“Recusámos nacionalizar os prejuízos” da TAP, diz Sérgio Monteiro

“Chamar fundos Airbus parece que tem uma origem duvidosa”, disse o ex-secretário de Estado das Infra-estruturas do PSD/CDS sobre a recapitalização da TAP na privatização de 2015.

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Sérgio Monteiro, ex-secretário de Estado das Infra-estruturas e ligado à privatização da TAP em 2015 LUSA/RODRIGO ANTUNES

O antigo secretário de Estado das Infra-estruturas do executivo PSD/CDS liderado por Passos Coelho, Sérgio Monteiro, afirmou esta sexta-feira que na altura na privatização da TAP, em 2015, as avaliações da empresa davam-lhe um valor negativo, entre 36 milhões de euros negativos e 512 milhões negativos, e havia “uma necessidade urgente de capitalização”.

Segundo este responsável, ouvido sobre a venda da TAP na comissão de economia da Assembleia da República, actuais interessados na companhia, ouvidos na altura, como a Air France ou a Lufthansa, apenas queriam a companhia aérea, e não a totalidade dos negócios do grupo, onde se incluía a deficitária área de manutenção no Brasil.

“Recusámos nacionalizar os prejuízos”, adiantou Sérgio Monteiro numa intervenção inicial, explicando que por terem vendido todo o grupo houve apenas três interessados no processo, depois de mais de 40 entidades convidadas. Foram entretanto, disse mais à frente, “enterrados mil milhões no Brasil”. As contas de 2021 da TAP (com um prejuízo de 1599 milhões) incluíram uma imparidade de 884,7 milhões por causa do negócio no Brasil.

“Viabilizámos uma empresa considerada estratégica”, afirmou, enunciado a aprovação da privatização de entidades como a Parpública e o Tribunal de Contas, “assegurando a recapitalização da TAP” pelos privados.

“Serem fundos Airbus não nos preocupou”

O tema da recapitalização, e da compra de 53 novos aviões à Airbus por parte dos privados – que está em investigação no Ministério Público após entrega de documentação do actual Governo, nomeadamente por causa dos custos -, veio rapidamente para cima da mesa, nomeadamente por via de questões do deputado Carlos Pereira, do PS, que foi quem chamou o ex-governante.

“A estratégia de financiamento dos aviões era uma estratégia do parceiro privado, não dizia respeito ao Estado”, frisou Sérgio Monteiro. “Serem fundos Airbus não nos preocupou”, disse, sublinhando mais à frente que "nunca os aviões que chegaram poderiam vir acima do valor de mercado"​.

“Ainda bem que o senhor David Neeleman encontrou uma entidade que confiou nele o suficiente para lhe entregar um valor que, por sua vez, foi injectado na TAP e que permitiu pagar milhares postos de trabalho e assegurar a viabilidade da companhia”.

“Chamar 'fundos Airbus' parece que tem uma origem duvidosa ou que é estranho um fornecedor financiar, no sentido de entregar [uma verba] por conta do rappel comercial [desconto] de uma encomenda”, acrescentou o ex-governante. “A TAP aprovou o plano estratégico, e quis os aviões. O que quisemos acautelar foi que esse dinheiro [da recapitalização] não era reembolsado nem saia da empresa”, disse.

Mais audições a caminho

A audição de Sérgio Monteiro tem por base uma iniciativa dos deputados do PS Carlos Pereira e Hugo Costa, depois de, referiram, se ter sabido que o Ministério Público tinha aberto um inquérito à compra de aviões pela TAP quando esta passou a ser controlada pelos accionistas privados, David Neeleman e Humberto Pedrosa. O inquérito surgiu depois de documentação sobre essa matéria ter sido entregue pelo actual Governo, após uma análise da própria TAP aos custos com as aeronaves.

“Atendendo à gravidade das situações reportadas e necessário cabal esclarecimento das mesmas, é importante ouvir os principais responsáveis pelo processo de preparação da privatização da TAP à altura”, afirmaram os deputados do PS.

O PS pediu também a comparência do ex-ministro da Economia, António Pires de Lima, que deverá ter lugar a 4 de Abril.

Além destas duas audições, o PS requereu também a presença na comissão de economia – que decorre de forma independente da comissão de inquérito parlamentar sobre a TAP recentemente formada – do ex-presidente da administração da Parpública Pedro Pinto, o antigo secretário de Estado das Infra-estruturas, Transportes e Comunicações Miguel Pinto Luz, e a antiga secretária de Estado do Tesouro Isabel Castelo Branco, presentes no processo final de privatização da empresa.

Do lado do PSD foi já requerida dos ex-ministros das Infra-estruturas Pedro Marques e Pedro Nuno Santos, do ex-administrador não executivo da TAP Diogo Lacerda Machado e do ex-secretário de Estado das Finanças Ricardo Mourinho Félix, por causa da reversão parcial da privatização em 2016 (por via da qual o Estado ficou com 50% da TAP).

Em paralelo, está a avançar a comissão parlamentar de inquérito à TAP, ligada à indemnização paga a Alexandra Reis e que quer ouvir 58 personalidades (uma delas Sérgio Monteiro).

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