Restaurantes: quatro casas onde o cabrito é rei

É tempo de cabrito. Numa breve ronda por Minho e Beira Baixa, damos conta de quatro restaurantes com distintas formas nobres de confeccionar a carne-estrela da Páscoa à mesa em família.

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No restaurante Porinhos, em Fafe, o cabrito assado é ponto assente aos domingos. Rui Oliveira

O cabrito é uma iguaria que se encontra principalmente nas cozinhas do Norte e do Centro de Portugal. Nesta ronda pelo Minho, com um desvio até à Beira Baixa, descobrimos, para além da mais tradicional assadura no forno, outras formas nobres de confeccionar esta deliciosa carne: assado simples, recheado de várias maneiras e assado com a pele à moda do leitão. Verificámos, também, como todos estes pratos se harmonizam impecavelmente com os brancos da Região dos Vinhos Verdes.

Casa Pêga, Famalicão

Há 65 anos abria, nos arrabaldes de Famalicão, uma pequena taberna que com o correr dos anos se transformou num restaurante de referência na zona. O seu nome é Casa Pêga e ao casal que a fundou sucederam cinco das seis filhas e dois filhos, que tocam em marcha festiva o restaurante para a frente.

Assados, feitos nos fornos de dois grandes fogões a lenha, e comida de tacho são dois ex-líbris da casa. A dona Emília, conhecida pelo petit nom de Emilinha, é a irmã das relações públicas, enquanto a Margarida, a Altina, a Eva e a Sofia se encarregam, juntamente com o irmão Manuel, de tachos e panelas. José, o gerente, trata das compras e das questões burocráticas.

O restaurante fica a cerca de 500 metros da saída da A3 e a um par de quilómetros da casa-museu de Camilo Castelo Branco. Os comensais, durante a semana, maioritariamente empresários do ramo têxtil e de outras empresas da região que aqui trazem os seus clientes, voltam ao fim-de-semana acompanhados da família.

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Na Casa Pêga, em Famalicão, Emília é uma de sete irmãos que deram continuidade ao restaurante fundado pelos pais há 65 anos. Anna Costa

Na sala ampla, de decoração simples, os clientes podem deliciar-se com os assados – cabrito à quarta-feira e domingo aos almoços, costela mendinha ou nispo de vitela – ou com a já referida comida de tacho, de que são exemplos a mão de vitela com grão-de-bico, a vitela estufada com favas e a língua de vaca com ervilhas. Muita fama têm também os rojões. Há vários bacalhaus e outros peixes, fresquinhos, vindos da Póvoa de Varzim.

Nas sobremesas brilham bolos variados e o famoso pudim abade de Priscos.

A garrafeira conta com mais de 700 referências, maioritariamente Douro e Alentejo, mas o vinho branco que mais vendem é um produzido com várias castas da região dos Vinhos Verdes e engarrafado especialmente para a Casa Pêga.

Casa Pêga
Rua 8 de Dezembro, Antas (Famalicão)
Tel.: 252374175
Das 12h às 15h e das 19h30 às 22h. Domingos, só take away. Encerra domingo ao jantar
Preço médio: 25 euros

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O cabrito estonado, especialidade da Beira Baixa, é um dos chamarizes do restaurante Ponte Velha, na Sertã Sergio Azenha

Ponte Velha, Sertã

Não são muitos os restaurantes que se possam orgulhar de terem na sua ementa nada menos do que seis iguarias que não se encontram em mais nenhuma zona de Portugal. O Ponte Velha, na Sertã, acarinha com muito zelo e esmero uma saborosíssima sopa de peixe, cabrito estonado, maranhos, bucho e, nos doces, a tigelada da Beira e os cartuchos de Cernache.

A maior parte dos clientes são de passagem, viajantes na EN2, que lhe passa mesmo à porta, movidos pela curiosidade de conhecerem o Portugal do interior. São pessoas da zona Oeste, Coimbra, Porto e Lisboa, muitos deles a fazerem na Sertã final de etapa, com pernoita.

O espaço é moderno e amplo com capacidade para 120 comensais.

Vamos ao cabrito estonado, servido por encomenda de véspera. É um cabrito jovem cujo pêlo foi tirado, deixando-se-lhe a pele, que fica tostada e estaladiça, parecida com a do leitão. Depois é assado aberto, no forno.

A garrafeira do Ponte Velha guarda perto de uma dezena de Vinhos Verdes e, assegura o gerente, “o loureiro ou o alvarinho casam muito bem" com a comida regional ali servida DR
O Ponte Velha dá muita atenção a vários pratos que não se encontra facilmente fora da Beira Baixa, entre eles os maranhos, o bucho e, claro, o cabrito estonado Nelson Garrido
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A garrafeira do Ponte Velha guarda perto de uma dezena de Vinhos Verdes e, assegura o gerente, “o loureiro ou o alvarinho casam muito bem" com a comida regional ali servida DR

Dos maranhos já muito se disse. Trata-se de pequenos sacos feitos do estômago da cabra ou da ovelha, recheados com arroz, carne de borrego, presunto, chouriço de carne, hortelã (tudo picadinho), vinho branco, tudo em cru e levado a cozer numa panela com generoso ramo de hortelã. O bucho recheado leva carnes de porco picadas, pão, ovos e sumo de limão, sendo depois assado no forno. A lista completa-se com carnes assadas, bacalhaus, peixes de mar, tudo fresco.

A garrafeira tem boas escolhas, apresentando quase uma dezena de propostas da região dos Vinhos Verdes. “O loureiro ou o alvarinho casam muito bem com a nossa comida regional”, assegura o gerente Emanuel Marçal.

Ponte Velha
Rua Rua do Convento, 15, Sertã
Tel.: 274600160
Web: santosemarcal.pt
Das 12h às 15h e das 19h às 23h. Encerra à segunda
Preço médio: 25 euros

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O Brandeiro fica a mais de mil metros de altitude, num planalto da serra da Peneda. Diante do seu alpendre envidraçado abre-se uma paisagem fantástica DR

O Brandeiro, Melgaço

O Brandeiro fica na Branda da Aveleira, a mais de mil metros de altitude, num planalto da serra da Peneda. Começou como uma espécie de bar-taberna para dar apoio nas festas da capela da Nossa Senhora da Guia, até que Agostinho Alves, industrial do ramo da construção civil, lhe deu a volta em 2015, acrescentando um alpendre envidraçado de onde se desfruta de uma paisagem fantástica.

Para se chegar lá a partir de Melgaço, são cerca de 20 quilómetros de paisagens muito bonitas, numa estrada que serpenteia serra acima, por vezes cruzando-se com vacas de raça cachena, que por pastarem livremente na serra têm uma carne muitíssimo apreciada.

Os 160 lugares disponíveis são maioritariamente ocupados por portugueses e espanhóis (a fronteira está a dois passos) e por estrangeiros que se hospedam nas casas de turismo rural que existem na zona (quatro delas do proprietário do restaurante), todos eles motivados pela visita às brandas, locais de transumância para onde os pastores conduziam o gado entre Abril e Setembro, já que no Inverno desciam até aos vales, às “inverneiras” por causa do frio e da neve.

Outra atracção popular é Castro Laboreiro, onde, para além da conhecida raça de cães de pastor, existe interessante património construído, incluindo o velho castro datado do século XII.

O prato mais pedido é a carne de cachena assada no forno, que pode ser naco, costeleta, taquinhos ou costelinha, seguindo-se o cabrito que é apresentado em três versões: assado inteiro, partido em pedaços ou recheado com os miúdos e pão, receita típica de serra, esquecida há muitos anos e agora recuperada por Gabriela, cozinheira da casa. Quem não quiser carne pode pedir pratos de bacalhau – o mais famoso é o bacalhau à Brandeiro – ou polvo.

A garrafeira conta com uma dezena de referências de vinho de alvarinho e duas de vinhão, sem dúvida os preferidos dos clientes.

O Brandeiro
Branda da Aveleira (Melgaço)
GPS: 41.9974 -8.2856
Tel.: 933894259
Das 10h às 19h (jantares só por marcação). Encerra à segunda
Preço médio: 25 euros

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Na ementa do Porinhos, o cabrito marca presença, tanto numa caldeirada como assado no forno Rui Oliveira

Porinhos, Fafe

As voltas que o mundo dá! Diogo Novais Pereira estudou cozinha na Escola de Hotelaria e Turismo do Porto, estagiando de seguida no DOP (Porto) e no El Club Allard (Madrid). De regresso a Portugal, assumiu a chefia do restaurante Casa Torta, em Guimarães, seguindo-se o Oficina, no Porto para, quatro anos depois (em 2019), se tornar chefe executivo do My Story Hotel Rossio, Lisboa. A saudade bateu forte e resolveu regressar à terra natal, Fafe, para dirigir o restaurante da família – o Porinhos.

Não foi só a possibilidade de agora poder levar uma vida mais calma que o fez voltar às origens. Foi, sobretudo, a possibilidade de, com a proximidade, poder ter produtos de melhor qualidade e mais frescos, muitos deles produzidos por uma geração mais nova, com outros conhecimentos e preocupações ambientais.

Neste restaurante que ocupa uma espécie de moradia na estrada que liga Mesão Frio a Fafe, no lugar de Porinhos, a clientela é, sobretudo, constituída por empresários das várias indústrias locais e respectivos clientes, ao almoço de semana. Aos fins-de-semana, é poiso de famílias – e os filhos dessas famílias tomam os turnos de jantar, com grupos de amigos.

Nos almoços de domingo não pode faltar o cabrito assado – nos outros dias também há, por encomenda –, a par da caldeirada de cabrito e do cozido à portuguesa. Às quartas e sábados, há tripas e quase sempre os rojões e bacalhaus, como não podia deixar de ser.

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Diogo Novais Pereira passou por cozinhas de Porto, Madrid e Lisboa, com estrelas Michelin à mistura, mas foi no regresso às origens que encontrou o seu lugar, ao leme do restaurante da família, o Porinhos Rui Oliveira

Nas sobremesas destaca-se o leite de creme – receita deixada por uma bisavó de Diogo, que aprendeu a fazer o doce num convento – e o pão-de-ló com chocolate e nozes pecã, cozido em prato de barro num forno a lenha.

Quanto à garrafeira, está em permanente construção a partir de provas e harmonizações efectuadas em jantares vínicos e não só, apresentando os vinhos da Região dos Vinhos Verdes uma fatia apreciável do consumo.

Para além de várias referências muito conhecidas têm, também, vinhos de produtores mais pequenos, como a Quinta do Salto ou o vinhão Pascoaes, produzido em quantidade limitada na casa onde viveu o poeta Teixeira de Pascoaes. Mas o que mais vendem é Porinhos, o vinho branco da casa, blend de castas da região, engarrafado especialmente para o restaurante.

Porinhos
Avenida da Torre, 87, Porinhos, Arões (Fafe)
Tel.: 253492132/962898236
Das 10h às 00h; domingo e segunda, até às 15h. Não encerra
Preço médio: 20/25 euros (almoço/jantar)


Este artigo foi publicado no n.º 8 da revista Singular.

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