Consumismo ético na base do desenvolvimento sustentável

Nem sempre se pode pedir ao consumidor que faça escolhas na prateleira do supermercado ou na loja de pronto a vestir com base apenas na consciência do impacto ambiental daquele produto.

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No centro do muito discutido desenvolvimento sustentável está uma figura que raramente protagoniza esses debates: o consumidor. Ao exercer a sua atividade de consumo e o seu direito de escolha, ele consegue ter grande influência no rumo das economias. Mas, nem sempre se pode pedir ao consumidor que faça escolhas na prateleira do supermercado ou na loja de pronto a vestir com base apenas na consciência do impacto ambiental daquele produto. Especialmente em alturas de maior dificuldade económica, essa opção torna-se, com frequência, inviável.

No entanto, o ato da compra está longe de esgotar o arsenal de comportamentos de consumo ético, que incluem, por exemplo, reparar, reutilizar ou praticar o upcycling (transformar artigos que já não são úteis para criar valor) antes de pensar em reciclar ou, ainda pior, descartá-los em vez de tentar estender o seu ciclo de vida.

Optar por adquirir itens de segunda mão não apenas ajuda a economizar dinheiro, mas também desempenha um papel importante na preservação ambiental ao reduzir resíduos e minimizar a utilização de recursos naturais durante a produção.

Também a capacidade de compreender a informação presente na embalagem dos produtos deve ser uma habilidade fundamental para o consumidor ético. A compreensão e a disponibilidade de rótulos indicativos de sustentabilidade e promoção de práticas éticas são um fator de peso na decisão de compra. Rótulos como o Orgânico (promovido pela Soil Association), o Vegan (pela Vegan Society), o Fairtrade (pela Fairtrade Foundation) e o Cruelty Free (pela Cruelty Free International) são excelentes indicadores de produtos éticos. Estes são apenas exemplos dos muitos comportamentos do consumidor ético que permitem aumentar o peso de cada um na economia sustentável e ética.

O desenvolvimento sustentável é um tema já incontornável. Em quase todas as atividades, existe a procura de novos métodos de fabrico, materiais, meios de produção energética e comportamentos no sentido da transição para uma economia circular. É possível dizer que, para lá do desejo de uma economia circular respeitadora dos recursos e ecossistemas da Terra e do planeta em si, há também uma grande vontade de construir uma economia ética, respeitadora não só do planeta, mas também de causas sociais, agindo em prol de um mundo mais ético.

Como posso começar a minha jornada como um consumidor ético? Embora seja fácil falar sobre a importância de estar informado e conhecer os assuntos relevantes nos quais podemos ter influência, colocar esses conhecimentos em prática é um desafio maior.

Apesar de vivermos numa era onde se pressupõe que temos acesso a um volume enorme de informações por meio de meios digitais, encontrar fontes confiáveis não é uma tarefa simples. No entanto, é importante ressaltar que há outros obstáculos que encontramos ao longo do caminho para nos tornarmos consumidores éticos. A organização Ethical Consumer oferece mais de 100 guias de fácil leitura que procuram educar o consumidor sobre os assuntos que importam e os comportamentos mais eficazes.

A aplicação Good on you dá ênfase ao respeito pelo meio ambiente, pelos animais e pelo estabelecimento de condições de trabalho dignas, procurando guiar o consumidor para que este represente uma influência significativa na defesa desses três pilares fundamentais. A nível nacional, o Human Neurobehavioral Laboratory em parceria com a Escola Superior de Biotecnologia, ambos da Universidade Católica Portuguesa no Porto, e vários outros parceiros do setor industrial estão a desenvolver os projetos BE@T, direcionado à indústria têxtil portuguesa, e BioShoes4All, ligado à indústria do calçado português, têm como um dos seus objetivos educar o consumidor acerca da sustentabilidade e do seu possível impacto na economia circular.

Na busca por uma economia circular e ética há vários interesses envolvidos, todos com deveres nesta transição, das indústrias ao consumidor. E o consumidor é o elemento-chave que detém o poder máximo de impacto na transição para uma economia ética. O consumo ético baseia-se na premissa de que, no ato de adquirir produtos, o comprador avaliza o seu processo de produção. Desta forma, uma compra é sempre uma forma de ativismo. Através da escolha de um produto em prol de outro, ou até mesmo da escolha de não comprar de todo, o consumidor sinaliza o seu apoio às causas ambientais e sociais, forçando a indústria afetada a assumir as posições representadas pela ação de consumo. Um consumidor ciente das empresas e produtos que correspondem aos seus valores, que esteja disposto a agir em torno deste conhecimento, influencia o desenvolvimento sustentável e a construção de uma economia e de um mundo mais ético.

Refletir sobre os diversos males que afetam a sociedade atual pode levar-nos à desesperança, pela (falsa) constatação de pouca influência individual que está ao nosso alcance, mas se nos mantivermos informados, se tivermos valores e interesses sociais e se utilizarmos a ética de consumo, faremos a diferença. A força reside na soma: um hábito de cada vez, um consumidor de cada vez.


O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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