Desvalorizar ou aprender com os rankings?

Jamais poderei concordar com a narrativa de que os rankings não servem para nada. Com a quantidade de dados que agora são disponibilizados e a possibilidade de analisarmos as diversas variáveis, só não servem se não quisermos.

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Daniel Rocha/Arquivo

Ei-los novamente, os Rankings das Escolas 2021 foram publicados e, como habitualmente acontece, começaram as declarações públicas entre os que os defendem e os que nem querem ouvir falar deles. Ao longo dos últimos dias as opiniões foram diversificadas, mas a tendência de conclusão direta entre qual o melhor ensino, se o público de o privado, é constante. Analisando os rankings, podemos claramente dizer que nas primeiras 50 escolas apenas cinco são estatais. Assunto encerrado, as escolas privadas são melhores que as públicas. Acabou-se a discussão.

Só que não podemos reduzir a análise a apenas uma variável, a média. Se, no explicador do PÚBLICO, escolhermos a listagem das escolas em meios desfavoráveis, percebemos que a que ocupa o 47.º lugar da tabela geral, a Escola Secundária Dr. João Lopes de Morais, Mortágua, é pública e trabalha com uma comunidade de alunos que provêm de meios desfavoráveis.

Algumas perguntas surgem perante estes dados.

  • Será que o Externado Maristas de Lisboa que aparece na tabela geral em 45.º não quer tecer comentários sobre a sua posição?
  • Qual a possibilidade de os professores da Escola Secundária Dr. João Lopes de Morais terem desenvolvido um trabalho de excelência com os seus alunos?

Claro está, estamos perante a análise não redutora dos dados que nos são disponibilizados e com eles devemos partir para o próximo conjunto de perguntas.

  • Qual o modelo de organização e liderança que é adotado pela escola pública em meio desfavorável que melhor resultado obteve nos rankings?
  • De que maneira esse modelo pode ser adotado pelas outras escolas públicas?

Parece-me relevante acrescentar a informação de que as outras quatro escolas públicas que conseguem ocupar lugares no Top 50, são escolas cujos alunos provêm de meios “intermédios”, Escola Básica e Secundária José Relvas, Alpiarça 46.º; e “favoráveis”, Escola Básica e Secundária Henrique Sommer, (9,3% alunos com ação social, pais com 8,9 anos de escolaridade e as mães, 11,84 anos), Leiria 40.º; Escola Secundária Alves Martins (12% de alunos com ação social; média de escolaridade dos pais, 13,3 anos), Viseu 44.º; Escola Secundária Quinta das Palmeiras (12% de alunos com ação social; média de escolaridade dos pais, 13,3 anos), Covilhã 50.º. De ressalvar, não deixando de ter um lugar meritório, alguns dos estudantes são oriundos de colégios que terminam no 3.º Ciclo (9.º ano), como é o caso na rede escolar da cidade de Viseu.

No entanto, se fizermos uma comparação com duas escolas emblemáticas de Lisboa onde a escolaridade dos pais é idêntica, média de 15 anos, e o meio é favorável, podemos pelo menos ter dados para refletir. Comparando, uma instituição de contexto favorável, a Escola Secundária Pedro Nunes (Lisboa), que é pública, com 94,9% de alunos sem ação social escolar, média de escolaridade dos pais (15,30 anos) e das mães (14,86 anos); e o Colégio São João de Brito (Lisboa), que é privado, percebemos que, apesar do meio e da escolaridade do país, os 275 alunos do Colégio São João de Brito conseguiram uma média de 14,59 valores nos exames que fazem com que ocupem o 10.º lugar do ranking. Por seu lado, na Escola Secundária Pedro Nunes, os 506 alunos obtiveram uma média de 11,56 valores, ocupando o 135.º lugar.

  • Que fatores contribuem para algumas escolas em meios desfavorecidos ou médios fazerem melhores alunos? Seria curioso verificar se as melhores escolas públicas ou privadas oferecem ensino profissional. Quem tem bons caminhos de sucesso?
  • Que tipo de liderança? Como se organizam? Como promovem as equipas educativas e as dinâmicas organizacionais? Como trabalham mais perto com os pais e com a comunidade?
  • Mais do que discutir público/privado numa visão desculpabilizante, importa perceber como é que se organiza melhor o ensino? Como desafiar e manter os melhores professores? Como se garante a estabilidade do corpo docente? Ou seja, descobrir boas práticas de gestão organizacional e pedagógica para potenciar mais qualidade nas aprendizagens e nos resultados. Esta deve ser a discussão.

Claro que talvez possa dar jeito desvalorizar os rankings, mas se queremos ser sérios e resolver os problemas da escola estatal temos de olhar para estes resultados com sentido analítico e autocrítico. Independentemente de concordarmos ou não com este tipo de listagem.

Jamais poderei concordar com a narrativa de que os rankings não servem para nada. Com a quantidade de dados que agora são disponibilizados e a possibilidade de analisarmos as diversas variáveis, só não servem se não quisermos.

Devemos combater o discurso de que os rankings servem apenas para fazer publicidade aos privados, pois é na realidade uma verdadeira falácia. A rede de escolas privadas está montada. Essa narrativa é desmontada pelo simples facto de na mesma “fotografia” que faz brilhar o Colégio Nova Encosta, Paços de Ferreira, que ocupa a primeira posição, faz também corar de vergonha o Real Colégio de Portugal, Lisboa, que ocupa o 527.º lugar.

O que nos deve realmente importar, isso sim, é perceber como é que a escola pública pode compensar todas as desigualdades sociais, o que precisa fazer para poder garantir que academicamente qualquer aluno tenha a mesma possibilidade de alcançar o sucesso educativo, independentemente da morada ou condição social. E isso não tem sido feito.

Aliás o que se tem visto nas escolas é — e arrisco a dizer que essa é uma perceção unânime — a exigência a baixar, o esforço a deixar de ser valorizado e os professores a terem sempre de arranjar uma forma para que não haja retenções. Será por isso que uma determinada fação social prefere vilipendiar os rankings?

Será que preferem tapar o Sol com a peneira?

Costumo dizer aos meus alunos que devemos sempre procurar dar-nos, convivermos, debatermos com quem tem um conhecimento superior ao nosso. Só a confrontação com essa “superioridade” nos fará evoluir.

Ora é mesmo isso que devem fazer as escolas que se encontram na cauda dos rankings, sejam elas públicas ou privadas. Devem olhar para cima e perceber o que é que os outros fazem ou têm que os fazem obter melhores resultados.

No entanto, o que se tem visto nas escolas é não “melhorando” as escolas, mas sim pervertendo as aprendizagens, iludindo os próprios alunos, fazendo-os acreditar que estão a conseguir, que qualquer coisa lhes chega, fazendo assim com que aumente o sucesso e diminua o abandono. Alunos esses que confrontados com a realidade de um exame se frustram. É por isso que eliminaram todo o tipo de avaliações externas?

Deviam perceber, aqueles que nos governam e os pais dos alunos, que em última instância, quem pagará a fatura serão os de sempre, os alunos, os mais desfavorecidos, aqueles que não têm alternativa, pois têm de se sujeitar àquilo que o Estado lhes dá.

Obviamente há escolas de excelência, sejam públicas ou privadas, mas temos de assumir que também as há, más. E se as más são estatais então o problema é nosso!

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