Unicef: 94% das crianças portuguesas já estão expostas a ondas de calor frequentes

Unicef publica relatório que diz que cerca de metade das crianças e jovens na região da Europa e da Ásia Central está exposta a uma elevada frequência de ondas de calor, o dobro da média mundial.

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Problemas na gravidez e bebés com peso abaixo do normal são algumas das consequências de ondas de calor não mitigadas Manuel Roberto
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Com as temperaturas a subir, os olhos estão postos na protecção de grupos mais vulneráveis. Mas, se por um lado, o alerta é mais claro para proteger populações idosas e pessoas com doenças crónicas, em maior risco de morte em função do calor, há um grupo que não pode ficar para trás: as crianças. Num relatório divulgado esta quinta-feira pela Unicef, a Europa destaca-se pela negativa. Portugal mais ainda.

No documento Combater o calor: proteger as crianças das ondas de calor na Europa e na Ásia Central, lançado esta quinta-feira, a Unicef alerta que cerca de metade das crianças e jovens na região da Europa e da Ásia Central está exposta a uma elevada frequência de ondas de calor, quando a nível mundial a proporção é de “apenas” um quarto desta população.

Na Europa, o continente que mais aquece no mundo, o problema torna-se cada vez mais presente: em Portugal, são mesmo 94% das crianças e jovens 1,5 milhões até aos 18 anos que estão expostas às ondas de calor cada vez mais frequentes, fenómenos climáticos que, com a crise climática, tendem a ser também mais intensos, revela a Unicef.

E as previsões para o futuro não são as melhores. Nos cenários mais optimistas, que prevêem um aumento da temperatura média global em 1,7 graus Celsius, a Unicef estima que “todas as crianças na Europa e na Ásia Central, incluindo em Portugal, estarão expostas a uma elevada frequência de ondas de calor”, ou seja, havendo em média 4,5 ou mais ondas de calor por ano.

Além da elevada frequência, também 81% estarão expostas a ondas de calor de longa duração, ou seja, com cinco dias ou mais, conclui o organismo, baseando as estimativas em dados de 2020 sobre a população de 50 países destas regiões. Mesmo nesse cenário mais conservador, a previsão da Unicef é que, dentro de menos de 30 anos, 28% das crianças da região sejam expostas a “ondas de calor de gravidade elevada”.

Crise climática, uma crise de direitos humanos

Em Novembro do ano passado, no relatório O ano mais frio do resto das suas vidas: proteger as crianças dos impactos crescentes das ondas de calor, a Unicef já previa que, até 2050, serão mais de 2 mil milhões as crianças que, a nível global, vão estar expostas a ondas de calor mais frequentes. “A crise climática é uma crise de direitos das crianças — e já está a causar danos devastadores na vida e no futuro de muitas crianças”, escrevia Catherine Russell, directora executiva da Unicef, no lançamento do relatório.

A Unicef chama ainda a atenção para uma série de consequências das ondas de calor na saúde de crianças e jovens, mas também na gravidez. A exposição sem cuidados a ondas de calor pode gerar complicações no parto, assim como levar a que os bebés nasçam com peso abaixo do normal.

Há, de facto, um grupo de pessoas mais vulneráveis aos efeitos do calor excessivo, onde encontramos os mais velhos e também os mais novos, além das pessoas com problemas crónicos. Neste documento que fala sobre as crianças, a Unicef nota que os adultos sentem o calor de forma diferente das crianças, o que pode fazer com que pais e cuidadores não identifiquem atempadamente situações de perigo ou mesmo emergência.

Insolações e diarreia podem ser sinais mais imediatos a ter em atenção, asma e outros problemas respiratórios, alergias e doenças cardiovasculares são outros problemas que se podem acumular à medida que se torna mais frequente a exposição de crianças ao calor.

O corpo humano tem alguns limites na adaptação às temperaturas externas, e o documento da Unicef nota que o corpo das crianças tem uma regulação menos eficaz do que o dos adultos. No caso dos mais novos, a temperatura corporal tende a subir mais rapidamente do que a dos adultos.

É preciso apostar na hidratação, por exemplo, encorajando as crianças a beber água ainda antes de pedirem: “A sede indica que o corpo já está desidratado”, lê-se no relatório.

Adaptação é essencial

Além dos números que fazem soar o alerta, a Unicef recorda também as soluções que podem ajudar a proteger os mais novos dos riscos associados às ondas de calor, recordando que é preciso pôr em prática mecanismos de mitigação e de adaptação às ondas de calor.

“Metade das crianças da região está agora exposta a uma elevada frequência de ondas de calor”, afirma Regina de Dominicus, directora regional da Unicef para a Europa e Ásia Central, citada no comunicado da Unicef. “As várias implicações na saúde, actual e futura, de uma proporção tão significativa de crianças da região devem ser um catalisador para os governos investirem urgentemente em medidas de mitigação e adaptação”, acrescenta.

As cidades, em particular aquelas com poucas áreas arborizadas e mais densidade de construção, devem preparar-se para proteger as populações quando soam os alertas para ondas de calor. Garantir a disponibilidade de água potável é outra recomendação central da Unicef, que alerta em particular para os territórios em situações precárias de seca.

Também os serviços de saúde e até de segurança social devem estar preparados e atentos às populações mais vulneráveis. E, claro, a escola: uma das recomendações da Unicef é que as crianças e jovens aprendam “competências ecológicas”, que incluem comportamentos adequados para se protegerem de um planeta cada vez mais quente e intenso.

Em Portugal, o Programa de Acção para a Adaptação às Alterações Climáticas (P-3AC) prevê a “prevenção de ondas de calor” através de medidas como a criação de infra-estruturas verdes e áreas com sombra ou climatizadas artificialmente e também através de campanhas de comunicação que esclareçam a população sobre quais são as melhores medidas de prevenção e adaptação.

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