Coimbra participa em projecto de extracção de ADN de esqueleto com dez mil anos

Investigadores concluíram que “os primeiros caçadores-colectores do Holocénico são geneticamente distintos uns dos outros e de populações posteriores no Leste da América do Sul”.

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Estudo inclui o maior conjunto de dados genomas antigos do Brasil Andre Strauss

Uma equipa de cientistas internacionais, que inclui uma investigadora da Universidade de Coimbra, conseguiu extrair ADN de um esqueleto com dez mil anos de idade, conhecido como Luzio, foi anunciado esta segunda-feira.

Os resultados mostram que Luzio "é um antepassado das populações nativas americanas actuais e que, portanto, a hipótese de que os primeiros brasileiros pertenceriam a uma população distinta estava equivocada", salientou a Universidade de Coimbra em comunicado.

"O estudo inclui o maior conjunto de dados genomas antigos do Brasil para demonstrar que as comunidades costeiras da Antiguidade Ameríndia (sambaquis) não representam uma população geneticamente homogénea", sublinhou a investigadora Cláudia Cunha, do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde (CIAS) da Universidade de Coimbra.

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Cláudia Cunha, cientista do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde da Universidade de Coimbra DR

A cientista frisou que "este é o primeiro estudo genético que abarca uma região tão grande e este número de indivíduos para o país", tendo através da sequenciação genética de ADN antigo "produzido dados de 34 indivíduos com dez mil anos das regiões de Costa Atlântica, Lagoa Santa, Baixo Amazonas e Nordeste do Brasil".

Os sambaquis

O comunicado refere que os sambaquis "são construções verticais feitas em conchas, estabelecidas há cerca de oito mil anos ao longo de mais de três mil quilómetros na costa Leste da América do Sul".

"Segundo registos arqueológicos, os construtores de sambaquis partilhavam algumas semelhanças culturais. No entanto, ao contrário do que se esperava, estes grupos de pessoas apresentaram diferenças genéticas significativas, possivelmente devido a contactos regionais com grupos do interior", concluiu o estudo.

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Sambaqui Jabuticabeira II com centenas de esqueletos, no Brasil Ximena Villagran

Tiago Ferraz, primeiro autor do estudo e especialista no Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (Brasil), salientou, no comunicado, que aquelas "relíquias culturais conhecidas como sambaquis foram construídas ao longo de sete mil anos, sendo constituídas principalmente por conchas, sedimentos e outros resíduos diários".

"Os sambaquis foram utilizados por antigas populações indígenas como moradias, cemitérios e demarcação territorial, estando entre os fenómenos arqueológicos mais fascinantes da América do Sul pré-colonial", realçou ainda Tiago Ferraz.

Os responsáveis pelo estudo Genomic history of coastal societies from eastern South America, que inclui também investigadores da Universidade de Tübingen (Alemanha), asseguram que "extrair o ADN do esqueleto de Luzio era uma peça central que faltava para se desvendarem as origens dos primeiros americanos".

"Os resultados obtidos mostram de forma clara que não existiu no passado uma população humana diferente na América, como se acreditou por décadas", sustentaram.

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Reconstituição do crânio do esqueleto com dez mil anos de idade, conhecido como Luzio Andre´ Strauss

Com este estudo, publicado esta segunda-feira na revista Nature Ecology & Evolution, os investigadores concluíram que "os primeiros caçadores-colectores do Holocénico [a época geológica em que os seres humanos se encontram há cerca de 12 mil anos] são geneticamente distintos uns dos outros e de populações posteriores no Leste da América do Sul", pelo que "não houve relações directas com os grupos costeiros posteriores".

O comunicado reforçou que as "análises da equipa indicam ainda que os grupos contemporâneos de sambaquis da costa Sudeste do Brasil, por um lado, e da costa Sul do Brasil, por outro, eram geneticamente heterogéneos".

O estudo conclui ainda que "ambas as regiões apresentaram trajectórias demográficas distintas, possivelmente devido à baixa mobilidade dos grupos do litoral", contrastando com as "semelhanças culturais descritas no registo arqueológico".

Os investigadores realçaram que é necessário realizar mais estudos regionais e em microescala para aprender mais sobre a história genómica da América do Sul.

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