Auge e queda do Vox: das municipais de Maio às legislativas de Julho

Extrema-direita fica fora da Mesa do Congresso, apesar de ser a terceira força. Abascal está “perplexo” com Feijóo.

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Abascal afirmou-se "perplexo" com a "falta de generosidade" do PP VIOLETA SANTOS MOURA/Reuters
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Logo depois das eleições regionais do final de Maio, Santiago Abascal lembrava que havia “um partido que ganhou em muitas comunidades e autarquias, mas que não tem maioria para governar e deve escolher se negoceia connosco ou segue outro caminho”. A vitória indiscutível foi do Partido Popular – tão esclarecedora que Pedro Sánchez decidiu antecipar as legislativas – mas o Vox era a chave da governabilidade, alcançando um estatuto que contava ainda mais do que votos: era, finalmente, imprescindível para o PP.

Abascal venceu a batalha, fechando pactos com o partido de Alberto Nuñez Feijóo em quatro comunidades autónomas e em 140 municípios, e conseguindo impor aos conservadores conselheiros da Agricultura, Assuntos Sociais ou Cultura: os efeitos foram imediatos, com o fim das pastas da Igualdade e a agenda anti-LGBTI+ do partido a ditar o cancelamento de filmes e peças de teatro em algumas destas regiões e cidades.

O PP normalizava a extrema-direita e Abascal acreditava que a guerra estava ganha. Perderia votos nas legislativas, mas ia chegar ao poder. De caminho, apresentou um programa que previa ilegalizar os partidos independentistas e matar as autonomias, assim como revogar as leis da Memória Democrática, da Violência de Género, a Lei Trans e a da Eutanásia, aprovadas pela coligação de esquerda. Ao mesmo tempo, entregava as negociações regionais ao sector integrista, liderado por Jorge Buxadé, e marginalizava dirigentes como Iván Espinosa de los Monteros, porta-voz parlamentar e último dos fundadores, para além de Abascal, que permanecia no partido.

O rosto fechado de Abascal durante a sessão inaugural do Congresso, esta quinta-feira, era o de quem perdeu a aposta. Apesar de se manter como terceira força, o partido baixou de 52 para 33 lugares, um resultado que dirigentes como Espinosa de los Monteros – que abandonou o partido, abrindo uma crise interna – atribuem a uma deriva autoritária e ultra-católica. É verdade que o PP não poderá chegar ao poder sem os 33 deputados radicais, mas também não o conseguirá só com eles.

As contas obrigaram Feijóo a perceber que contar com o Vox significa perder outros potenciais aliados: logo no dia seguinte às eleições, o Partido Nacionalista Basco, de centro-direita, recusava “iniciar conversações para facilitar a sua investidura", uma posição que se manteve mesmo quando Abascal deixou cair a exigência de integrar o executivo.

O fim desta história está por escrever – depois de ter normalizado o Vox e de assumir algumas das suas posições, o PP prepara-se para o engolir, escrevem alguns analistas na imprensa espanhola –, mas foi num tom de fim de festa que Abascal deixou a sessão do Congresso, depois de falhar a conquista de uma das vice-presidências da Mesa.

Dizendo-se “perplexo” com a enorme “falta de generosidade” demonstrada pelo PP, ao recusar ceder alguns votos ao suposto aliado, o líder do Vox não quis antecipar o fim do acordo com vista à investidura. Preferiu agitar o fantasma do independentismo e do "governo de destruição nacional" que acusa Pedro Sánchez de se preparar para formar, com o apoio dos separatistas catalães e bascos. O rei ainda não propôs nenhum candidato à presidência do governo, mas Abascal já se assume como oposição.

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