de migrantes que tenham chegado ao país de forma irregular.

As sondagens mostram que o descrédito que condenou a primeira versão da nova Constituição contagiou a actual, que corre o risco de vir a ser novamente rejeitada nas urnas. Apesar de se registar uma tendência de aumento do apoio à proposta nas últimas semanas, na sondagem mais recente mais de 50% dos inquiridos dizia que pretende votar contra o texto, contra apenas 34% a favor.

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