Estudar na capital não pode ser um luxo

Se os estudantes tivessem mais oferta, muitos deles deixariam de arrendar quartos no centro da cidade, fazendo cair a procura por estes locais, levando os preços dos alojamentos a descer, ajudando quem por lá mora com uma descida da procura e, consequentemente, de valor de renda, originando uma mudança em cadeia na capital portuguesa.

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Julian Dik/Unsplash

A poucas semanas do início das candidaturas para o acesso ao ensino superior, Lisboa é vista com agrado entre os futuros universitários. Não só pelas inúmeras oportunidades que a cidade oferece, mas também pelo clima ameno que se sente o ano inteiro, pela oferta diversificada de cultura e eventos e, claro, pelas inúmeras opções que a cidade oferece no que toca a estudos universitários.

Só a Universidade de Lisboa apresenta um total de 101 licenciaturas (das quais 21 são mestrados integrados), divididas por 18 escolas. Se adicionarmos a estes números os restantes centros universitários da capital, o número ascende às 470, só na Área Metropolitana de Lisboa. Resumidamente, existem cursos para todos os gostos.

Mas a verdade é que o sonho de milhares de estudantes cai por terra quando iniciam a procura por alojamento. Os preços destes quartos pequenos, com casas de banho e cozinhas partilhadas, localizados a horas de distância, utilizando os transportes públicos das escolas universitárias, chegam a custar mais de 450 euros, muitas vezes, sem despesas incluídas. Se considerarmos um estudante que não resida na cidade, podemos estar a falar em despesas mensais a rondar o valor de um ordenado mínimo nacional (onde incluímos apenas o essencial). Se fizermos uma comparação directa com a cidade de Coimbra, os valores mensais totais desta, rondam os 450 euros, o mesmo que um quarto na capital! Estamos a falar de uma diferença de quase 10 mil euros por uma licenciatura de 3 anos! As discrepâncias são acentuadas e bastante notórias.

E se pensássemos de outra forma? Neste momento encontro-me a fazer o programa Erasmus+ em Praga, na República Checa, e foram-me oferecidas duas hipóteses: ou escolheria ficar numa residência, que tem uma parceria com a universidade; ou teria que procurar, de forma independente, um local onde ficar. Mais tarde, tive a oportunidade de conhecer a residência, e o modelo em questão deixou-me fascinado. Era assente na renovação de uma zona de edifícios prontos a demolir, provavelmente uma antiga zona fabril, e na transformação de uma cidade universitária de residências para estudantes. A verdade é que foi exactamente isto que assisti quando cheguei à capital checa. Um complexo com cerca de dois quilómetros quadrados onde se encontram prédios de residências universitárias, supermercados, todo o tipo de transportes, cafés, etc. Este complexo fica a sensivelmente 30 minutos de transportes públicos do centro da cidade e por lá moram cerca de 5000 estudantes. Através desse complexo, os estudantes já não eram expulsos na chegada do Verão, por ser mais rentável arrendar ao dia.

No final das contas, estas propostas não vêm só ajudar os estudantes, mas sim todos os habitantes da cidade de Lisboa. Isto porque, se os estudantes tivessem mais oferta, por exemplo se existisse o complexo que falei anteriormente, muitos deles deixariam de arrendar quartos no centro da cidade, fazendo cair a procura por estes locais, levando os preços dos alojamentos a descer, ajudando quem por lá mora com uma descida da procura e, consequentemente, de valor de renda, originando uma mudança em cadeia na capital portuguesa.

Este é um problema real, com o qual os estudantes em mobilidade continuam a lutar há décadas. As propostas chegam de todos os lados, mas nada é feito e, pior do que isso, continua-se, ano após ano, a romper com os sonhos de tantos estudantes portugueses que não conseguem estudar na cidade das sete colinas.

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